Muitos são fans da aprendizagem em esquema de DIY, e se como ser humano sou obrigado a aceitar essa visão, como instrutor profissional sou obrigado a apontar-lhe alguns erros.
Se por um lado a escada evolutiva torna-se mais complexa, por outro pode mesmo ter alguns degraus em falta pelo simples facto de existirem falhas na abordagem.
Uma dessas falhas é normalmente a errada perceção de que existem técnicas básicas e avançadas, aliada á falta de entendimento de quais são as reais necessidades de qualquer piloto.
Na realidade, existem somente cinto pontos básicos necessários para se saber dominar bem uma mota; controlo de embraiagem e acelerador; controlo de travões; posição corporal e equilíbrio; compreensão do funcionamento da mota e da física que a gere; e compreensão do nosso corpo.
Na larga maioria das formações fora de estrada bem estruturadas, esses são os tópicos que são abordados nas primeiras aulas, e isso assim o é porque a sua compreensão e aprendizagem ditam os alicerces de uma boa evolução futura.
No entanto, essa evolução não passa por aprender mais bases estruturantes, mas sim por conseguir utilizar cada um desses cinco conceitos de maneiras cada vez mais precisas, e por sua vez, em sequencias mais complexas.
Com este entendimento presente, areia por si só não é um tipo de terreno mais avançado do que um estradão de terra batida, é sim um tipo de terreno que obriga a que o piloto tenha uma compreensão mais profunda dos cinco pontos básicos do todo o terreno em duas rodas.
É possível fazer areia sem aprender bem os básicos?
Claro, sem dúvida, mas viver e sobreviver são dois conceitos muito distintos, e cabe a cada um de nós escolher com qual queremos viver.
É quase impossível falar-se de andar em areia sem que apareçam comentários sem fim a afirmar que tudo o que é preciso “é chegar o peso para trás e acelerar a fundo”.
Como já falei no passado, é imperativo em qualquer ponto da evolução técnica que se pergunte “porque”, e que não se aceite simplesmente o “como” desta ou daquela técnica, e este é um dos casos onde essa mentalidade é muito benéfica.
Ainda assim, isso não significa que “cu para trás e acelerador” seja por definição uma máxima incorreta, mas sim uma incompleta, uma vez que deixa de lado vários pontos importantes a ter em conta, para começar, o tipo de areia a que nos tamos a referir.
É difícil negar que ele está a andar em areia, no entanto, o seu posicionamento está longe de ser peso atrás e gás, como a sabedoria popular nos leva a querer que é “A” forma de conduzir na areia. Existem vários tipos de areia, e com eles, várias aplicações técnicas possíeis. Imagem amcn.com
Se fora de estrada como diferentes tipos de terreno é um espectro que merece uma explicação mais abrangente do que “simples” ou “difícil”, a areia não é diferente.
Areia de praia ou do deserto, areia de pinhal, areia funda ou superficial, areia molhada ou seca, areia amarela ou barrenta, até mesmo o tipo de fundo onde a areia assenta são algumas das características que descrevem diferentes tipos de areia, e como tal, a escolha de abordagem que devemos ter para com ela.
Assim, fazer 300kms de areia no deserto, não é o mesmo que numa estrada de terra batida atravessar 500 metros de areia, que pode por si só contar com as mais variadas características.
Dessa forma, devemos não só perguntar porque é que rabo para trás e acelerador é a técnica a utilizar, como devemos ficar céticos quando esse chavão é utilizado sem qualquer intenção de tentar entender o tipo de areia de que se está a falar.
Se peso para trás e acelerador a fundo é a técnica de eleição da grande maioria, é porque algum fundamento tem, e essa realidade é indiscutível.
Afinal, quer o peso na traseira da mota, quer o conceito de acelerar continuamente apontam ao mesmo objetivo, tirar peso da roda da frente, o que por sua vez vai fazer com que a mota consiga mais facilmente navegar terrenos arenosos.
Ainda assim, ao analisarmos mais profundamente o conceito desta técnica, facilmente nos deparamos com perguntas que necessitam de resposta.
Rabo para trás, significa esticar os braços tanto quanto possível? E as pernas, devem ter alguma posição particular?
Acelerar “a fundo” até quanto? Com motas de enduro a adventure com incríveis rácios de peso potência, devemos mesmo manter o acelerador cravado como nos é dito?
É possível ser-se proficiente na areia com várias motas, no entanto, e sem saber a aptidão técnica deste piloto, posso garantir que ele está longe de ir a acelerar a fundo nesta situação. Imagem asphaltandrubber.com
E como funciona em curva? Se por definição o objetivo desta manobra é aliviar a roda da frente, como é que se deve abordar uma curva apertada, ou uma aberta?
Ou até mesmo subidas e descidas de areia, devemos manter a mesma abordagem de peso para trás e acelerador mesmo quando o terreno não é plano?
Com estas e outras perguntas em mente, facilmente compreendemos que apesar desta técnica estar cimentada num conceito ganhador, e ter aplicabilidade em vários tipos de areia, ela está não só incompleta na forma como é aconselhada, como potencialmente não será a indicada para todas as situações.
Dessa forma, somos obrigados a aceitar que outras soluções são obrigatoriamente existentes, e que as devemos adicionar ao nosso arsenal se queremos conquistar as mais variadas areias do planeta.
Quando no inicio deste artigo falámos nos cinco pontos básicos para a condução fora de estrada, no seu centro está o conceito de não perturbar a mota e deixa-la trabalhar da melhor maneira.
Dessa forma, dominando-os, vamos conseguir não só ter a liberdade mental necessária para ler o terreno, mas igualmente para compreender o que a mota nos está a pedir através das suas reações e manutenção de momento.
A aplicação da compreensão desse momento e estabilidade contrastam com o truque típico que muitos apresentam quando num estradão, ao verem areia, se sentam, poem os pés de fora, reduzem a velocidade, e pedalam todo o percurso.
Uma abordagem que tecnicamente não é difícil de corrigir.
Começando de uma boa posição triangular central, basta olhar para o final da areia para escolher a melhor linha, manter a velocidade, ou sabendo que areia atua como um travão, acelerar ligeiramente, e imediatamente o sucesso e esforço da manobra alteram-se.
É claramente visível que o peso dele está basicamente em cima da roda traseira, e que a roda da frente mal vai a fazer contacto com o solo. Ainda assim, os seus braços estão longe de estar esticados, e o posicionamento dos seus pés e joelhos dita uma rápida capacidade de reação se necessário. Imagem via adbmag.com.au
Sem duvida que existem mais pontos que podemos ter em conta, tal como controlo de respiração, posição de pés e joelhos, ou até mesmo pneus e setup da mota, ainda assim, talvez o mais importante de referir é que não falei em recuar o peso, ou o típico, por o rabo para trás.
Isso foi obviamente propositado, porque numa posição triangular central, a nossa roda da frente tem uma grande liberdade, pelo que se mantivermos ou ligeiramente aumentarmos a velocidade ao chegar á areia, iremos conseguir facilmente navegar as secções arenosas típicas dos estradões portugueses.
Da mesma forma, como nos encontramos numa posição ativa e estamos à procura de sinais de instabilidade da mota, conseguimos rapidamente baixar ou recuar o nosso peso para compensar a mota se for necessário.
Esta posição ativa é no entanto inexistente quando por exemplo se vê pilotos com o peso tão para trás que os seus braços estão completamente esticados.
Esse ponto é tão critico que se só retiverem uma nota deste artigo, que seja que o limite do quão para trás podemos ir com segurança, é definido pelo quanto conseguimos esticar os braços sem bloquear o movimento lateral da roda da frente.
Como analogia visual, imaginem um pequeno barco a motor onde não só a velocidade mas igualmente o trim do motor têm de ser tido em conta, na mota, o objetivo é planar por cima da areia com controlo e sem afundar ou levantar demasiado a frente, algo difícil de atingir se mantivermos o acelerador a fundo e o peso constantemente no guarda-lamas traseiro.
Assim, um bom entendimento de posição, de terreno, de acelerador, e de feedback da mota, permitem um ajuste preciso durante a travessia da areia, e tornam esta “manobra avançada” simplesmente uma clara junção dos pontos básicos aprendidos no primeiro dia.
Outro truque muito válido a utilizar em areia, principalmente quando é necessário fazer manobras como curvas apertadas, é o uso da embraiagem, no entanto, é raro que se fale nesta técnica sem pelo menos uma pessoa apontar o risco de queimar os discos.
Essa visão é errada, pois assume que usar a embraiagem obriga a puxa-la totalmente, ou a andar constantemente na zona em que a mesma patina.
As motas são veículos desenhados ao milímetro, pelo que a nossa utilização dos mesmo deve ser igualmente milimétrica, e não baseada na ideia do oito ou oitenta.
Dessa forma, com o controlo de embraiagem e compreensão da mota aprendidos nos nossos pontos básicos, rapidamente adquirimos a sensibilidade necessária para compreender que por vezes, uns milímetros de embraiagem fazem a diferença que permite levantar a roda da frente o suficiente para aumentar as nossas possibilidades de sucesso.
Seja aliviar a frente para passar de um rego para o outro, para ultrapassar um obstáculo, ou até mesmo para mudar de direção em espaços apertados, esta aplicação avançada de conceitos básicos funciona igualmente bem de motas enduristas até ás grandes adventures.
Sem dúvida que é possível fazer curvas de uma forma agressiva e no acelerador, mas isso não dita controlo, o que não dita segurança e consistência. Saber utilizar bem o acelerador, embraiagem, e posição corporal ajudam em muito a poder fazer algumas manobras a uma velocidade mais fácil para o cérebro processar. Imagem adbmag.com.au
Além disso, têm a grande benesse de permitir que tudo isso seja feito sem um acréscimo exponencial da velocidade, algo que nos permite não ficar rapidamente a pilotar acima das nossas reais capacidades.
Sem dúvida que em regimes competitivos esta sensibilidade é mais difícil de gerir, seja pela pressão da corrida, pelo regime a que o motor trabalha, pelo desgaste físico, ou até mesmo pela necessidade de poupar ao máximo a mota, mas em ambientes lúdicos, é um recurso que bem utilizado promove excelentes resultados, sem desgaste prematuro do material.
Eu, por exemplo, utilizo-o nos mais diversos tipos de terreno e situações, e a minha embraiagem conta com mais de 60.000kms sem queixas.
É então crucial frisar que usar a embraiagem não é crime, mas assumir que o uso da mesma é sempre um movimento de ON e OFF, isso sim deveria ser passível de coima.
Quem já teve aulas comigo ou lê regularmente os meus artigos sabe que eu sou um grande apologista da posição central na mota agregada á iniciação de movimento.
Se por um lado é a melhor forma de manter a mota estabilizada, um ponto fulcral para o bom funcionamento deste veiculo, por outro, permite-nos uma amplitude de opções largamente superior.
Todos já vimos imagens do Dakar em que eles vão de punho trancado basicamente sentados no guarda-lamas traseiro, no entanto, tomar essas imagens como evangelho da técnica a utilizar em areia, é perigoso.
Isso porque qualquer imagem tem de ser analisada em contexto, e se por um lado o deles é competitivo com a necessidade de serem os mais rápidos possível, por outro, tendem a somente escolher essas posições em zonas abertas e com boa visibilidade.
Assim, escolhem obter a maior velocidade possível em detrimento das suas opções quanto a capacidade de reação, algo que como pilotos lúdicos ou guerreiros de fim de semana, nunca deve ser a escolha primária.
Para a larga maioria de nós que não só não estamos em regimes competitivos como não estamos em pistas de areia sem fim, é importante mantermos as nossas opções em aberto, e por opções diga-se, capacidades de escolha de posição em relação ao terreno.
Um colega que caiu, um perigo no trilho que nos obriga a uma travagem de emergência, uma curva que apareça do nada, ou até mesmo um problema mecânico, podem obrigar a uma rápida alteração de atitude corporal, e quanto mais atrás na mota estivermos, mais tempo iremos demorar a reagir.
Com isto não quero dizer que não se deva, ou mesmo que não se possa chegar peso para trás para alivar ainda mais a frente, quero somente dizer que com as cinco bases bem aprendidas, a tendência de nos sentarmos em cima da matricula tende a ficar reduzida a alguns locais, tipos de areia, e momentos específicos.
Afinal, o nosso objetivo é chegar ao fim do dia vivos e inteiros, e isso obriga a uma atitude mais preventiva e segura do que a escolhida por quem é pago para correr contra o relógio.
Muito mais poderia ser dito sobre cada um destes pontos, tal como sobre outros tantos que nem sequer foram referidos, mas ainda assim, pouco mais é necessário dizer para cabalmente se poder afirmar que existe um mundo de areia para aprender.
Com isso em mente, foquem-se em garantir que aprendem as bases certas antes de se aventurarem na areia, façam formações base coerentes e estruturadas, e se quiserem, inscrevam-se em cursos de areia dedicados.
A vossa segurança está nas vossas mãos, o que significa que podem escolher aprender com chavões, ou com a ajuda de quem sabe ensinar.
E se nada do que expliquei fez sentido, já sabem, podem sempre esquecer tudo o que aqui foi dito, simplesmente por o rabo para trás, e dar-lhe gás.
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Não deve ser surpresa para ninguém que existem não só vários tipos de treinadores e instrutores, mas também que cada um deles têm o seu custo e currículo.
Essa realidade é o que faz os valores de treinos irem de pouco mais de vinte euros por umas horas, aos vários milhares de euros por diversos dias de formação.
Para os efeitos deste artigo, vou deixar de lado quer a minha opinião sobre o valor que alguns instrutores dão ao seu tempo, trabalho, e conhecimento, tal como ao retorno do investimento que cada aluno têm por escolher este ou aquele treino.
Isso porque apesar dessas opiniões estarem muito cimentadas no meu ser, não passam disso, opiniões, e como tal, não são úteis a este artigo que se quer o tão matematicamente correcto quanto possível.
Com isso em mente, todos os custos apresentados são valores médios, desde os do material, aos de mota, sem esquecer obviamente, os de formação.
Vamos então considerar alguém que acabou de chegar ao mundo do ADV, ou mesmo do Enduro, e comprou uma mota de 10.000€, e que está a considerar uma formação de 500€.
Existe sem dúvida um argumento muito valido e cientificamente provado sobre a segurança ativa do equipamento de proteção, como por exemplo a visibilidade acrescida de um capacete florescente ou roupas refletoras. No entanto, para o efeito deste artigo, que leva em conta somente fora-de-estrada, vamos descartar estes efeitos, considerando portanto material de proteção como segurança passiva. Imagem mag.sportsbikeshop.co.uk
Se para muitos esse valor de formação é elevado, podíamos directamente dizer que esse custo equivale a apenas 5% do valor investido na mota.
Com esse dado, poderíamos então dizer que 5% seria um pequeno investimento na segurança ativa de cada um, mas destacar somente esse valor seria redutor, pelo que necessitamos de expandir o nosso modelo.
Vamos então assumir que esse novo piloto investiu igualmente 400€ num capacete, 600€ num fato com proteções - ou que comprou proteções avulso acrescendo mais um jersey e calças - umas botas de 250€, e umas luvas de 50€, perfazendo um total de 1.300€ em equipamento de proteção.
Isso significa que este aspirante a aventureiro investiu 13% do valor da mota na sua segurança passiva.
Falando em material de proteção, independentemente de o consideramos como segurança passiva ou ativa, somos obrigados assumir que o mesmo é, ou no mínimo deve ser, substituído em média a cada cinco anos de uso intensivo.
Vamos considerar então para este artigo “uso intensivo” como andar com o equipamento vestido duzentos e cinquenta dias por ano.
Essa métrica vai significar que o investimento de 13% face ao valor da mota, durante cada bloco de cinco anos de vida útil do material, nos custa pouco mais do que 1€ por dia de investimento na nossa segurança passiva.
Por outro lado, conhecimento adquirido via formação, que é aplicado sempre que se passa a perna por cima de uma mota, não tem vida útil ou declínio temporal, têm ao invés, um crescimento constante por intermédio da experiencia adquirida km após km.
Assim, se assumimos que se vai conduzir durante vinte anos após a compra da mota, fazendo uma utilização intensiva, um investimento único de 5% em formação face ao valor da mota, custará somente 0.10€ por dia ao longo dessas duas décadas de condução.
Nesta simulação foram utilizados os dados descritos no artigo. Se quiseres, envia-nos uma mensagem para te enviarmos este Excel, e poderes fazer a tua própria simulação. Documento BN EnduroCamp
Isso significa que se quisermos fazer um curso de refrescamento para manter proficiência, ou mesmo cursos avançados para se aprender novas técnicas, de dois em dois anos, ao mesmo valor de 500€ por curso, ao longo desses vinte anos de terra, vamos investir 5.000€ na nossa segurança ativa, o que acumulativamente, nos custará 1€ por dia no decorrer dessas duas décadas de aventuras.
No espirito da precisão matemática, esse valor de 1€ de formação por dia ao longo de vinte anos é ainda assim inferior ao valor pago ao dia por todo o equipamento de proteção adquirido nessas décadas, que se fica pelos 1.04€.
Um valor muito inferior aquilo que muitos facilmente gastam em tabaco, cerveja, ou no seu diário café matinal.
Apesar de os cálculos atrás textualmente demonstrarem que formação apesar de poder ter um valor inicial "elevado", tem na realidade um valor quase negligenciável ao longo do tempo, este está ainda assim inflacionado quando analisado no mundo real.
Isto porque se por um lado não introduzimos os custos em extras para a mota - que quase todos os motociclistas facilmente despendem sem pensar duas vezes - por outro, também não considerámos custos de manutenções programadas ou extraordinárias, ou mesmo material de desgaste regular como pneus ou kits de transmissão.
De igual maneira, também assumimos que em duas décadas de terra nunca se trocou de mota, um gasto que só por si vai drasticamente alterar os resultados finais, ou mesmo que nunca precisamos de substituir nenhuma peça do nosso equipamento de proteção pessoal antes dos cinco anos definidos.
Dito isto, se aplicássemos todas essas métricas, os valores de formação ficariam ainda mais diluídos, principalmente considerando que são raras as pessoas que fazem uma nova formação a cada dois anos, com a maioria dos que escolhem aprender, a fazer somente um a dois cursos ao longo de toda a sua vida.
Com isso em mente, tenho e continuarei a ter dificuldade em ouvir dizer que formação é cara, seja ela a que preço for, porque quando existe efetivamente interesse em aprender como melhorar a nossa segurança e performance, é fácil ver como o investimento em formação não só não é elevado, como é potencialmente o investimento mais barato e com maior retorno que podemos fazer durante toda a nossa vida em duas rodas.
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Qualquer ávido leitor dos meus artigos sabe que eu tenho um problema com chavões, e de uma forma geral não por eles estarem errados, mas por tenderem a sofrem do problema do “jogo do telefone”.
Em criança, todos dissemos uma frase ao ouvido de outra pessoa, que passou essa informação ao próximo, e assim consecutivamente até que no final, o último elemento da nossa cadeia de informação diz a frase que lhe foi transmitida em voz alta, que para gaudio dos participantes, é normalmente algo radicalmente diferente da frase inicial.
Na nossa mocidade, essa deturpação da informação é inócua, mas em adultos, e sobre a forma de chavão, este resultado final tem outro tipo de consequências.
Temos de exigir mais a nós próprios do que aprender a andar de mota sobre chavões e erros típicos do jogo do telefone que jogávamos quando eramos pequenos. Imagem empoweredparents.com
Isto porque apesar de chavões estarem na sua maioria assentes em conceitos teóricos e práticos extremamente sólidos, passaram anos a saltar de boca em boca, o que por definição, e tal como acontece no jogo do telefone, significa que a veracidade dos mesmos se torna dúbia quando finalmente chegam aos nossos ouvidos.
Dúbia no entanto não significa totalmente errada, afinal de contas, todos sabemos que se olharmos para qualquer coisa durante a nossa condução, vamos garantidamente lá bater, dando a este chavão 100% de veracidade.
Ainda assim, isso não significa que o mesmo esteja completo, principalmente quando consideramos que ele normalmente não sobrevive sozinho, estando regularmente acompanhado pela máxima de que devemos olhar sempre para o horizonte e não para a roda da frente.
Assim, quando metemos estas duas máximas no contexto geral da condução, somos obrigados a dar-lhes razão ao mesmo tempo que temos de frisar que isoladamente, estão relativamente incompletas, deixando no ar a certeza de que faltam camadas de informação neste bolo.
Com isso em mente, dar-lhes um contexto mais abrangente vai garantir uma compreensão mais alargada do fenómeno que ambos os chavões se propõem a indicar, algo que vai exponênciar a forma como podemos manipular esta informação a nosso favor, aumentando a nossa segurança.
É fácil ser-se brutalmente claro e assumir que ou se consegue ver, ou não, mas tal como os nossos chavões, esta posição demasiado sintética do problema deixa demasiada informação por explicar.
Na realidade, visão implica muito mais do que simplesmente garantir que algo está em foco, ou não.
No entanto, como motociclistas, o que realmente nos interessa saber é que para nós, a visão se divide em duas partes distintas; a captação das imagens em si, e o impacto que a leitura dessas imagens tem no nosso cérebro.
Simplificando, temos então de começar por definir que existem três tipos de captação visual no nosso olho; a foveal, a parafoveal, e a periférica.
Compreender os diferentes tipos de visão que temos ajuda a compreender como os utilizar a nosso favor. Imagem National Geographic
Se a periférica é aquela visão desfocada mas abrangente que de uma forma geral todos conhecemos, as outras duas ficam um pouco mais distantes da gíria comum, podendo ser grosseiramente definidas respetivamente como a de foco máximo e a de meio foco.
No entanto, tentar garantir que conseguimos maximizar a nossa capacidade de foco máximo não chega para vermos melhor, nem que seja porque isso é impossível de atingir, pois estamos limitados pelas capacidades do nosso hardware, ou seja, dos nossos olhos, e até certo ponto, do nosso cérebro.
Isto porque não temos forma de modificar a amplitude de visão foveal de cerca de dois graus, ou os cerca de cinco para cada lado na parafoveal, ou tão pouco conseguimos alterar o tempo médio de 225 milissegundos que demoramos a conseguir fixar uma imagem.
Essa fixação, vamos assumir numa pedra, é então atingida por um movimento repentino dos olhos chamado de movimento sacádico - ou sacadas - que permite aos nossos olhos saltarem entre pontos de interesse, neste caso, entre pedras, por exemplo.
No entanto, não nos serve de muito fazer sacada atrás de sacada se não fizermos nada com a informação que estamos a ver, e é aqui que entra o processamento cognitivo.
Assim que olhos se fixam em algo, o cérebro trata de decifrar essa informação de forma a poder tomar uma atitude para com ela.
Até este ponto temos muito pouco controlo, é simplesmente como o sistema funciona, no entanto, podemos facilmente garantir que não vamos sobrecarregar a nossa capacidade de processamento, algo sobre o qual temos finalmente poder de escolha.
Isto porque ao forçar o nosso conjunto olhos/cérebro a trabalhar mais rapidamente do que consegue, significa, entre outros problemas, que a própria leitura das imagens que estamos a recolher pode ser incompleta, ou pouco fiável.
Este fenómeno acontece porque ao estarmos a sobrecarregar o nosso sistema, o cérebro vai ter de preencher as lacunas de leitura de terreno por intermédio de um banco de dados de situações semelhantes que fomos experienciando ao longo da vida.
Ao olhar para este puzzle sabemos diretamente que a peça que falta é de um ramo da palmeira, porque temos uma base de dados cerebral de várias palmeiras que vimos ao longo da vida. No entanto, somente com a nossa base de dados cerebral não conseguimos saber se está um animal neste ramo especifico, por exemplo. Sobrecarregar o cérebro força a que as nossas sacadas da estrada possam estar a omitir perigos, tal como um animal no ramo de uma palmeira. Imagem vermontchristmasco.com
Isso potência a probabilidade de que o que vamos estar a ver pode não ser totalmente credível, obrigando-nos a fazer escolhas de técnica ou trajetória com base em informação dúbia, criando claros problemas de segurança e consistência de condução.
Assim, garantir que conduzimos abaixo dos nossos limites e aceitarmos o ponto evolutivo onde estamos, vai-nos permitir dar o tempo necessário ao nosso cérebro para eficazmente processar a informação que lhe estamos a dar.
Dessa forma, aceitar o ponto de evolução em que nos encontramos tal como as suas limitações, é o primeiro passo para as superar, tal como para maximizar as capacidades que já temos.
Imagina-te a andares na tua mota, e que de repente te aparece uma pedra, um rego, areia, ou um qualquer outro perigo pela frente.
A palavra perigo é o ponto fulcral deste cenário, pois o nosso instinto natural é o do nosso cérebro ver a dificuldade que temos pela frente como um perigo que necessita de resolução.
O problema é que inadvertidamente, a nossa visão vai-se fixar nesse perigo até o cérebro encontrar uma solução de como o ultrapassar.
Assim, e na prática, a nossa visão vai-se fixar na pedra, por exemplo, obrigado o nosso cérebro a correr a sua base de dados até encontrar a melhor forma de a ultrapassar.
Encontrada a solução, os nossos olhos vão fazer uma nova sacada para outro local de interesse, um tronco, por exemplo, deixando o problema da pedra e a sua solução em backorder até o momento em que tiver de ser aplicado.
Compreender como processamos informação ajuda em muito a poder ter mais controlo sobre o que acontece em cima da mota. Imagem da BN Adv com acesso a informação do Thomas Frank e motocrosshideout.com
A forma como o nosso cérebro encontra as soluções é importante de entender, porque mais uma vez, é algo sobre o qual temos controlo.
E temos controlo pelo simples facto de que podemos continuar a investir na nossa formação e treinos, o que potência experiência, algo que vai aumentar a quantidade de informação e soluções que o nosso cérebro tem disponível para trabalhar.
Imagina de quantas maneiras diferentes já passaste por cima das mais diversas pedras nos trilhos, de uma forma geral, o conhecimento técnico de como abordar pedras aliado á experiência que adquiriste, é o que te permite estares confortável quando encontras mais uma pedra pela frente.
Ainda assim, de vez em quando encontras uma pedra que pela sua forma, ou posição, por exemplo, capta a tua atenção, e te leva a fixar nela até o teu cérebro descodificar uma solução.
Como já falamos, essa fixação vai-se manter até a solução ser encontrada, no entanto, por vezes essa solução não existe, ou porque nunca passamos por um problema como o que estamos a ver, ou porque temos pouca experiência com ele, fazendo com que necessitemos de tempo extra para encontrar o melhor plano de ataque.
Quando os nossos olhos fixam, o nosso cérebro procura uma solução na sua base de dados. Utilizando um antigo Rolodex como analogia visual, se for uma informação que utilizamos regularmente, encontramo-la rapidamente, uma que usamos menos vezes, demoramos mais tempo, e uma que nunca aprendemos, pode significar demasiado tempo de pesquisa em vão. Durante esse tempo de pesquisa, o nosso olhar têm tendência a ficar fixado no problema, seja ele areia, uma pedra, um rego, ou qualquer outro problema no track. Imagem fit-pro.com
Esse tempo é importante porque na mota, ao fixarmos algo, vamos alinhar o nosso corpo com a nossa visão, levando-nos diretamente, e contra intuitivamente, em direção ao problema, ou melhor, ao perigo que fixamos.
Essa é a razão pela qual o nível de dificuldade dos terrenos onde andamos, tal como a velocidade com que os atravessamos, deve ser incremental, e estar diretamente relacionada com o nosso conhecimento técnico base, e com a nossa experiencia.
Seguir esta simples solução é o que nos vai permitir evitar fixar perigos durante demasiado tempo, pois por intermédio de treino regular, vamos dar ao cérebro uma mais ampla memória de procedimentos que lhe vai permitir rapidamente dar solução ás dificuldades que nos vão aparecendo pela frente.
Quem nunca, por ter trezentos tabs abertos no seu browser de eleição, e mais quatro ou cinco programas a correr em simultâneo, deu por si a ver o computador completamente bloqueado “só porque estava a escrever um email”.
Na realidade, todos sabemos que o problema não foi o email, mas tudo o resto que estava a correr, e por si, a consumir recursos que não estavam a ser utilizados da melhor maneira.
Em cima da mota, o nosso cérebro funciona da mesma forma, respondendo não só a estímulos imediatos, mas igualmente aos que estão a correr em plano de fundo.
Assim, e sabendo nós que temos um limite de processamento disponível, vemo-nos obrigados a maximizar as capacidades existentes sem exigir mais do que elas permitem, evitando um bloqueio do sistema.
Quando pomos estes conceitos a trabalhar com o funcionamento da nossa visão em condução, começamos a compreender porque olhar para longe é maioritariamente melhor do que olhar para perto.
Ao olharmos para longe, permitimos que o nosso cérebro tenha mais tempo para fazer as sacadas necessárias para escolher linhas e detectar perigos, que por sua vez permite que em plano de fundo que se escolham as técnicas necessárias para se seguir em frente, algo que vai resultar no melhor plano de ataque possível.
Por outro lado, temos a mota, que pela forma como está desenhada têm uma geometria que temos de deixar trabalhar.
Assim, ao olharmos para longe, conseguimos não só não bloquear o nosso computador cerebral, mas igualmente ter o sangue frio necessário para dar á nossa mota a liberdade de movimentos que ela necessita.
Ainda assim, isso não significa que olhar para longe seja sempre a melhor escolha, antes pelo contrário, a escolha de posicionamento preferencial da nossa visão está dependente da velocidade e tipo de terreno em que nos movemos.
Se estivermos a fazer um percurso muito técnico que não nos permita uma velocidade elevada, vamos ser obrigados a olhar para muito mais perto da roda da frente do que se estivermos numa pista aberta de deserto, por exemplo.
Olhar para perto ou longe não altera no entanto os processos que se passam no nosso cérebro ou na nossa mota, significa somente que os mesmos têm de assumir velocidades de execução diferentes, e que nós temos de estar cientes dessa realidade.
Isto assim o é porque a viajar a uma determinada velocidade e a olhar para longe, permitimos que o cérebro tenha tempo de recolher, analisar, e passar a informação necessária aos músculos em esquema de piloto automático.
Por outro lado, a olhar para perto mas a manter a mesma velocidade no mesmo tipo de terreno, vamos sobrecarregar sistemas, porque a sensação é de que o chão está a vir direito a nós muito mais depressa, e isso força instintivamente respostas do cérebro que podem simplesmente não ser necessárias.
Este é um tipo de terreno onde normalmente micro ajustes acontecem por nos focarmos em cada pedra individualmente. Deixar a mota ir ao olharmos para longe, vai permitir que a frente se auto-alinhe pelo trail, o que nos vai aumentar a segurança e velocidade enquanto diminui o risco de queda. Imagem brettkacs.com
No cenário em que olhamos para perto da roda da frente enquanto viajamos em velocidade, ao vermos o guiador virar porque bateu numa pedra, por exemplo, vamos instintivamente puxa-lo para o outro lado o mais rápido possível para evitar uma queda.
No entanto, esse movimento instintivo de micro-ajuste, em vez de ajudar, vai eliminar por completo o trabalho de auto balanço da mota promovido pelo trail, que é efetivamente o que nos iria proteger de um encontro com o solo.
Com isso em mente, somos obrigados a ter de aceitar que nos cabe a nós estar mentalmente presentes de forma a não impedir a mota de trabalhar, nem nos pormos numa situação em que inevitavelmente isso vai inadvertidamente acontecer.
Nesta fase já compreendemos que olhar para longe ou para perto é portanto determinado pela velocidade de marcha sobre um determinado tipo de terreno, ainda assim, deixar a frase desta maneira seria redutor, e como tal, potencialmente enganador.
Isto porque na realidade, quer a baixa velocidade quer em alta, devemos sempre fazer o máximo de scan possível para evitar perdermos a noção geral do terreno.
O que isto quer dizer é que se em velocidade devemos olhar maioritariamente para o limite da estrada para escolher as melhores linhas, temos igualmente de constantemente fazer sacadas para perto de forma a detetar perigos imediatos, obtendo um mapeamento geral do que está á nossa frente.
Regos é um exemplo típico de uma situação em que somos obrigados a fazer sacadas constantes para perto, mas igualmente a fazer scans contínuos pelo eventual ponto de saída do rego, tal como do “caril” que nos vai levar até lá. Imagem dvwoman.com
Em baixa velocidade, somos então obrigados a fazer o contrario.
Nessa situação, devemos principalmente focar a nossa visão mais perto da roda da frente para escolher a melhor trajetória imediata e os perigos a evitar, e fazer scans constantes no horizonte para permitir ao cérebro em segundo plano ir escolhendo a melhor trajetória geral.
Com tudo isto em mente, somos forçados a aceitar algumas realidades.
A primeira é que estamos extremamente dependentes da qualidade da nossa formação base, uma vez que sem ela, o nosso cérebro não terá informação suficiente para automática e diretamente escolher a melhor solução para os problemas que vamos encontrando, sejam eles uma pedra, um rego, ou areia, por exemplo.
Somos igualmente obrigados a aceitar se não mudarmos a nossa atitude com o tipo de terreno e velocidade, o nosso cérebro por si só nos vai induzir em erros, como focar-se prolongadamente em perigos, ou querer instintivamente fazer micro ajustes que contrariam o trabalho natural da mota.
Assim, compreender como a nossa visão tem implicações diretas na forma como reagimos, e de que maneira essas implicações podem ser uma benesse ou um risco, conseguimos mais facilmente compreender os nossos limites, e ajustar o nosso envelope de segurança ao nosso conhecimento e experiência técnica.
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Por definição, o ser humano têm a difícil tentação de só querer acreditar no que consegue ver e sentir, mesmo que esses inputs tenham sido propositadamente adulterados, como acontece no caso da magia.
Ai, os artistas escolhem deturpar a realidade á sua vontade, dando ao nosso cérebro exatamente o que ele precisa para acreditar na qualquer historia que lhe está a ser apresentada.
Para nós, no mundo das duas rodas, o conceito mantém-se inalterado, uma vez que o nosso cérebro se apresenta como um sistema de recolha de inputs que podem ser manipulados e trabalhados, tal como no mundo da magia.
Assim, as técnicas de trabalho de que iremos falar tomam partido desse mesmo principio, permitindo-nos um continuo trabalho de melhoramento da memória de procedimento necessária para qualquer manobra a desenvolver na mota.
Para quem quiser, fica o link para este artigo cientifico muito interessante sobre o papel da memória de procedimento no desporto, desenvolvido pela Universidade de Colónia. Link para o artigo shorturl.at/ftE09
Temos então de pensar na ligação entre a informação que está a ser recolhida pelos nossos olhos, recebida e traduzida pelo nosso cérebro, e finalmente passada para os nossos músculos, como uma estrada.
No dia em que a começamos a construir, ou por outras palavras, no dia em que aprendemos uma qualquer técnica nova, é como se tivéssemos aberto um pequeno e pouco trabalhado caminho de cabras de informação.
No entanto, para garantir uma rápida e eximia aplicação da técnica, precisamos que a informação chegue o mais clara, rápido, e eficazmente possível aos nossos músculos, e isso requer um meio de transferência de dados mais semelhante a uma autoestrada, do que a um caminho de cabras.
Esta explicação é incrivelmente redutora e simplista do tipo trabalho cerebral e nervoso envolvido neste processo, mas como analogia visual resulta para demonstrar o objetivo dos nossos exercícios de sofá, que visam exatamente isso, melhorar a infraestrutura das nossas estradas de informação.
No entanto, esta analogia deixa de lado o grande problema dos treinos sem mota, e um que afasta muitos de sequer lhes dar o valor que têm como método de trabalho.
Isto porque estas técnicas funcionam um pouco como o gato de Shrödinger, até voltarmos á mota, nunca temos bem a certeza se desenvolvemos e aprendemos alguma coisa, ou não.
Ainda assim, quanto mais tempo dedicamos a este tipo de trabalho, mais essa duvida se dissipa, e mais valor damos a este recurso.
Na realidade, estas técnicas são tão valiosas que cada vez mais são utilizados por atletas de topo nos mais variados desportos.
A melhor forma de abordar qualquer técnica em moldes de “TPC de sofá” é claramente criar uma base de aprendizagem de campo bastante sólida.
Isso quer dizer que de forma a podermos trabalhar e fortalecer os nossos “pathways” cerebrais, necessitamos que eles existam em primeiro lugar, e quanto mais completos forem em termos de qualidade e quantidade, melhor.
Por exemplo, se alguém se sentar no sofá a imaginar repetidamente como fazer uma égua na mota, muito provavelmente vai partir os dentes na primeira tentativa de campo, isto porque tudo o que fez, foi sonhar com um objetivo sobre o qual tem zero experiência prática ou conhecimento teórico.
Por outro lado, se estivermos a aplicar estas “técnicas de sofá” após pelo menos uma aula com um instrutor certificado para o efeito, ao termos criado uma forte e estruturada base de trabalho, o resultado final vai mudar drasticamente.
É impressionante ver a proximidade de tempos que mentalmente e fisicamente dividem as duas voltas, tal como prestar atenção á precisão das trocas de caixa. É igualmente importante ouvir o porque deste piloto ter decidido utilizar a técnica de visualização para melhorar a sua qualidade técnica. Vídeo via Instagram @indycar
Vamos assumir então uma curva apertada de 180 graus feita a baixa velocidade.
Por já termos feito esse exercício com um instrutor que nos deu todo o envolvimento teórico necessário, que demonstrou o exercício na prática, e que nos corrigiu e claramente apontou os pontos onde somos fortes, e os em que ainda precisamos de melhorar, temos agora um claro e definido plano de ataque.
Por outro lado, temos também a clara memória do que é o exercício bem feito, tal como a lembrança do que é uma má execução.
Isso significa que sabemos exatamente a pressão que fizemos na embraiagem, no travão, no acelerador, como o nosso corpo estava posicionado na mota, e toda uma panóplia mais de pontos de referencia que podemos recordar e usar.
Assim, podemos facilmente agarrar nesse conjuntos de dados, e literalmente visualizarmo-nos a cumprir o exercício, sendo brutalmente honestos connosco quanto ao resultado final.
Se na minha “volta mental” acelerei demais, então tenho de aceitar que posso não ter mais espaço, e que portanto, falhei o exercício.
Se travei em demasia na frente, tenho de aceitar que poderei cair por ter perdido controle.
O objetivo portanto não é sonhar com resultados, nem tão pouco fazer grandes alterações ao que no campo correu bem, o objetivo é repetir exaustivamente e de uma forma concentrada e consistente o exercício previamente bem executado, prestando muita atenção a qual foi a nossa atitude na altura para com a mota, e a resposta dela.
Sonhar não é o mesmo que visualizar, é crucial manter isso em mente para se poder tirar o máximo partido dos exercícios de visualização. mecgc.club
Por outras palavras, devemos visualizarmo-nos a repetidamente executar a melhor técnica possível dentro das nossas reais e conhecidas capacidades.
Da mesma maneira, agarrar na informação que estamos a utilizar para a analisar passo a passo em termos teóricos, ajuda em muito a compreender limites, e a traçar objetivos para o próximo treino de campo.
Esta técnica é tão eficaz que é amplamente utilizada por profissionais desde cirurgiões a pilotos de F1, onde de olhos fechados, simulam fisicamente cada gesto técnico a cada curva e reta, volta após volta.
A dada altura, o seu cérebro está tão saturado com essa informação, que quando ela é necessária, sai em moldes de piloto automático, permitindo que se tenha mais “espaço cerebral” para outras decisões, leituras, e adaptações.
Um passo importante para qualquer um que queira levar a sua evolução técnica a sério, passa por eliminar os erros de leitura cerebral que tendemos a impor a nós próprios.
Seja na mota ou fora dela, já todos tivemos pelo menos uma situação em que na nossa cabeça executamos perfeitamente um movimento, tenha este sido um mergulho para uma piscina, ou um derrapagem em cima da mota.
No entanto, quando captamos esses momentos em vídeo ou fotos, tendemos a ser surpreendidos com a diferença existente entre o que achamos que aconteceu, e o que realmente ficou registado para a posteridade.
Na mota, esse tipo de disparidades entre imagem cerebral e realidade acontecem regularmente, e podem gerar problemas complicados.
Se por uma lado, dá uma informação base errada aqueles que querem treinar visualização, por outro, a ideia de que algo foi bem executado a juntar ao facto do objetivo ter sido alcançado, força-nos a enganosamente acreditar que entendemos a fundo o movimento que aplicamos.
É inegável que a diferença entre espectativas, e até mesmo o que o nosso cérebro assumiu que fizemos, versus o que realmente aconteceu. Imagem de @ze_fuzzy via 9gag.com
Assim, torna-se importante criar um sistema de confirmação auxiliar, com um simples vídeo ou uma foto a fazerem maravilhas nesse departamento.
Com isso em mente, filma e fotografa tanto dos teus treinos quanto possível, e quando estás sem poder andar, ou mesmo adicionando este passo aos teus treinos regulares, analisa as imagens que recolheste.
Esta técnica é igualmente utilizada em treinos de topo, sendo transversal desde amadores a profissionais, e isto assim o é porque produz resultados incríveis, quem já teve aulas comigo, por exemplo, sabe bem que este é um recurso que uso regularmente.
No entanto, se não tivermos uma boa base teórica e prática que nos permita fazer um bom trabalho de analise, a utilização desta técnica de trabalho está destinada ao fracasso, por isso, as espectativas de sucesso na sua utilização devem ser ajustadas em fases iniciais de aprendizagem.
Ainda assim, apanhar dois ou três erros é sempre melhor do que nada, e se isso não chegar, muitos instrutores, como eu, têm todo o prazer em ajudar alunos com analise de fotos e vídeos em moldes de formação continua.
Esta ajuda, muitas vezes gratuita, ajuda a rapidamente oferecer a qualquer um uma perspetiva profissional do que podemos estar a fazer bem, ou mal.
Como já vimos, analisar o nossos próprios movimentos é um excelente recurso, no entanto, isso não significa que autoanálise deva ser a única avaliação que fazemos, antes pelo contrario.
Na era digital em que vivemos, a facilidade com que encontramos vídeos e fotos dos melhores atletas do mundo é demasiada, pelo que se torna quase obrigatório o seu uso por parte de quem aprender mais.
Isso no entanto não quer dizer que todas as imagens de atletas de topo seja merecedoras da nossa atenção, não só por facilmente assoberbarem até o mais acérrimo fan, mas igualmente porque grande parte delas não nos vai trazer o valor que podemos pensar.
Isto porque ser-se muito rápido, ou até mesmo vencedor de trofeus, não significa que esse piloto seja exímio tecnicamente, e como tal, digno do tempo necessário para uma analise cuidada.
Esta técnica é tão utilizada que teve direito a um pequeno segmente no documentário TT3D Closer to the Edge (The Isle of Man Tourist Trophy), onde Guy Martin está a analisar corridas para escolher linhas e tentar fazer um plano de ataque para a sua próxima corrida.
É no entanto válida a ideia de que até esses pilotos merecem ser analisados como forma de entender o é que é possível fazer sem uma boa técnica, mas considero esse trabalho mais relevante para instrutores e treinadores do que para quem só procura melhorar a sua própria consistência.
Isso porque apesar desse tipo de trabalho ter claros benefícios, aponta maioritariamente problemas, e não demonstra diretamente soluções que se devam seguir, e como tal, pode facilmente gerar confusão e subsequentes problemas.
Dessa forma, escolher pilotos para analise que se destaquem pela sua consistência, pela sua capacidade de encontrar linhas que sistematicamente provam ser melhores do que as do outros, e que de uma forma geral “dão sempre espetáculo técnico” pela leveza com que executam movimentos, torna-se claramente mais benéfico.
Assim, seja pela analise em camara lenta dos seus movimentos, seja por parar sistematicamente vídeos para tentarmos compreender que linhas vão escolher e porque, vamos lentamente começar a colher os frutos do nosso trabalho.
Entre eles, podemos destacar o continuo reforço positivo que é para o cérebro ver e rever lentamente boas aplicações técnicas, mas também as opções que certas linhas e atitudes nos oferecem.
Isto porque ao vermos e entendermos porque é que certas linhas e escolhas técnicas são consistentemente escolhidas por pilotos melhores do que nós, abrimos uma panóplia de opções que poderíamos nunca ter pensado serem possíveis, saltando de certa forma a fase de tentativa e erro típica da descoberta empírica.
Essa é uma das razões pelas quais esta técnica é tão utilizada em moldes competitivos, pois permite uma avaliação cuidada da competição, tal como uma evolução clara e mais rápida de qualquer desporto.
O grande problema destas técnicas que falamos é a falta de sinceridade e empenho com que muitos as abordam.
Se já referimos que sonhar que estamos a fazer qualquer coisa não resulta, analisar os nossos vídeos ou os de outros com a mesma descontração com que vemos uma corrida num bar com os amigos, também não.
É crucial não confundir ver corridas com o trabalho de analisar corridas. Esta simples mas errada confusão leva muitos a não conseguirem fazer estas técnicas funcionarem para eles. Imagem roadracingworld.com
Isso significa que para podermos tirar partido destes recursos, e de facto melhorar as nossas capacidades técnicas sem necessitarmos de estar fisicamente em cima da mota, precisamos na mesma de lhes dedicar tempo, concentração, e compromisso.
Com isso em mente, muitos perguntam porque devemos então dedicar um minuto que seja a pensar em andar de mota, em vez de efetivamente estarmos a gastar gasolina e pneus, uma pergunta para todos os efeitos, justa.
Se muitos, ou por estarem fisicamente afastados da mota por lesão, por exemplo, encontram neste tipo de técnicas uma ótima forma de manter e melhorar proficiência, para outros, torna-se simplesmente um método complementar de trabalho.
Nenhum bom atleta melhora consistentemente por somente repetir a sua arte até á exaustão.
Qualquer regime de treino de quem leva técnica a serio requer uma multitude de variantes, dentro e fora da mota, e estas, são somente algumas das que muitos escolhem adotar como método de se tornarem mais multifacetados, equilibrados, e consistentes.
Assim, sejas profissional á procura de uma qualquer vantagem sobre um adversário, ou um guerreiro de fim de semana á procura de maximizar a tua aprendizagem, lembra-te, existe muito que podes desenvolver na tua forma de conduzir sem nunca sequer precisares de sair do sofá.
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Um erro típico na definição de pilotos tecnicamente maus, é a de que técnica deficiente promove muitas quedas, um erro de analise justo, mas igualmente enganador.
Isto assim o é porque cair, ainda que seja indicativo de que algo está mal, não têm obrigatoriamente de ser sinónimo de que o que têm de mudar é a técnica do piloto.
Marc Marquez, sendo um atleta com muitas quedas a seu nome no desporto rei da velocidade em duas rodas, é um ótimo exemplo, porque apesar do seu elevado registo de encontros com o alcatrão, é igualmente um dos pilotos com a melhor capacidade técnica do pelotão.
Assim, as suas quedas não podem ser diretamente marcadas como erros de abordagem técnica, mas ao invés, talvez por um desejo potencialmente excessivo de querer encontrar limites, ou por uma abordagem mental demasiado agressiva.
Marquez é decididamente um daqueles pilotos em que é difícil analisar fotos, pois nunca se sabe bem se o que se vai seguir é uma queda, ou uma recuperação do outro mundo. Imagem de motorsport.com
Falei do exemplo de Marquez, mas a nível lúdico, todos conhecemos pelo menos uma pessoa que é incrivelmente rápida, tecnicamente sã, mas que é igualmente um dos que mais quedas têm a seu nome.
Dito isto, se quedas em demasia não são obrigatoriamente sinal de técnica fraca, falta de quedas também não é sinónimo de técnica eximia.
Desde pilotos que não gostam de arriscar, ou que escolhem sistematicamente percursos mais permissivos onde erros são mais facilmente perdoados, ou que por uma inteligente escolha de mota vêm peso e tecnologia a compensar as suas falhas, muitos conseguem fazer uma vida fora de estrada com poucas quedas de relevo.
Isso pode ser sinónimo de inteligência ou conservadorismo, no entanto, os anos de experiência acumulada sem quedas, não significam diretamente que esses pilotos tenham desenvolvido uma técnica de excelência.
Aceitando que quedas isoladas não devem ser método de analise, muito escolhem utilizar outro padrão, o de quão rápido alguém é, no entanto, velocidade também não deve ser a forma de distinguir quem é tecnicamente bom, de quem não é.
Assim, e antes de mais, devemos clarificar que quando falamos em pilotos rápidos ainda que tecnicamente maus, temos primeiramente de definir o quão maus eles são, afinal, as palavras importam, e com isso, também a sua definição.
Essa definição torna-se ainda mais importante quando por vezes falamos em atletas de topo, com campeonatos nacionais, internacionais, e mundiais a seu nome, forçando a que se tenha de ser muito preciso nas definições que usamos quando apontamos dedos.
É quase criminoso apontar o dedo a James Stewart, provavelmente um dos seres humanos mais rápidos em cima de uma mota de fora de estrada que alguma vez existiu, no entanto, pelos padrões atuais, é fácil ver dois erros técnicos distintos na posição dos seus pés nesta foto. Imagem livemotocross.com
Com isso em mente, vamos para o efeito deste artigo definir “tecnicamente mau” como a antítese de tecnicamente consistente, ou no mínimo, como sendo alguém com erros recorrentes e persistentes.
Essa definição leva-nos a ter de aceitar que apesar de todos os erros que um piloto possa ter, vai também ter bastantes pontos onde é exímio, o que ao mais alto nível, permite a muitos atingir as velocidades e títulos pelos quais são conhecidos.
Aceitando esta premissa, e as implicações da mesma, temos de manter em mente que técnica em duas rodas não pára de evoluir, o que obriga a que tenhamos de fazer as nossas avaliações técnicas de uma forma contemporânea, mas ainda assim inserida no percurso evolutivo que nos permitiu chegar onde estamos hoje.
Se, por exemplo, pudéssemos por o Airton Sena a conduzir um Formula 1 atual, estou certo que ele continuaria a ser o piloto exímio que todos conhecemos, mas ainda assim, muito provavelmente iria apresentar erros técnicos relativamente aos padrões de condução de hoje em dia.
Isso não quer no entanto dizer que pilotos de outras gerações não possam ou não consigam ser tecnicamente atuais, Valentino Rossi é um claro exemplo de alguém que ao longo da sua carreira constantemente atualizou a sua técnica ano após ano, mas exemplos como o dele são extremamente raros.
Rossi, não só ano após ano adaptou e modificou a sua técnica para se manter atual, como já com muitos anos de carreira continuou a desenvolver técnicas que todos os outros pilotos acabaram por copiar, como o Dr. Dangle, a técnica de tirar a perna na travagem para curvas. Imagem redbull.com
A maioria dos pilotos, principalmente os que só têm a oportunidade de aprender técnicas diferentes tarde, tendem a aplicar uma outra abordagem, uma que se torna a escolha de eleição da grande parte daqueles que já acumularam muita experiência, dentro, ou fora da pista.
Essa escolha passa então por se deixarem exatamente como estão, principalmente se forem consistentemente rápidos, e tiverem poucas quedas de registo.
Isso não significa no entanto que estes pilotos sejam obrigatoriamente maus por isso, significa somente que de acordo com os padrões atuais, eles vão estar a apresentar pouca consistência, o que faz deles numa leitura contêmporanea, tecnicamente maus.
Somos assim forcados a aceitar que sendo técnica a promover velocidade, os métodos utilizados por alguns podem ser simplesmente incorretos por estarem desatualizados, tornando a definição de bom ou mau uma simplesmente temporal.
Eli Tomac, por exemplo, é indiscutivelmente um dos grandes de todos os tempos do motocross e supercross mundial, mas isso não significa que seja livre de erros sensivelmente repetitivos.
Por definição, o posicionamento e trabalho dos seus pés nos comandos, ainda que já alterado relativamente aos seus primeiros anos competitivos, é relativamente preguiçoso, ou no mínimo, não tão ativo e preciso como as técnicas mais recentes requerem.
Isso faz com que o posicionamento dos seus joelhos seja normalmente demasiado frontal, o que regularmente lhe mete demasiado peso no guiador, e consequentemente, na roda da frente.
Agora se isto assim o é, a pergunta de como é que ele consegue ser tão rápido torna-se clara, e a resposta, também.
Por ter uma capacidade física em termos de resistência muito acima da média, e um trabalho técnico de tronco tão sólido, este atleta absolutamente único, consegue compensar os erros dos seus membros inferiores, com o dos superiores.
Para muitos, esta explicação de que podemos compensar uma parte do corpo com a outra é a desculpa perfeita para evitar trabalhar técnica na generalidade, mais uma vez, ver as coisas na sua globalidade volta a ser fundamental.
Nesta foto é possível ver Tomac a cometer um erro técnico comum com cada um dos seus pés. Ainda assim, esses erros não o impedem de ser consistentemente rápido, e um dos melhores pilotos de todos os tempos, pois têm um trabalho de tronco irrepreensível. Imagem racerxonline.com
Este erro sensivelmente sistemático de Tomac que o força a por demasiado peso no guiador, é um erro que tipicamente faz a maioria dos pilotos sofrer de arm pump, um problema que têm acompanhando Eli durante toda a sua carreira.
Por outro lado, temos a questão geracional.
Hoje em dia, e olhando para o último campeonato de AMA de Outdoors como exemplo, Eli deu por si em constantes batalhas com Chase Sexton, um jovem que com menos capacidade física mas com uma técnica geral mais refinada, foi o único a sistematicamente conseguir rolar par a par, e muitas vez mais rápido do que Tomac.
Apontei o dedo a este deus do fora de estrada, mas a lista de pilotos que vão ficar na história do motocross, supercross, rally raid, e enduro que têm pormenores técnicos divinais acompanhados de erros que hoje em dia se consideram até certo ponto básicos, é imensa, e típica de técnicas que estão a bater de frente com a evolução natural das novas gerações.
Mantendo-nos no tópico da perspetiva, quem dera á larga maioria de nós poder ter a capacidade técnica de pilotos como Tomac, com erros e tudo, e nesse sonho, não estaríamos totalmente errados.
Afinal, erros em moldes competitivos têm uma relevância completamente diferente da que têm no mundo lúdico onde a maioria de nós vive, ainda assim, isso não deve ser justificativo para um relaxe formativo da nossa parte.
Se por um lado ninguém aprende nada hoje em dia com conhecimento baseado somente em informação de 1950, por exemplo, por outro, para o nosso corpo, uma queda a 50km/h é igual a competir por um campeonato do mundo como é num passeio domingueiro.
Poderia ainda ser argumentado que em competição, entre treinos e provas, situações de risco extremo acontecem mais regularmente, o que significa que a probabilidade de nós em regime lúdico as encontrarmos é mais reduzida, mas ainda assim, existente.
Saltos, por exemplo, são uma realidade inevitável no motocross e supercross competitivo, e mesmo em enduro e rally raid. No entanto, em regimes lúdicos ou amadores, facilmente podemos evitar este tipo de risco, principalmente quando a nossa técnica assim o obriga. Imagem wired.com
Por outro lado, o nível técnico da larga maioria dos pilotos lúdicos e amadores, é regularmente inferior á de atletas de topo, por isso, situações de risco fora de competição, tendem a não necessitar de ser extremas para ser de risco elevado para o mais comum dos mortais.
Com isso em mente, se queremos deixar a realidade imitar o sonho e sozinhos melhorar tecnicamente copiando as características destes atletas de topo, devemos evitar simplesmente imita-los indiscriminadamente, algo que pode fácil e inadvertidamente levar-nos a também adquirir os seus erros.
Assim, devemos antes ir buscar a sua capacidade de memória curta, uma característica que é mais facilmente atingível, e menos passível de criar confusões.
Se situações de risco, potencialmente aumentadas por erros técnicos acontecem regularmente a nível competitivo, isso significa que os sustos também, e com eles a necessidade de seguir em frente como se nada tivesse acontecido.
Todos nós já tivemos sustos fora de estrada, mas alguns, tenham resultado em acidentes ou não, deixam marcas emocionais que por vezes dificultam a capacidade de rapidamente voltarmos a enrolar o punho com confiança.
Por definição, ao estarmos mais tensos, temos tendência a fechamo-nos mais na mota, enrolando as costas e afastado o tronco do guiador, tal como tendemos a agarrarmo-nos mais com as mãos, ao invés de nos alongarmos na mota libertando a frente.
Esta inadvertida reação do nosso corpo dificulta o controlo da mota, o que em termos cerebrais funciona como uma confirmação de que algo não está bem e que temos razão para estar inseguros.
Este circulo vicioso pode ser complicado de quebrar, no entanto, todos estes atletas de topo, estão dotados de uma incrível característica que lhes permite vencer estes demónios.
Apesar de medo ser inerentemente humano, a sua gestão é passiva de ser trabalhada, e estes atletas gerem-no brilhantemente, conseguindo de uma forma virtualmente infalível, quase instantaneamente continuar a rolar ao seu melhor nível, mesmo após as mais assustadoras quedas.
Uma das razoes pelas quais treino mental é extremamente importante, é para se conseguir conquistar demónios, e se conseguir rapidamente voltar para cima da mota depois de uma queda ou lesão. Imagem racerxonline.com
Isso, em conjunto com uma postura mental focada, permite que a técnica deles, mesmo com possíveis erros, seja aplicada da melhor maneira que lhes é possível, dando ao seu cérebro uma normal resposta da mota, permitindo-lhes rapidamente arquivar a queda ou susto como uma probabilidade estatística do desporto.
Assim, não se deixem influenciar por resultados, campeonatos, ou velocidade, técnica mental e física é algo que todos devemos continuar sempre a aprender e treinar, pois isso, vai sempre melhorar a nossa segurança, consistência, e velocidade final, independentemente do nível que temos quando começamos o nosso percurso formativo.
A resposta a esta pergunta é relativamente clara, com um “absolutamente todos” a ser citado pelos mais puristas, onde eu próprio me incluo, no entanto, num mundo que se pinta de cinzento, ver as coisas a preto e branco gera fanatismos que pouco sinónimo são de evolução.
Assim, sou obrigado a aceitar que pilotos com carreiras feitas de forma empírica - ou com treinadores pouco focados em evolução técnica - não se queiram dar ao trabalho e risco de modificar a sua abordagem de condução quando já contam com muitos anos competitivos a sua nome.
Afinal, durante o tempo de transição entre a técnica antiga e a nova, todos encontramos um período de condução complicado, com o cérebro a ter dificuldade em escolher que abordagem aplicar.
Dessa forma, e quando existe muito dinheiro e responsabilidades na mesa, tal como carreiras restritivas em termos temporais, temos de aceitar que abraçar novas técnicas pode não ser para todos, ainda assim, estes exemplos não são comparáveis com a realidade da maioria dos amantes de fora de estrada lúdico e amador.
Auto avaliação não deve ser só feita sobre a nossa real capacidade técnica, mas também sobre os nossos objetivos, ambições, e reais necessidades. Sistema de autoavaliação BN EnduroCamp
Como já referimos no passado, temos então de fazer uma auto avaliação séria, e decidir se nos inserimos nesse grupo restrito de atletas de topo, ou se somos guerreiros de fim de semana, alguém que começou a andar na terra agora e ainda não desenvolveu maus hábitos, ou um piloto competitivo de meio de tabela que não consegue chegar mais longe, por exemplo.
Esta avaliação pessoal é importante porque as mais avançadas técnicas de condução não se prendem somente por levantar os cotovelos, ou meter o pé no sitio certo, antes pelo contrario, razão pela qual requerem um compromisso considerável, principalmente no inicio.
As mais avançadas técnicas de hoje em dia obrigam a compreender por que é que os gestos técnicos são necessários, como é que fisicamente a mota vai responder, qual o papel do nosso cérebro nas nossas tomadas de decisão, entre outros pontos que permitem compreender a fundo o porque, e não só o como.
Esta pequena grande diferença de abordagem pode parecer simples, mas ao trocarmos o como pelo porque, estamos drasticamente a aumentar a nossa segurança e capacidade de resolução de problemas, algo que têm o incrível efeito secundário de nos tornar consistentemente mais rápidos.
Assim, apesar de todos devermos estar continuamente a aprender e desenvolver técnica, num mundo onde tecnologia não para de evoluir, temos além de nos perguntarmos se devemos investir na nossa formação continua, considerar também se achamos lógico querer conduzir as motas mais atuais do mundo, com as técnicas do século passado.
Diz-se na gíria popular que quem não sabe ensina, no entanto, esse chavão popular está pejado de problemas.
Se por um lado remete para a ideia de que todos os educadores são executadores falhados e potencialmente frustrados, implica também que só os especialistas a fazer algo o devem ensinar.
Vamos fazer um exercício, pensem num qualquer desporto à vossa escolha, e pensem nos melhores atletas dessa modalidade.
Quase todos eles, senão mesmo absolutamente todos eles têm a tempo inteiro - ou no mínimo pontualmente - um treinador a seu lado, e se em muitos casos sem dúvida que esses treinadores foram excelentes executadores em seu direito, em muitos outros, não.
Isso assim o é porque o papel do treinador não é o de ser o melhor executador no presente, ou de o ter sido no passado.
Eu sou um instrutor certificado que nunca competiu em duas rodas, ou têm pretensão de o fazer. O meu amor pelas motas vêm da minha paixão de ensinar e de ver os meus alunos a evoluir, e não de acumular prémios ou de tentar ser o mais rápido ou exuberante. Isso não faz de mim e de outros como eu automaticamente maus instrutores, faz sim de nós, instrutores com percursos e recursos de especialização diferentes. Foto BN EnduroCamp
O papel do treinado é o de ser o melhor formador, e isso diz-nos que se o papel do atleta é especializar-se na sua disciplina, o do treinador é o de se especializar em como ajudar o atleta a conquistar esse objetivo.
Podemos por exemplo referir Bill Belichick, indiscutivelmente um dos grandes treinadores de futebol americano de todos os tempos, que no entanto, nunca jogou um minuto profissional do desporto que treina, ou mais perto de nós, José Mourinho, que contrasta uma invejável carreira como treinador com a de um jogador de baixo nível.
Por isso, está na altura de esquecermos a máxima de que quem não sabe ensina, ou mesmo dos níveis de especialização que alguns treinadores atingiram a nível competitivo ou lúdico, e começarmos a focarmo-nos no que conta, que é aprender a distinguir quem é especialista a fazer, de quem especialista a ensinar.
Seja como treinadores, alunos, ou atletas, somos todos seres humanos que crescemos a realizar as mais variadas tarefas repetitivas, tornando-nos por definição, experientes na sua execução.
Comer, conversar, dormir ou até mesmo tentar escolher os números vencedores do Euromilhões semana após semana, são somente alguns exemplos que podemos citar.
No entanto, essa experiência acumulada não nos torna minimamente especialistas, como podemos rapidamente provar com uma simples consulta com um nutricionista, terapeuta de fala ou de sono, ou até com uma verificação da falta de prémios milionários que depositámos na conta ao longo dos anos.
Acredito que todos podemos concordar com isso, o que me deixa ainda mais confuso quanto ao motivo pelo qual nós, como pilotos, assumimos que somos imediatamente especialistas de condução apenas porque somamos muitos km de experiência, especialmente quando se trata de fora de estrada.
Muitos pilotos apresentam conduções muito rápidas e exuberantes, com uma larga percentagem deles a somarem muitos kms de experiencia lúdica e/ou competitiva. Isso não é no entanto sinónimo de boa técnica, como esta e outras imagens o demonstram. Imagem hiconsumption.com
Os argumentos mais comuns afirmam que "não houve um trilho intransponível" ou que "raramente caio e nunca tive uma lesão", elevando automaticamente aqueles que o reivindicam ao estatuto de especialistas.
Em teoria, posso concordar até certo ponto, mas quando pressionados por respostas mais detalhadas sobre as suas conquistas, a armadura que muitos pilotos autoproclamados de especialistas defendem com orgulho, começa a mostrar fissuras.
Permitam-me que vos guie pelo seguinte cenário hipotético.
Imaginem um piloto extremamente experiente, com mais de 100.000 kms de fora de estrada pelos mais diversos países, com as mais variadas motas, e sobre os mais diferentes tipos de clima e terreno, e que está agora a preparar mais uma das suas épicas aventuras.
Já no track, o nosso destemido piloto encontra pela frente uma secção de areia fofa e profunda de cerca de 10 kms, que divide a sua posição atual do seu destino.
No entanto, como motociclista experiente que é, ele já encontrou areias fundas no passado, pelo que o que vê pela frente não é minimamente motivo de preocupação.
Assim, e tal como antes, ao chegar ao início da areia, ele diminui a sua velocidade, senta-se e, como sempre, pedala quando perde o equilíbrio, luta para manter momento, empurra e levanta a mota quilômetro após extenuante quilômetro, imbuído de uma força de vontade inabalável que jamais alguém lhe pode retirar.
Quedas fora de estrada, principalmente em areia, são comuns, e parte do desporto, mas isso não têm de ser sinónimo de sofrimento constante. Imagem advrider.com
Após um par de horas esgotantes e exaustivas, a sua provada escolha técnica para enfrentar areia permite-lhe mais uma vez reivindicar vitória, dando lugar a que mais uma medalha seja acrescentada ao seu quadro de honra como piloto experiente.
Este cenário é demasiado comum para muitos pilotos, e em termos de aventuras e histórias para contar, é inigualavelmente imbatível, mas a mim, falta-me conseguir ver onde este tipo de experiência se traduz em especialização técnica.
Vejo sem duvida a glorificação da tenacidade humana, tal como uma vontade inabalável de superar obstáculos, vejo até caráter e convicção, mas mais uma vez, nada disso é sinônimo de especialização.
Este cenário diz respeito a aventura, mas muitos outros poderiam ser citados em termos competitivos, como estou certo que podem imaginar.
Então, se repetição com consecutivos sucessos não chega, o que torna alguém um especialista em coisa alguma?
Vamos então voltar a pegar no mesmo cenário para podermos fazer uma comparação lado a lado com um piloto dotado de um trunfo diferenciador.
Já definimos como a experiência deu ao nosso primeiro aventureiro as ferramentas necessárias para superar o nosso cenário fictício, por isso, e para
não criarmos disparidades, vamos assumir que ambos os pilotos estão par a par em termos de hardware e forma física.
Assim, vamos assumir que ambos estão a usar a mesma mota, com a mesma carga, os mesmo pneus, têm a mesma forma e físico, basicamente tudo igual, sendo que a única diferença, é que o segundo aventureiro em vez de muita experiência, teve formação certificada sobre condução em areia.
Formação certificada de areia é um experiência muito especial dentro do mundo da formação fora de estrada, e uma que muitos escolhem deixar de lado. Imagem blog.motorcycle.com
Dotado desta vantagem, o nosso segundo destemido passa então os mesmos 10 km de areia sem qualquer dificuldade, permitindo-se ter uma travessia mais rápida, fácil, segura, e eficaz.
Este é um cenário hipotético, no entanto, um com quase todos já nos deparamos nos tracks quando vemos alguém com a mesma moto que nós, os mesmos pneus, e aparentemente a mesma forma física a passar com facilidade por locais onde nós sentimos muita dificuldade.
Isto diz-nos que ser capaz de sobreviver continuamente a algo não significa que se tenha desenvolvido a melhor maneira de o fazer, nem tão pouco uma especialização, algo perfeitamente natural num desporto tecnicamente contraintuitivo.
Ainda assim, ser especialista em algo não significa que se conheçam todos os truques, significa somente que se domina pelo menos um, e que se está sempre disposto a continuar a adicionar mais ao nosso arsenal de escolhas.
Assim, um especialista é alguém que conhece seus pontos fortes e fracos, e mesmo que isso não substitua anos e quilômetros de prática, faz uma enorme diferença quando se fica de frente com um problema.
Para a maioria de nós, os nossos anos de formação académica básica foram relativamente os mesmos, permitindo-nos aprender as competências institucionalizadas.
Fomos para a escola com níveis variáveis de birra e, com mais ou menos persuasão, acabamos por aprender os nossos ABCs.
Independentemente do nível de sucesso demonstrado ao longo desse percurso, as competências aprendidas, ou seja, a especialização que começamos a desenvolver, nunca parou de aumentar com o tempo, ou seja, cresceu com a nossa experiência.
Mais tempo de prática não se traduz numa melhor especialização se essa experiência não estiver assente numa base sólida. Meme da me.me
O efeito que a experiência têm no tempo, como o promotor de uma especialização cada vez maior, não é diferente quando se trata de conduzir motas.
Então, a questão aqui não é necessariamente o quão experiente se é, mas sobre que tipo de especialização é que essa experiência está a ser construída.
Se és um piloto de todo o terreno autodidata, existe uma alta probabilidade de que estejas a construir a tua experiencia sobre uma base de maus hábitos, e de uma abordagem ocasionalmente perigosa para com alguns movimentos técnicos.
Com isso em mente, quanto mais especialista fores em algo assente sobre uma base instável, mais riscos corres, e mais difícil te vai ser corrigir esses erros no futuro.
Por outro lado, se estás agora a começar no fora de estrada e decidiste aprender os teus ABCs da terra com a ajuda de um profissional, as tuas bases vão estar bem definidas, e independentemente do sucesso alcançado enquanto definiste esses alicerces, a experiência que vais adquirir sozinho vai ser drasticamente diferente.
Esta abordagem não só te vai levar até aos teus objetivos, como caso sintas que isso não aconteceu, te vai permitir entender quando e se precisas de mais treinos base, para garantir que vais sempre continuar a evoluir sobre princípios consistentemente seguros e sólidos.
Isto diz-nos então que a chave para o sucesso não é obrigatoriamente experiência ou especialização, mas sim uma profunda e honesta autoavaliação.
Embora eu acredite que todos devemos passar por instrução profissional e certificada - como é meu discurso habitual - não julgo aqueles que decidem ignorá-lo, se seus objetivos relativamente a especialização, corresponderem exatamente ao que é possível alcançar apenas com experiência empírica.
O efeito Dunning-Kruger explica perfeitamente o processo de aprendizagem fora de estrada, e a razão pela qual muitos acham que não precisam de passar por ele.
Agora, se te queres tornar num piloto seguro, consistente, e proficiente, então experiência, por mais kms que isso signifique, dificilmente será a única ferramenta que vais precisar para atingires esse objetivo.
Portanto, sê honesto contigo mesmo, sê claro relativamente ás tuas metas, e traça o melhor plano para as alcançares da forma mais rápida e segura.
Quando se trata de condução fora de estrada, deve-se sempre misturar treinos técnicos com profissionais certificados para construir bases de especialização, com kms de experiência para cimentar esses ensinamentos quilômetro após quilômetro.
Ao sermos honestos com nós próprios temos de partir de um princípio básico, o de que não sabemos o que não sabemos.
No entanto, no mercado em que vivemos, nada nos apoia nesse sentido.
Desde marcas que falam em motos mágicas, até amigos a querer dar conselhos em passeios domingueiros, não esquecendo os milhões de horas de How to’s disponíveis no YouTube, critérios para auto avaliações honestas são difíceis de encontrar e criar.
Não quero no entanto dizer que não existam conselhos brilhantes nos passeios domingueiros, ou que o YouTube não esteja pejado de informação absolutamente incrível e fidedigna, ainda assim, essas pérolas de informação tendem a diluir-se num mar de confusão sem um farol que nos guie.
Com isso em mente, em vez de nos focarmos na forma como devemos executar alguns movimentos técnicos, ou abordar algumas dificuldades, devemos antes focarmo-nos no porque das respostas ás nossas perguntas.
Ferramentas como esta da BN EnduroCamp podem ajudar-te a dar os primeiros passos na tua autoavaliação. Podes consultar as regras deste método aqui: https://bn-adv.com/pt/pages/route-and-rider-rating-system
Devemos então perguntarmo-nos se sabemos porque devemos usar esta ou aquela pressão de pneus, em vez de recitar a resposta que nos deram no Facebook, devemos perguntarmo-nos se entendemos o porquê desta ou daquela posição corporal em vez de a tentar imitar sem questões, entre outros exemplos possíveis.
A nossa auto avaliação deve então ser feita na base do “porquê”, e não na base do “como”.
Isto porque fora de estrada, como desporto dinâmico e em constante mudança que é, garante que não vamos encontrar duas curvas ou subidas iguais, pelo que é um desporto que não deve ser feito por imitação pura, ou por citar respostas standard.
Um outro recurso extremamente válido, é o de falar com um instrutor de confiança, tal como ler literatura dedicada que se foque nos porquês, enquanto mantemos em mente a todo o tempo que nunca vamos saber tudo, e que por isso, simplesmente não sabemos o que não sabemos.
Assim, independentemente das escolhas que fizeres quanto á tua auto avaliação, lembra-te, experiência não é o mesmo que especialização, e especialização, significa muito pouco sem uma boa dose de experiência.
Não interessa de quem estamos a falar, de experientes pilotos profissionais a guerreiros de fim de semana, todos, de uma forma ou de outra, somos afetados pelo marketing extremamente agressivo de basicamente todas as marcas.
Se para os mais experientes qualquer frase ou imagem publicitaria é na sua maioria recebida com um sério grau de ceticismo, é no entanto impossível ficar totalmente indiferentes ao que está a ser publicitado.
Afinal, motas como a plataforma 790/890/901, por exemplo, apesar do seu grande porte e potência, provaram ter um equilibro de massas em andamento semelhante, ou mesmo melhor que várias motas mais pequenas, com o mesmo a poder ser dito da plataforma 12GS/GSA, entre outras.
Ver pilotos profissionais e experientes passar com motas de grande porte em alguns terrenos nunca deve ser significativo do que as motas conseguem fazer nas mãos de alguém menos experiente. Imagem advpulse.com
Agora, se essa realidade é suficiente para alimentar esperanças, o facto provado de que o seu porte mostra sempre um ar da sua graça em situações extremamente técnicas, ou numa queda, é o suficiente para gerar suspeitas quando isso é propositadamente esquecido em press releases e discursos de vendas.
Por isso, apesar da realidade do unicórnio de média a alta cilindrada tender a manter-se tão efémera como a mítica criatura com a qual partilha o nome, como comunidade, não deixamos de ser sonhadores, e por isso, de ficar sempre esperançosos quando noticias de uma nova mota aparecem no ar.
Porém, a diferença entre pilotos batidos e recém chegados ao desporto, é que quem já levantou muitas motas do chão, e já deu por si a sentir uma mota mudar as suas características assim que o terreno muda, tende a rapidamente descartar a ideia de unicórnios, por muito que em andamento e algumas situações especificas, algumas motas sejam verdadeiramente, mágicas.
Não quero com isto dizer que motas grandes, tenham elas muitas ou poucas capacidades para fora de estrada, sejam inerentemente más escolhas para a terra, antes pelo contrário, cada um sabe o uso que lhes vai dar e como tal, se esta ou aquela será a mota perfeita para si ou não.
O ponto importante é que temos como comunidade - e como pilotos individuais - de parar de acreditar que existem motas que vão automaticamente melhorar as nossas capacidades fora de estrada, quando na realidade, o único truque para esse fim, é aprender pela mão de instrutores certificados, e por muitas horas de trabalho pessoal em campo, algo totalmente independente da mota que se usa.
Formação certificada é uma mais valia para qualquer tipo de piloto em qualquer estado evolutivo. Até treinadores certificados e experientes tiram proveito de treinos com outros instrutores. Foto Enduro.nl
No entanto, e sendo um romântico por natureza, tenho de admitir que todos temos motas mágicas na nossa vida, mas porque elas nos enchem as medidas e cumprem as nossas necessidades e espectativas, e não porque um fabricante ou um comercial nos convenceu que “esta é a que te vai deixar fazer tudo”.
Por isso, temos de começar por ajustar essas mesmas espectativas logo desde a altura da compra da mota, escolhendo o melhor compromisso para as nossas reais necessidades e estado evolutivo, mantendo em mente que nem essa “escolha certa” vai fazer de ninguém automaticamente um piloto seguro e consistentemente bom.
Depois de levarmos a primeira chapada da realidade no que diz respeito aos reais positivos e negativos da nossa mota, estamos agora preparados para a segunda, a da nossa real capacidade de a conduzir e tirar proveito das suas forças e fraquezas.
Apesar de não existirem motas inerentemente mágicas, existem sem dúvida motas mais permissivas que outras espalhadas por vários segmentos, com as de baixa cilindrada a destacarem-se com um dom sem precedentes; a capacidade de fazer parecer que qualquer um conduz bem.
Diz o povo que em terra de cego quem tem olho é rei, e neste caso, quem têm olho para escolher uma destas motas “mágicas”, rapidamente se torna rei e senhor das suas capacidades, no entanto, esse é exatamente o truque destas motas.
Um bom piloto, seja ele competitivo ou não, têm algumas características muito especificas, tal como conhecimento técnico, sensibilidade de leitura da mota e do terreno, mas acima de tudo, uma clara consciência das suas capacidades.
Isso significa que um bom piloto, apesar de ser passível de ter dias melhores e piores, é alguém que dotado uma autoavaliação sólida, sabe exatamente como atacar os mais diversos tipos de terreno, e como os navegar com cada tipo de mota.
Saber adaptar ritmos a diferentes tipos de motas e terrenos é uma das caracteristicas de um bom piloto. Imagem adventureriderradio.com
Essa leitura da sua realidade dá-lhe a capacidade de ser seguro e regular no seu andamento até em dias emocionalmente mais complicados, tal como lhe dá o saber exato de quando está acima do seu limite, escolhendo como abordar o track, ou até mesmo se o deve fazer, fazendo assim dele inerentemente, bom.
Numa mota pequena e de fácil tato, a maioria dos pilotos, especialmente os lúdicos, rapidamente dão por si num mundo em que erros técnicos são perdoados pela engenharia moderna, e em que sustos são mais facilmente controláveis por puro poder físico.
Ainda que haja uma visível diferença de leveza entre esses e os bons pilotos, para muita gente, isso deve-se mais a uma diferença de estilo do que de qualidade pura, e é ai que este truque de magia se começa a tornar perigoso.
Se assumirmos uma curva a cada 100 metros, num dia de 200kms somos obrigados a fazer cerca de 2.000 curvas.
Aceitando esta premissa, sabemos que um piloto bom, por ser consistente, vai fazer todas essas curvas seguindo uma sequencia pré-definida que lhe permite eliminar erros supérfluos, o que aumenta a sua segurança e velocidade geral.
Essa abordagem é também o que lhe permite não usar mais energia do que precisa ao longo do dia, e ao contrario dos seu contrapartes, acabar o track basicamente sem historias de quase acidentes ou sustos.
Por outro lado, aqueles que abordam as mesmas 2.000 curvas de forma inconsistente, ou cada uma á sua maneira, vêm a probabilidade de ter resultados diferentes em cada uma quase como uma garantia, algo que por definição impossibilita consistência, retirando-lhes diretamente o titulo e benesses típicas de um bom piloto.
Assim, torna-se importante aceitar que a mota pode fazer qualquer um parecer bom, mas que na realidade, parecer e ser são duas coisas muito distintas.
Com isso em mente, de forma a evitarmos sustos ou mesmo acidentes, em vez de nos agarrarmos ao facilitismo que algumas motas nos oferecem como meio de sustentar a nossa qualidade de condução, devemos antes aceitar essa permissibilidade como uma benesse a usar na nossa evolução técnica, uma que por si só não ensina nada a ninguém.
Já falei no passado do facto de como devemos aprender com a mota que temos, no entanto, para muitos, a sua realidade dita que necessitam de uma só mota que faça tudo, e isso, por conceito, impossibilita a escolha por uma “mota mágica”.
Assim, nem todos podem tomar partido do facilitismo que motas mais pequenas oferecem na evolução técnica de pilotos, no entanto, e mesmo para os que o podem fazer, o principio evolutivo mantém-se.
Esse principio assenta no simples facto de que independente dos truques que a nossa mota usa para nos dar a ideia de que sabemos conduzir, temos de aceitar o facto de que não sabemos o que não sabemos.
Exemplo de uma péssima posição corporal que “funciona” até certo ponto porque a mota permite, mas que está longe de promover segurança e controlo. Imagem adventuremotorcycle.com
Usando uma crude mas eficaz analogia, por mais que alguém tenha acesso a dicionários, a um corretor automático, e até mesmo a um gestor de texto que modifique as frases que escreve, dificilmente poderá considerar-se um escritor por conseguir juntar umas frases que se traduzam numa ideia coerente.
Essa aceitação determina que por mais comentários eloquentes que espalhe pelas redes sociais do mundo, a probabilidade de ganhar um Nobel da Literatura ou ser convidado para escrever para uma publicação conceituada são reduzidas.
Na nossa condução, podemos e devemos usar o mesmo principio.
Devemos portanto aceitar que saber utilizar os comandos da mota, a sua eletrónica quando existe, e até mesmo conseguir superar diversos tipos de dificuldades fora de estrada não significa que se saiba andar em segurança e com consistência, da mesma maneira que saber pegar num telemóvel e instalar uns apps de ajuda à escrita não faz de ninguém o próximo Saramago.
Com isso em mente, aceitar onde estamos na nossa evolução técnica traz imensas benesses, sendo que no topo dessa lista temos dois pontos distintos, mas claramente complementares.
Primeiro, ao aceitarmos onde estamos evolutivamente vamos aproveitar mais cada passo, e dar um valor diferente a cada conquista, enquanto garantimos que não damos um passo maior que a perna.
Uma experiencia comum para muitos é a de demasiado rápido darem por si a tentar andar em areia, por exemplo, uma experiencia que para a maioria se divide entre impossível, aterradora, ou simplesmente desmotivante.
Se para alguns a máxima de “água mole em pedra dura” lhes trás as conquistas desejadas no médio ou longo prazo, isso não é sinonimo de um processo agradável, seguro, ou até mesmo tecnicamente são.
Pode ser extremamente divertido tentar superar dificuldades como areia sem se ter obrigatoriamente a técnica correta para o fazer, mas isso não significa que se deve fazer isso continuamente. Imagem advpulse.com
Para outros, o puro sofrimento do processo escolhido é garantia de uma desistência prematura do desporto, ou de um trauma para a vida com esse tipo de terrenos.
Aceitando a nossa capacidade técnica, e remetendo os nossos passeios ao tipo de terrenos que a suportam, a probabilidade de uma experiencia continuamente agradável aumenta em muito, o que aumenta igualmente a vontade de querer continuar a evoluir, e de uma forma geral, de nos mantermos no desporto.
Por outro lado, ao aceitarmos o nosso lugar na escada evolutiva, vamos ao contrario do que muitos podem achar, acabar por evoluir largamente mais depressa do que aqueles que o tentam fazer por insistência.
Isto porque é muito mais fácil criar consistência a repetir os mesmos movimentos técnicos vezes e vezes sem conta, do que estar a tentar um diferente a cada tentativa.
Assim, apesar de água mole conseguir bater até furar, temos de nos lembrar que a galinha acaba sempre de papo cheio, ainda que o faça somente um grão de cada vez.
É sem duvida possível exponênciar aprendizagem com recurso a cursos condensados, nós próprios na BN temos um Treino Expresso que faz exatamente isso.
Ainda assim, qualquer pessoa que já o tenha frequentado sabe que termina o treino com uma quantidade de informação que terá de ser digerida durante dias, semanas, e em alguns casos, meses.
Isso diz-nos que apesar de toda a informação ter sido apresentada, e os exercícios executados, a evolução técnica do aluno não está cimentada quando passa o portão da escola a caminho de casa.
Não me entendam mal, na esmagadora percentagem dos casos a evolução dos alunos é claramente notória, mas manter a ideia do “grão a grão” e sustentar cada passo que damos, mantém-se, pois simplesmente conseguir executar o que é possível, não significa saber domina-lo.
Todos os treinos evoluem na medida que o aluno permite, mas todos os alunos aprendem e testam a mesma teoria, porque isso é que dá o plano individual a cada aluno, tal como os benchmarks que deve atingir. Imagem BN Adv
Assim, a totalidade da informação passada neste tipo de cursos visa abrir horizontes e garantir que se têm um claro objetivo, e não, em esquema do saudoso Matrix, fazer um download instantâneo de informação que se torna imediatamente pronta a aplicar a cem por cento.
Dessa forma, ao aceitarmos o nosso lugar na escada evolutiva, e ao termos um claro objetivo e plano de jogo traçado, podemos passo a passo exponenciar em muito os nossos ganhos técnicos.
Se a nível competitivo isso pode significar estar simplesmente a treinar sem correr durante alguns anos, ou ir fazendo corridas a somente 60 ou 70% das capacidades existentes, em moldes lúdicos, isso pode querer dizer que por vezes tenhamos de sair do trilho e voltar para a estrada.
Alguém que acabou de começar a aprender, mesmo equipado com uma mota que faça truques de magia, deve manter-se por definição primeiramente em terrenos de Classe 1 a 3.
No entanto, uma vez que por norma sistemas de classificação de terrenos não são amplamente utilizados, é fácil darem por si com Classes 4 e mesmo 5 pela frente.
Apesar de não existir obrigatoriamente nada de errado com a tentativa de superação desse tipo de terrenos, a insistência em continuar a faze-los somente porque se conseguio supera-los nas primeiras tentativas, pode deitar por terra o trabalho evolutivo já iniciado.
Afinal, não nos podemos esquecer que muitas motas fazem magia, e que alguns movimentos técnicos já aprendidos exponenciam esses truques, podendo rapidamente passar a noção de que estamos mais evoluídos do que na realidade estamos.
Essa falsa realidade facilmente gera maus hábitos e abre a porta a erros técnicos perigosos e difíceis de corrigir.
Dados Prevenção Rodoviária Portuguesa de 2010/2011 para o programa vamos18-24.pt
A própria estatística de acidentes rodoviários comprova isso, demonstrando um picos de acidentes não nos primeiros dias ou primeiro ano de carta, ou mesmo no fim da primeira década, mas sim entre o fim do primeiro e o quinto ano.
Essa é a altura em que o aprendido na escola em junção com o conforto da já alguma experiência na utilização do veiculo tendem a dar ao condutor um sentimento de controle superior ao que na realidade têm.
Para nós, no fora de estrada, essa realidade é igual, pelo que nos devemos obrigar a ter a humildade de por vezes dizer aos companheiros de aventura que os iremos reencontrar mais à frente no track.
É emocionalmente duro para muitos não se forçar e continuar, afinal, todos os outros o estão a fazer, ainda assim, motociclismo é um desporto individual feito em grupo, o que significa que o que os outros estão a fazer pouco implica na nossa segurança, eficácia, e consistência.
Assim, por mais magoado que o ego possa ficar, vão doer muito menos umas bocas e alguma auto martirização do que uma potencial lesão física, seja no imediato, ou no futuro quando tentarmos uma secção que não estamos tecnicamente preparados para fazer, imbuídos por uma falsa sensação de controlo.
Por isso, se algumas motas enganam, e se a superação de algumas dificuldades em tracks acima das nossas capacidades iludem, cabe-nos a nós ter a paz de espirito para nos respeitarmos a nos próprios e nos permitirmos evoluir com segurança e consistência.
Essa atitude vai mais rapidamente fazer de nós pilotos mais rápidos, seguros, e consistentes, do que qualquer outra abordagem, ou mota mágica.
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O ser humano é um dos poucos animais que nasce basicamente sem capacidades.
Sem capacidade de andar, falar, ou até mesmo de se alimentar sozinho, razão pela qual existe uma obrigação da parte dos pais de não só dar a qualquer novo humano as ferramentas para sobreviver, mas igualmente para prosperar.
Se assim o é em relação ás mais básicas necessidades da vida, também o é em relação a tudo mais, demonstrando claramente que ninguém nasce ensinado em relação a nada, e que necessitamos sempre de algum tipo de mentoria ou de ajuda para evoluir e crescer de forma consistente e sustentada.
No que diz respeito a pneus, esse farol de informação idónea está longe de ser qualquer um dos fabricantes, afinal, de uma maneira ou de outra, todos eles dizem de forma perentória que o seu pneu é o melhor do mercado.
A internet está cheia de comparativos, no entanto, e por todas as marcas dizerem que o pneu deles é o melhor, é importante encontrar comparativos que não se limitem a citar comunicados de imprensa e a dar uma opinião generalista no fim. Imagem via advpulse.com
Se a necessidade de o fazerem é relativamente clara, é obviamente enganosa, afinal, nem todos podem ser os melhores, e em alguns casos, nem a definição de pneus 50/50 ou 70/30 escolhida pelos fabricantes, por exemplo, encontra sempre a concordância do mercado.
Assim, de forma a compreendermos qual o melhor pneu para nós, devemos primeiramente deixar de lado os chavões publicitários e as letras gordas das páginas dos fabricantes, e forcarmo-nos antes nas pequenas, quando elas existem.
Já falamos no passado sobre pneus, como eles funcionam, tal como sobre os princípios de tração, por exemplo, mas muito ficou por dizer.
Os compostos que constituem as borrachas, tal como a sílica, o jogo que os fabricantes têm de fazer entre a resistência de rotação do pneu versus o seu desgaste, o padrão do pneu cuidadosamente desenhado para limpar desde água até pedras, tudo é pensado ao pormenor de forma a produzir a melhor receita possível.
Considerar tudo isso, poderíamos dizer que para escolhermos o nosso pneu ideal deveríamos todos dominar estas matérias, mas isso não é uma realidade, e mesmo que fosse, grande parte das receitas de qualquer fabricante são segredos bem guardados.
Todos compreendemos que pneus de competição fazem diferença na performance. Os que equipam as nossas motas não são diferentes, porque influenciam directamente a nossa confiança e desempenho. Imagem ridersturf.com
Assim, restam-nos de uma maneira geral poucas formas de análise, sendo que uma utilizada por muitos deve ser logo à partida eliminada de qualquer método de seleção, e essa é, escolher um pneu de substituição só por ser o original da mota.
À exceção de algumas menções honrosas, nenhuma marca escolhe um pneu por esse ser definitivamente o melhor par mota/pneu, e isso é algo que nem sequer deveria ter de ser discutido.
É obvio que por norma uma mota de fora de estrada tende a vir equipada com pneus com características de fora de estrada, mas só isso não faz desse pneu o indicado para ninguém, nem tão pouco para essa mota.
A escolha do pneu por parte do fabricante é puramente económica, já que o interesse final de qualquer marca é a maximização de lucros.
Mesmo que assim não o fosse, seria impossível para uma marca acertar no melhor calçado, uma vez que pneus não são feitos para diferentes tipos de motas, pneus são feitos para diferentes tipos de pilotos.
A forma como cada um vê e utiliza o seu pneu é extremamente pessoal, porque tal como em qualquer receita que cozinhemos em casa, cada um acaba sempre por adicionar o seu toque pessoal, e isso, como todos sabemos, altera drasticamente qualquer prato, para o melhor, ou para o pior.
Da mesma forma que quando lemos uma receita que queremos fazer gostamos de experimentar condimentos e escolher adequadamente os nossos produtos base, com pneus a metodologia deve ser semelhante.
Estou à procura de um pneu de estrada, ou de fora de estrada?
Quero um pneu com muita tração, ou com muita durabilidade?
Gosto de pneus mais rijos, ou pneus que sejam muito moles?
Estas e outras perguntas devem fazer parte do checklist individual de cada um, tornando-as a primeira razão pela qual existem graves problemas em perguntar aos amigos ou nas redes sociais “qual é o melhor pneu” ou até mesmo “que pneu recomendam”.
Quantos amigos tens assim? Meme BN Adv
Mantendo-nos na analogia culinária, apesar de haver consenso sobre este ou aquele restaurante ou prato, a experiência que cada um retira de cada garfada é tão pessoal que é virtualmente impossível de partilhar a 100% a opinião de outro alguém.
Assim, essas perguntas generalistas a serem feitas em redes sociais, devem servir como meio de analise média de mercado, e não como forma de encontrar uma resposta definitiva.
Afinal, pneus, principalmente no mundo do Adventure e dual-sport - e à semelhança das motas em si - são um exercício de compromisso, e não podendo falar por nenhum de vocês, posso garantir que pessoalmente não gosto de deixar ninguém escolher por mim os compromissos que tenho de fazer.
Ainda que hoje em dia não existam propriamente pneus maus, por definição, se um pneu dura muito, isso é atingido por comprometer a sua capacidade de tração, sendo o inverso igualmente real.
Um pneu de carcaça rígida, além de ter um feedback claramente diferente de um de carcaça mole, pode também apresentar problemas se for necessário uma reparação de uma câmara de ar no meio do mato, por exemplo.
Um pneu brilhante fora de estrada em termos de durabilidade e tração, por norma, tende a faze-lo comprometendo as suas capacidades em estrada, tal como tende a ter um zoar em alcatrão que para muitos se torna incomodativo.
Até pequenas coisas como um vidro de dimensão diferente afeta directamente a forma como ouvimos ou não a zoada de um pneu. É crucial experimentar qualquer pneu na nossa mota antes de assumir que o mesmo é barulhento, o nosso setup e tolerância faz toda a diferença. puig.tv
Ainda assim, o próprio barulho de pneus cardados em estrada é altamente variável com fatores como o tipo de capacete a uso, e até mesmo a capacidade auditiva do piloto, factos que fortemente influenciam a opinião de cada um sobre este ponto.
Com estes e outros fatores em mente, torna-se simples de entender que o nome do jogo é compromisso, e isso significa que cada um sabe de si, e que acreditar na opinião cega seja de quem for que diga que “este é o melhor pneu”, é meio caminho andado para o fracasso.
Da mesma maneira, alguém que diga que um pneu é horroroso, pode e muito provavelmente estará correto, no entanto, correto no seu ponto de vista, o que significa que esse mesmo pneu pode ser perfeito para mim, que o irei analisar de um ângulo completamente diferente.
Vamos assumir alguém, vamos chamar-lhe piloto A, que faz maioritariamente estrada, faça sol ou chuva, ocasionalmente vai á terra, talvez uma ou duas vezes por mês, e quando o faz vai sempre em percursos de Classe 1 a 2 no máximo.
Podes consultar mais detalhadamente o sistema de classificação de terrenos da BN Adv diretamente no nosso site.
Por outro lado, temos alguém, o piloto B, que estrada só faz para fazer ligações entre trilhos, mesmo que isso implique alguma autoestrada, usa abafadores nos ouvidos e musica no capacete, e quando chega á terra faz terrenos de Classe 3 e 4.
Vamos ainda adicionar o piloto C, que não faz estrada a não ser quando o trilho não permite outra hipótese, já que leva a mota na carrinha até ao inicio das suas aventuras, na terra só faz terrenos de Classe 3 a 5, e sempre que sai com a mota é para fazer tiradas de múltiplos dias com centenas de kms por dia.
Para este exemplo, vamos assumir que todos estes três pilotos utilizam exatamente a mesma mota.
Pensar que os três usam o mesmo pneu é errado, mas não menos errado do que assumir que qualquer um deles irá diretamente, e quando questionado, ter uma visão empática do próximo, algo que lhe permite ver os benefícios que uma diferente escolha de pneus pode oferecer a outro tipo de utilizações particulares.
Afinal, se analisarmos a situação na sua generalidade, de uma forma ou de outra todos eles fazem estrada e terra com a mesma mota, por isso, para fazermos a escolha de pneus acertada vemo-nos obrigados a pensar ao pormenor.
Pneus, tal como qualquer outro acessório da mota, devem então ser escolhidos com base em três pontos fulcrais; o propósito que vão cumprir; se nos transmitem confiança e segurança; e onde estamos dispostos a comprometer.
Se nesta fase o compromisso se torna fácil de compreender, a confiança e segurança pode ainda estar confusa para alguns.
Pilotos experientes e conhecedores conseguem esticar o limite de alguns pneus com excelentes resultados. Imagem via riderzlaw.com
Vamos então adicionar o piloto D, que faz exatamente o mesmo que qualquer um dos outros três pilotos, vamos dizer por exemplo, o piloto B, mas ao contrário deste, o piloto D começou a andar de mota á 1 ano, quando o outro tens mais de 10 anos de experiência neste tipo de utilização.
Essa diferença de experiência implica que ambos os pilotos, apesar de fazerem exatamente o mesmo uso da mesma mota, o fazem com ritmos e níveis de agressividade diferentes, tal como que vão buscar feedbacks muito distintos da mota e dos pneus.
Assim, mais uma vez voltamos á ideia de que pneus são feitos para pilotos e não para motas, uma noção crucial de manter em mente.
Já entendemos que escolher pneus é um compromisso.
Já entendemos que o pneu do nosso amigo, ou até mesmo o que vêm de origem para a nossa mota não é obrigatoriamente o melhor para nós.
Já entendemos também que á medida que vamos tendo mais experiência, alterando a nossa forma de conduzir, ou até mesmo somente impondo diferentes níveis de agressividade, podemos ter de escolher pneus diferentes, então, falta-nos agora saber como fazer a escolha certa.
Infelizmente, esta é a parte ingrata da temática dos pneus, é que não existe uma resposta correta, o que existe, no entanto, é um método para a atingir, um que é moroso, trabalhoso, mas muito eficaz na sua generalidade.
Infelizmente tentativa e erro é a melhor forma de aprender que pneus funcionam para nós e não, e é uma que nunca vai parar. Imagem pinterest.com
Esse processo assim o é porque utiliza a mesma base de trabalho que qualquer investigação cientifica usa, tentativa e erro baseada em dados, por isso, o primeiro passo é a recolha dos dados que temos.
Para essa recolha, devemos então tentar agregar tanta informação quanto possível.
Qual o teu ritmo de andamento, qual a tua experiência, a que velocidades gostas de rolar, em que tipos de piso passas mais tempo, qual a durabilidade que esperas de um pneu, o barulho do pneu é uma coisa que te incomoda muito ou não, em que condições climatéricas vais andar, estas e outras perguntas devem ser analisadas.
Depois dessa analise, vem a parte do compromisso, a altura em que depois de veres que o mercado simplesmente não têm nenhuma oferta que responda a todas as tuas necessidades, tens de escolher que pontos são mais importantes para ti, e do que estás disposto a abdicar.
Se fores incrivelmente sincero contigo, e fizeres esta analise sobre as tuas reais necessidades e compromissos atuais, e não a pensar na viagem que um dia gostavas de fazer, ou naquele passeio esporádico de dois ou três dias que gostas fazer com os teus amigos, vais chegar a um ponto fulcral da escolha de qualquer pneu.
Vais chegar ao ponto em que ou encontraste duas ou três opções que cumprem o que precisas, ou se queres pedir conselhos, vais poder apresentar a pergunta com todos os dados que tens, algo que vai largamente ajudar a filtrar os reais conselhos dos comentários egoístas e descontextualizados de quem só quer falar da sua própria experiência.
Se fizeste esta analise de uma forma justa para contigo mesmo, deste por ti não só com uma lista de potenciais pneus, mas também com uma forte base de dados.
Assim, estás agora preparado para começar os teus testes.
Se estiveres a escolher um pneu para um aventura em que possas ter de trocar o pneu ou uma câmara em campo, deves garantir que o consegues trocar. Certos pneus têm uma carcaça muito rija que pode ser muito difícil para alguns de conseguir lidar somente com sacas. Imagem de advpulse.com
Se de alguma forma o pneu que tens instalado na tua mota cumpre pelo menos a maioria dos pontos que procuras, gasta-o até ao fim.
Esse tempo de teste vai-te permitir não só confirmar se as tuas considerações iniciais estavam corretas ou precisam de ajuste, mas igualmente, ajudar-te a potencialmente adicionar mais alguns pontos que podes não ter equacionado no inicio.
Se o pneu que tens na tua mota não cumpre de forma nenhuma o que procuras, como por exemplo teres um pneu estradista quando queres fazer fora de estrada, então tens o teu trabalho dificultado.
Essa dificuldade vem pela forma de um teste cego, em que vais ser obrigado, sem dados suficientes, a escolher uma das hipóteses que te apareceram depois da tua análise inicial, e começar os teus testes dai.
Pneus por norma não duram muitos kms, por isso, rapidamente vais dar por ti a necessitar de uma troca, e é nessa fase que mais uma vez vais ter de agarrar nas tuas considerações iniciais, tal como nos resultados do teu teste inicial.
Vais ver que com toda essa informação te vão sobrar poucas escolhas no mercado para qual poderá ser o teu próximo pneu, e escolhendo a próxima opção, o processo de tentativa e erro repete-se.
Houve alguns pontos que não foram falados, tal como preços, pressões, ou até mesmo em que ponto o nosso processo cientifico para com pneus pára, e não o foram por uma razão clara.
Se valores monetários devem entrar nas considerações e compromissos, e as diferentes pressões no processo de testes, tal como com a ciência, o processo de descoberta nunca termina.
As nossas considerações e necessidades, tal como onde estamos dispostos a aceitar compromissos, mudam, razão pela qual alguns pilotos acabam por escolher trocas sistemáticas de pneus para ter sempre o pneu certo na altura certa, ou até mesmo ter dois jogos de jantes para se ajustarem mais rapidamente a cada situação.
Da mesma forma, a nossa experiencia e técnica mudam, tal como a oferta do mercado com pneus novos a aparecerem, e antigos a saírem de circulação.
Motas elétricas como a Alta Redshit e a Stark Varg já estão hoje a forçar alteração ás técnicas de condução institucionalizadas, sejam elas da vertente mais empírica ou mais cientifica. Imagem mxnews-online.com
Eu, por exemplo, durante anos usei o mesmo tipo de pneu, porque durante esse tempo respondeu ás minhas necessidades.
Quando deixou de o fazer, troquei, com os pneus que os substituíram a deixaram-me feliz km após kms, ainda assim, hoje, a minha técnica e ritmo alteraram-se, fazendo com que tenha atingido o limite do que os meus atuais pneus permitem, obrigando-me mais uma vez a escolher uma nova opção.
Ainda assim, por já ter muitos anos de recolha de dados, as minhas trocas hoje em dia são feitas na base de palpites calculados, e não de escolhas cegas ou aproximadas.
Conhecimento é poder, sinceridade da analise de necessidades pessoais é primordial, e tentativa e erro é a única forma de desenvolver a experiência necessária para por tudo em perspetiva.
Lembra-te, os pneus servem as necessidades pessoais de cada piloto, e isso significa que por mais tempo que demores a encontrar o pneu perfeito para ti, ele pode não ser perfeito para sempre, mas todos os que experimentaste pelo caminho foram uma excelente escola na tua evolução motociclística.
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Se não queres ler o artigo todo, podemos resumir a necessidade de manter os cotovelos altos a um chavão reconhecido por muitos; a capacidade de manter equilíbrio e estabilidade.
Ainda assim, isso diz-nos tanto ou tão pouco como nada, prova clara de porque é que chavões estão longe de ser o método ideal para explicar este ou de qualquer outro movimento técnico.
Assim, temos de virar o bico ao prego e entender porque é que ter um mau posicionamento dos nossos cotovelos nos retira equilíbrio e estabilidade, um exercício mental que nos vai mais facilmente ajudar a entender porque devemos aplicar a técnica correta.
Para atingir o nosso objetivo temos então de analisar a nossa posição corporal em diferentes estágios de condução, tal como em reta, curva, e mesmo as diferenças entre tipos de terreno distintos.
Afinal, motociclismo é um desporto - ou atividade se assim o preferirem – altamente dinâmico, pelo que escolher adotar uma só posição para todas as situações é um erro generalizado que tende a levar a problemas.
Para esta nossa analise temos então de compreender de uma forma muito simplista o que é o rake e o trail, focando-nos principalmente no que o trail faz para ajudar a manter a nossa mota em pé, e o que muitos de nós, por desconhecimento, fazemos para dificultar essa ajuda.
É importante entender que existem duas medidas de Trail, ainda assim, para o propósito deste artigo, e numa generalidade, falamos sempre do Trail de Chão. Imagem Zero One Racing
Não entrando em grandes detalhes ou preciosismos, o rake é a medida entre a linha vertical imaginaria que passa no eixo da roda da frente e a linha que passa na coluna de direção, um conceito importante para se entender geometria de motas.
O rake trabalha diretamente com o trail, sendo que este é a medida entre o ponto de contacto da linha vertical do eixo da roda com o chão, e a linha feita pela continuação da nossa coluna de direção no solo.
O trail é crucial para a geometria de qualquer mota por uma variedade de razões, no entanto, e de uma forma generalista e simplista, podemos para os efeitos desta explicação dizer que menos trail significa uma direção mais rápida e nervosa, com mais trail a significar uma direção mais lenta mas mais confortável.
No entanto, esse não é o ponto que me leva a falar do trail, mas sim o que obtemos quando olhamos para o que isto significa de um ponto de vista diferente, neste caso, visto de cima.
Ao vermos o que acontece por aqui, podemos analisar e compreender que ao termos qualquer situação que retire a roda da direção do movimento, por termos uma medida de trail, o pneu vai ter tendência a realinhar-se sozinho, o que significa que a mota em si, se vai querer manter em pé.
Se já alguma vez viste vídeos de motas a andarem sozinhas porque o piloto caiu, o que presenciaste foi este efeito.
Enquanto as motas tiverem velocidade vão-se manter em pé e não vão cair porque o trail, até certo ponto, está a garantir que a direção se mantem automaticamente alinhada, e por consequência, que a mota se mantém com as rodas no solo.
Em alcatrão, este realinhamento acontece a uma velocidade bastante elevada, porque o terreno tende a ter muita tração e consistência, e a suspensão tende a não trabalhar tão arduamente como na terra.
Fora de estrada, por outro lado, este fenómeno de realinhamento demora mais tempo, sendo que em situações como areia e água, por exemplo, devemos esperar tempos de reação ainda mais lentos do que em terra batida, por exemplo.
Esta explicação é importante porque se tivermos a tentar fazer micro ajustes no guiador de uma forma constante, ou a impedir que eles existam por agarrar no guiador em demasia, em vez de permitirmos que a geometria da mota trabalhe a nossa favor e se auto alinhe, vamos antes estar sempre no limiar de uma queda.
Já o disse no passado e voltarei a dizer, técnica de condução não é intuitiva, razão pela qual experiência e especialização são coisas bem diferentes.
Com isso em mente, e juntando o conceito de que necessitamos de deixar a mota trabalhar e que devemos evitar micro ajustes para alinhar algo que se vai alinhar por si mesmo, temos de entender o que é que isso têm a ver com os nossos cotovelos.
A posição de cotovelos caídos, comum de encontrar em muitos pilotos de lúdicos a profissionais, deixa-nos os braços de alguma forma bloqueados contra o tronco, e apesar das consequências dessa posição serem abrangentes, o problema em si resume-se a isso.
Com os braços presos, ou junto ao corpo, é totalmente impossível o guiador mexer sem o nosso tronco mexer, por isso, é crucial evitar a posição de T-Rex quando a conduzir, principalmente fora de estrada. Imagem via tenor.com
Por essa razão, torna-se então importante analisar as consequências e não o problema, já que a solução, como todos compreendemos á cabeça, é simplesmente levantar os cotovelos.
Vamos então assumir um T-Rex, o dinossauro que todos conhecemos, mas para este contexto, não quero que pensem no seu tamanho ou apetite, mas sim nos seus pequenos braços.
É bio mecanicamente impossível para um T-Rex mexer os seus braços de lado a lado sem alterar a posição do seu corpo, para nós, quando deixamos os cotovelos caídos e presos ao tronco, estamos a escolher adotar a posição de T-Rex.
Já ouvi pilotos dizer que gostam dessa posição, pois permite-lhes segurar a frente da mota, mas se isso é contraproducente no que diz respeito a deixar a frente auto alinhar-se, os problemas não acabam ai, e isso torna-se claro se analisarmos a posição corporal a adotar para uma curva técnica apertada, por exemplo.
Diz então a técnica que devemos rodar o tronco no sentido da roda mantendo preferencialmente um certo paralelismo entre o tronco, os braços, e o guiador.
Com essa definição presente, se mentalmente simularmos que numa reta sofremos uma pancada na roda da frente que puxe o guiador de lado a lado enquanto temos os cotovelos caídos e encostados ao tronco, facilmente entendemos que o nosso corpo será puxado no sentido da roda.
Isto assim o é porque a roda ao mexer puxa o guiador, que puxa os braços, que por estarem presos ao tronco obrigam o tronco a girar com a roda, deixando o corpo numa posição de curva técnica apertada, com os braços sem margem de manobra, e enquanto nos encontramos a querer ir em frente.
É clara a diferença de posição corporal do tronco entre cotovelos altos e posição de T-Rex quando existe alguma lateralização da roda da frente enquanto a direção da mota se mantem em frente, e até mesmo durante uma curva técnica, em que baixar os cotovelos retira controlo da roda da frente. Imagem BN EnduroCamp
Dessa forma, em vez de deixarmos a roda da frente auto alinhar-se pelo trail, estamos com a nossa posição corporal a dar á mota a indicação de que queremos virar quando na realidade queremos ir a direito, pondo-nos numa posição que provavelmente irá resultar numa queda.
Este tipo de queda torna-se então facilmente evitável ao simplesmente levantarmos os cotovelos, o que afasta os braços do corpo, e permite aos braços mexerem com o guiador sem perturbar a posição do nosso tronco e o input que estamos a dar a mota.
Falamos no passado sobre o conceito de iniciação de movimento, um conceito que basicamente explica que devemos preventivamente iniciar com o corpo o movimento que a mota vai fazer.
Por outras palavras, se vamos acelerar e a mota nos vai querer puxar para trás, devemos inclinar o tronco para a frente de forna a iniciar o movimento do corpo antes de sermos atirados no sentido contrário, com o mesmo a ser uma realidade para a travagem.
A ideia da iniciação é então estarmos em controlo da mota permitindo-nos uma influência cuidada de onde o nosso corpo está a cada momento.
Se voltarmos á posição de T-Rex, e desta vez imaginarmos que em vez de uma deflexão da direção da roda da frente temos antes um impacto que força a suspensão a recolher, facilmente vemos que os braços estando presos ao corpo nos vão forçar o corpo para trás com diversos graus de violência.
Dependendo da restante posição corporal, ao sermos projetados para trás, a tendência de uma boa percentagem dos pilotos é a de agarrar o guiador pela vida, o que pela posição do tronco e braços vai promover um whiskey throttle, o que forcará o corpo a cair ainda mais para trás levando-nos a uma queda.
Por outro lado, e mais uma vez dependendo da restante posição corporal, muitos pilotos escolhem tirar gás momentaneamente, o que significa que pelo impacto são puxados para trás, por tirar velocidade são puxados para a frente, e ao voltarem ao acelerador voltam a ser projetados para trás, criando um conhecido efeito de boneca de trapos.
Ao levantarmos os cotovelos, os mesmos conseguem absorver os impactos sofridos pela roda da frente como um amortecedor, permitindo então que a roda suba e desça no curso de suspensão com um impacto mínimo no tronco.
Desta forma, conseguimos deixar a mota trabalhar debaixo de nós sem termos de alterar a nossa posição corporal, conseguindo assim manter controlo, consistência e segurança na nossa condução.
Um erro técnico típico de pilotos profissionais a lúdicos é a falta de aplicação do chamado “re-grip”, principalmente na transição da saída de uma curva para a reta seguinte.
Se já conduziste uma mota em auto-estrada, ou em qualquer tipo de percurso onde durante largos kms ou minutos vais com o punho bastante enrolado, conheces bem o movimento de largar e voltar a agarrar o acelerador de forma a poderes manter o nível de aceleração enquanto deixas a mão mais confortável.
É notória a diferença que o re-grip faz na posição não só do pulso, mas também do cotovelo. Imagem dirtbikesam.com e trabalhada pela BN EnduroCamp
Este gesto técnico é conhecido como re-grip, o que literalmente se traduz por re-agarrar, algo que permite retirar o braço de uma posição em que o pulso se encontra dobrado, o que por si força o cotovelo para baixo.
Aplicando este erro na saída de uma curva, ao termos o cotovelo para baixo com o pulso trancado, e o guiador normalmente em contra brecagem, vamos dar por nós em risco de encontrar todos os problemas atrás descritos.
De forma a conseguirmos aumentar a nossa segurança e controlo, devemos então levantar o nosso cotovelo, o que nesta situação, tal como a de aterrar de saltos de maior dimensão, por exemplo, obriga a que se deva reajustar a posição da mão no acelerador á priori.
É no entanto importante referir que pela velocidade de aplicação do re-grip, este movimento nem sempre é possível de fazer instantaneamente, com muitos pilotos a optar por faze-lo antes da curva, durante, ou mesmo por não o fazer em algumas situações em particular.
Ainda assim, não o fazer não significa perder por completo a postura corporal e a elevação do cotovelo o tanto quanto possível, significa somente que ao optar por não usar esta técnica, estes pilotos sabem exatamente o risco que estão a correr, e isso muda drasticamente a abordagem que têm para com o movimento.
Dessa forma, devemos manter em mente que estarmos conhecedores de técnica permito-nos escolhas, e viver somente de experiência, obriga-nos a conduzir com muito menos hipótese de melhorar ou eliminar erros e quedas persistentes.
Nesta fase já devem ter entendido de uma forma geral porque é que manter os cotovelos altos permite deixar a roda da frente trabalhar lateralmente, ao longo do curso da suspensão, tal como porque é que promove estabilidade do tronco, efeitos impossíveis de atingir ao adotarmos a posição de T-Rex.
Assim, ao mantermos os nossos cotovelos altos, ou as asas abertas como alguns preferem dizer, garantimos que nos mantemos na linha escolhida e que a nossa frente pode trabalhar sem restrições.
Ainda assim, proponho que façam mais um exercício mental.
Pensem nas vossas últimas quedas, ou em todas se as que conseguirem em que o culpado ficou registado como a frente ter fugido, e tentem lembrar-se da posição dos vossos cotovelos na altura.
Na larga maioria dos casos, vão reparar que a posição dos vossos braços estava incorreta, e que por estarem caídos e terem limitado os vossos movimentos, isso vos atirou para o chão como uma pedra.
Ainda assim, os cotovelos não são o único ponto de uma boa posição corporal, e como tal, garantir que estamos bem posicionados da cabeca aos pés, que temos uma boa separação, e que estamos a rolar dentro das nossas capacidades, é o que no fim do dia nos vai dar o máximo de segurança e controlo possível.
No entanto, por tudo isso ser uma quantidade grande de informação que demora muito tempo a interiorizar, deixo-vos com a ideia de que devemos sempre fazer formação para aprender mais, tal como com esta dica que vai mais facilmente garantir que deixam de andar de “asa caida” o mais rapidamente possível.
Quando pensamos em problemas com tamanho de motas, pensamos normalmente em motas demasiado altas para o piloto, e isso não é de estranhar.
Com os Portugueses a terem uma altura média abaixo do registado em alguns dos grandes mercados mundiais, e com as motas de fora de estrada - seja de enduro ou aventura - a requererem alturas ao solo elevadas, facilmente damos por nós literalmente fora de pé.
Da mesma forma, pensarmos somente nos problemas de pilotos de baixa estatura é igualmente errado, pois problemas por parte de pilotos mais altos são igualmente reais e prejudiciais para uma condução segura, controlada, e consistente.
Afinal, uma mota que sirva bem toda uma população mundial é algo tão idílico como um par de sapatos que encaixe perfeitamente em todos os pés, por isso, torna-se vital para a nossa segurança podermos identificar os pontos problemáticos, e saber como lidar com eles.
Se tens menos de 1.80m provavelmente já deste por ti a verificar que a larga maioria das motas de fora de estrada, sejam elas de aventura, enduro, ou dual-sport, são demasiado altas para chegares confortavelmente com os dois pés no chão.
Esta realidade é comum, mas não desprovida de quatro falhas de abordagem importantes.
Essas falhas, são a razão pela qual por vezes dás por ti confuso sobre porque é que numa mota com o banco mais alto chegas melhor ao chão do que noutras mais baixas, ou porque é que aquele teu amigo da tua altura não tem problemas nas motas que te deixam em biquinhos dos pés.
Assim, a primeira coisa a manter em mente é que apesar do ser humano ser de certa forma proporcional entre os seu tronco e membros, a realidade é que nem todas as pessoas com a mesma altura vão ter o mesmo comprimento de pernas, ou braços.
Um claro exemplo de proporção é a diferença de altura entre Phelps e El Guerrouj, quando comparada com as suas medidas de pernas a serem sensivelmente iguais, nos 81cms. Imagem BN EnduroCamp
Desta forma, quando pensamos em altura do banco ao solo torna-se crucial medir a distância entre a nossa virilha e o solo, e não a nossa altura total, pois a medida das nossas pernas é o que vai contar para este ponto especifico.
O segundo erro, é assumir que necessitamos de ambos os pés no chão para estarmos seguros em cima da mota.
As leis da geometria são claras, ditando que bastam três pontos para termos um plano, e que um plano, por definição, é uma estrutura sólida.
Dessa forma, e tendo a mota logo á cabeça as duas rodas no chão - pelo menos quando tudo corre pelo melhor - basta-nos um pé bem assente para garantir a estabilidade do conjunto mota/piloto quando estamos parados.
Não me interpretem mal, é sem qualquer duvida mais confortável poder assentar os dois pés no chão, afinal, como seres humanos somos bípedes, sendo-nos então essa a nossa posição mais natural, ainda assim, natural não é sinónimo de impossível, ou até mesmo de desconfortável.
Utilizar só um pé no chão é uma manobra comum para muitos, e o treino faz a diferença no conforto da aplicação desta manobra que modifica em muito a estabilidade do conjunto mota/piloto. Imagem womenridersnow.com
Em terceiro lugar temos de ter em conta a largura do banco, um dado que é raro encontrar nas listas de especificações de motas.
Se, por exemplo, medires 70cms da virilha ao solo com os pés juntos, diz-nos a geometria básica que com os pés afastados irás ter uma distancia ao solo inferior.
Isso é uma das principais razões pela qual muitas vezes a mesma pessoa consegue com relativa facilidade estar sentada numa mota de enduro, mas não numa de adventure, ainda que ambas partilhem a mesma altura de banco.
Chegamos assim ao último problema de abordagem, que é muitas vezes desistirmos de uma mota somente pela leitura descontextualizada das medidas cedidas pelos fabricantes.
Se a largura do banco e a medida especifica da perna de cada um tem implicações diretas na capacidade de se chegar ao solo, e se a escolha de utilizar um ou dois pés muda drasticamente as nossas possibilidades, o sag de cada mota é o último condimento desta receita.
O sag é uma medida que deve ser sempre existente, sendo um péssimo sinal se assim não o for.
Desta forma, ao sentarmo-nos em cima da mota, a altura do banco vai-se alterar em relação á sua posição em vazio, podendo tornar uma mota que no papel é impeditivamente alta para nós, numa absolutamente perfeita.
O sag é uma medida que deve ser ajustada quer na frente, quer na traseira, de forma a manter a estabilidade e geometria da mota. Imagem via xvasylum.wikidot.com
Com isso em mente, devemos sempre experimentar qualquer mota antes de fazermos juízos de valor sobre a nossa capacidade de a manobrar.
Se tudo isto falhar e o desejo de comprar uma certa e determinada mota continuar inabalado, continuam a haver opções.
Kits de rebaixamento – ou para levantar a mota - são extremamente eficazes, com a maioria dos fabricantes a oferecer opções de fábrica dentro das alturas máximas e mínimas aceitáveis antes de se começar a alterar por completo as características da mota.
É no entanto importante frisar que rebaixar ou levantar uma mota, seja com kits OEM ou aftermarket, é algo que têm obrigatoriamente de ser feito em ambas as suspensões, pois alterar só uma, apesar de poder funcionar em termos de altura do banco ao solo quando parados, vai drasticamente alterar a geometria e segurança da mota em andamento.
Querendo evitar modificar as dimensões da mota, muitos pilotos, de lúdicos a profissionais, escolhem alterar antes o banco, optando por um mais alto ou mais baixo como método de ajustar da altura a que sentam o rabo.
Ainda que essa opção seja perfeitamente aceitável e recorrente, têm mais implicações do que somente a alteração da medida máxima do banco, nomeadamente, no que diz respeito á medida do banco ás peseiras.
Ter as peseiras demasiado perto ou demasiado longe do banco não promove uma boa ergonomia, rapidamente tornando qualquer viagem desconfortável, tal como a facilidade transição de sentado para em pé.
Apesar do problema de passar de sentado para em pé não se por em desportivas, por exemplo, os problemas de conforto por pouca ou muita distância do banco ás peseiras são transversais a qualquer tipo de mota. Imagem Reddit.com
Poderíamos então dizer que alterar o tipo de banco é um recurso a evitar, mas isso seria eliminar um excelente trunfo no ajuste ergonómico de qualquer mota.
Dessa forma, o que se torna importante de reter, é que ao alterar o banco - ou mesmo sem o fazer - se pode tornar importante ajustar a posição das peseiras, seja em altura, verticalmente em relação á mota, ou longitudinalmente, movendo-as mais para a frente ou para trás.
Dito isto, mover peseiras longitudinalmente tem grandes implicações na distribuição de peso quando estamos em pé, razão pela qual esta opção só deve ser escolhida após uma cuidada e ponderada analise.
Apesar de podermos pensar na alteração da posição longitudinal das peseiras por outras razões, para muitos, esta opção torna-se uma necessidade pelo tamanho do pé do piloto.
Se para a maioria dos pés a distancia da peseira ao travão, ou ao seletor de mudanças, funciona sem problemas, quando o número de sapato sobe acima dos 43/44 muitos começam a encontrar problemas.
Pilotos de maior porte podem ter problemas com a distância do pé aos comandos, principalmente se a posição do pé não for a ideal, com algumas motas a impedir uma boa posição de pés para começar, normalmente por falta de espaço. Imagem via bikesrepublic.com editada pela BN EnduroCamp
A escolha por seletores aftermarket mais compridos, ou alterações aos existentes, são validas e devem ser sempre a primeira opção, no entanto, podem simplesmente não ser o suficiente.
Se esse for o caso, alterar a posição da peseira pode tornar-se o único recurso, mas tal como referido anteriormente, um que não deve ser feito sem os seus cuidados.
De forma análoga aos problemas dos comandos nos pés, o mesmo acontece com a forma como chegamos á embraiagem e ao travão da frente.
Não temos todos o mesmo tamanho de mãos e dedos, por isso, um bom posicionamento das manetes faz toda a diferença quer no conforto de condução, quer na nossa segurança.
Assim, existem alguns pontos a manter em mente, com o primeiro a ser a posição da manete relativamente ao ponto de contacto com os dedos.
Assumindo que todos sabemos que em fora de estrada devemos usar somente um a dois dedos nas manetes, vemo-nos obrigados a maximizar a eficácia com que eles operam.
Com isso em mente, utilizar a cabeça de qualquer dedo vai promover muita sensibilidade, mas mais dificuldade de aplicação de força por ter menos dedo a agarrar a manete, principalmente em alguns modelos.
O posicionamento da manete na falange imediatamente abaixo da ultima “dobra” do dedo, promove menos sensibilidade, mas vai permitir o dedo rodar á volta da manete, facilitando a aplicação de força.
Tal como com a dimensão de pernas e braços, nem todos temos o mesmo tamanho de dedos, com a posição dos dedos na manete a ser vital para uma boa utilização da mota. Imagem BN EnduroCamp
Utilizando estes conceitos, apontar á última dobra do dedo, ou dedos, para manusear a manete vai produzir os melhores resultados, podendo no entanto, e em alguns casos, ser necessário o recurso a uma manete com ajuste de distância.
É no entanto importante referir que ser uma manete de tamanho regular ou curta pouco importa neste caso, uma vez que o que estamos a procurar aqui é a simples maximização da nossa biomecânica por uma boa colocação dos dedos.
Para quem utiliza embraiagens de cabo, se uma boa manutenção do cabo e da embraiagem em si vai ajudar em muito a diminuir a “dureza” da manete, puxa-la mais para dentro do guiador vai ser uma ajuda ainda maior, e grátis.
Diz-nos a física através das fórmulas da alavanca, que quanto maior for o braço da força, menos força temos de fazer para obter o mesmo resultado final.
Assim, estarmos a puxar a manete junto ao parafuso de aperto, ou junto ao fim da mesma muda em muito o braço de força, significando que puxar a embraiagem pelo fim da manete nos é muito mais vantajoso.
No entanto, por o fim da manete ser a zona mais afastada do guiador, mesmo pilotos com as mãos maiores podem necessitar de uma manete com ajuste de distância para tirar partido desta dica, seja na embraiagem, ou no travão, que segue exatamente os mesmos princípios físicos.
Se ajustar manetes é importante para se puder operar a mota da melhor maneira, se não chegarmos ao guiador para começar, não temos como operar o que quer que seja.
Esta afirmação pode parecer desajustada, porque apesar de já todos termos visto pessoas a não conseguirem andar numa determinada mota por não chegarem com os pés ao chão, muito poucos podem dizer que não viram alguém arrancar por não chegar ao guiador em condições.
Ainda assim, e apesar de estatisticamente isso estar correto, não significa que todas as pessoas que vimos arrancar o devessem ter feito.
Este é um excelente exemplo do uso exagerado de risers como forma de tentar diminuir a distância do tronco ao guiador, evitando obrigar o tronco a estar sempre caído para a frente. Ainda assim, mantêm-se uma margem de segurança curta para manobras técnicas, mostrando-se então ser uma mota demasiado grande para este piloto. Imagem via advgrrl.com
Isto assim o é porque chegar com as mãos ao guiador está longe de ser a medida mínima para uma condução segura.
Afinal, as motas não andam só a direito, por isso não equacionar a posição do tronco e braços quando o guiador está a batente é um erro que pode custar caro.
O que procuramos para uma posição segura e confortável é chegar ao guiador com os braços relaxados e dobrados mantendo o tronco reto, o que nos permite levar o guiador a batente esticando os braços sem obrigatoriamente modificar drasticamente a posição do tronco.
É sem duvida possível conduzir motas sem se estar nesta posição, mas isso não faz com que a mesma seja confortável, segura, ou que permita algum tipo de consistência técnica sem uma profunda compreensão do risco que estamos a correr.
O recurso a risers ou mesmo a uma alteração do ângulo do guiador são excelentes recursos para resolver este problema, no entanto, não são soluções inócuas, tornando a sua aplicação um trabalho cuidado e que merece mais respeito pela intervenção do que esta normalmente obtém.
Depois de todos estes ajustes, chegamos então ao peso da mota, um ponto que apesar de ser possível de alterar dentro de alguns parâmetros, não é o que me faz falar nele.
Em termos de segurança e ergonomia, a discussão sobre peso de motas assenta somente numa pergunta; consegues levantar a tua mota sozinho se ela cair, ou não?
A pergunta pode parecer ridícula, afinal, quem é que compraria uma mota para fora de estrada que não consegue levantar sozinho, no entanto, a resposta é, infelizmente, muita gente.
Cair fora de estrada faz parte do desporto, e isso significa que quedas não estão somente limitadas a terrenos complicados ou ritmos elevados. Imagem via adventuremotorcycle.com
Aceito que para os que utilizam motas de aventura para a estrada, este ponto torna-se meio irrelevante, afinal, o peso só lhes vai ser problemático em algumas situações que podem facilmente ser controladas e dominadas com boa técnica, e mesmo que isso falhe, há sempre alguém por perto para ajudar.
Em fora de estrada, por outro lado, estamos numa atividade onde cair faz parte do desporto, pelo que não conseguir levantar a mota sozinho, ou até mesmo com ajuda, pode significar graves problemas.
Por isso, eu aconselho sempre que se escolha uma mota que se consiga levar pelo menos duas a três vezes sozinho no espaço de um dia, tal como que se aprendam as melhores técnicas para o fazer, sozinho, e com ajuda.
Digo duas a três vezes no espaço de um dia porque podemos facilmente assumir que alguém que esteja a fazer fora de estrada sem conseguir levantar a sua própria mota com facilidade é, na sua generalidade, alguém menos tecnicamente capaz e conhecedor.
Assim, e utilizando essa premissa, facilmente aceitamos que a sua probabilidade de queda é mais elevada, obrigando a que o mesmo deva conseguir “salvar-se” sozinho pelo menos mais do que uma vez por dia.
Da mesma maneira, e mesmo com ajuda, má técnica pode rápida e facilmente resultar numa lesão, o que se por si só pode impedir que se consiga levantar a mota para começar, pode igualmente aumentar a probabilidade de uma nova queda.
Na primeira aula de condução de carro ensinaram-nos que temos de ajustar o banco e os espelhos antes de arrancar, ou pelo era o requerido nos tempos em que tirei a carta.
Nas motas, esse pedido de ajuste é inexistente, e a sua execução, complexa e muito abrangente.
Eu, por exemplo, ao longo dos anos desisti de conduzir certas motas por não as conseguir adaptar bem ao meu 1.70, e dei por mim a gravitar para motas com certas dimensões que mais facilmente me aumentam o conforto, controlo, e segurança.
Isso não quer no entanto dizer que vocês devam fazer o mesmo se não conseguirem um resultado satisfatório com os vossos ajustes.
Se estão felizes com as vossas motas apesar de não serem as ergonomicamente perfeitas para vocês, isso não é diretamente problemático, desde que entendam o que isso significa em termos de segurança, e se protejam de acordo.
Com tudo isto em mente, o meu conselho não vai então no sentido de somente certas pessoas poderem ou deverem conduzir certas motas, mas mais no sentido de compreenderem se a vossa montada é ergonomicamente certa para vocês ou não, e manterem em mente, que design, potência, ou especificações em papel não fazem de nenhuma mota a mais segura e eficaz para ninguém.
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Todos sabemos que quando nos referimos a kits de unhas, não estamos obrigatoriamente a falar de uma escolha estética que obriga a visitas regulares a salões de beleza, no entanto, dizer que nos referimos somente a alguém com capacidades de condução acima da média pode ser incompleto.
Afinal, raramente nos referimos a pilotos profissionais dessa forma, mesmo quando os vemos em situações do outro mundo.
Por exemplo, ver o Matthias Walkner saltar dezenas de metros com a sua mota do Dakar pode-lhe garantir um primeiro lugar na prova, mas não diretamente o titulo de Sr. Kit de Unhas.
O mesmo poderia ser dito de Barreda Bort, que por ter terminado em 10º lugar a sétima etapa do Dakar de 2015, depois de ter conduzido 120 kms só com meio guiador, será para sempre considerado o GOAT, mas por definição, não obrigatoriamente dono de um kit de unhas de referência.
Existe alguns GOATs (Greatest Of All Times) por ai, mas conseguir não só terminar uma etapa do Dakar, mas faze-lo no Top 10 só com meio guiador é um feito limitado a somente alguns. Imagem via justacarguy.blogspot.com
Assim, podemos assumir que ou todos os pilotos profissionais são detentores deste titulo, tornando a sua referencia redundante, ou que o mesmo fica remetido somente para pilotos lúdicos e amadores, e isso é um ponto crucial na definição deste chavão.
É crucial, pois se não se aplica aos melhores do mundo, significa que podemos estar a idolatrar pilotos erradamente, e isso têm os seus perigos e problemas na nossa própria evolução técnica.
Diz-se que a inocência é uma bênção, e eu sou da opinião que isso não e obrigatoriamente uma coisa má.
Uma criança a ver seja o que for pela primeira vez têm um brilho nos olhos difícil de negar, e o seu entusiasmo e emoção sobre a novidade que sobre ela se apresenta torna-se contagiante.
Na vida adulta, temos tendência a perder esse fascínio, e de certa forma assim o é porque temos não só um entendimento mais alargado do que estamos a ver, mas igualmente, e em muitos casos, como se faz, diminuindo o espaço que separa o espetacular e surpreendente, do alcançável e mundano.
No nosso mundo das duas rodas, existem alguns degraus evolutivos onde facilmente damos por nós de volta à nossa mocidade, com olhos esbugalhados de espanto.
A primeira vez que vemos alguém fazer um cavalinho, uma égua, andar na terra acima dos 100km/h, a fazer uma curva em derrapagem, ou até mesmo em coisas mais simples como no movimento de virar uma mota sobre o descanso.
No entanto, ao irmos evoluindo e aprendendo mais, damos por nós a aprender alguns desses mesmos truques e habilidades, e o entusiamo pelos mesmos tende a diminuir, com alguns a tornarem-se mesmo rotineiros, ou “manobras de marca”.
Todos tivemos aquele amigo no liceu, ou mesmo mais tarde na vida, que tinha como imagem de marca andar de roda no ar. Imagem via reviewmotors.co
Com tudo isto em mente, torna-se simples de compreender porque na altura da inocência tendemos a rapidamente atribuir títulos de kit de unhas aqueles que repetidamente fazem os melhores cavalos, ou derrapagens, por exemplo.
Não me entendam mal, não quero de forma alguma retirar mérito dessas manobras ou pilotos, são impressionantes e não se fazem sozinhas, razão pela qual o mérito é mais do que merecido.
O que quero chamar a atenção, é que mesmo dotados na nossa inocência – que não devemos perder – nos devemos perguntar se aquele piloto que nos deixou boquiabertos tem mais truques na manga, ou é somente exímio num.
Essa pergunta é chave, pois tentar evolutivamente copiar alguém que só brilha numa ou duas manobras, pode significar saltar passos importantes, e criar problemas técnicos noutras áreas que podem ser difíceis de corrigir.
Assim, por mais que devamos continuar a dar os parabéns a todos aqueles que fazem algo incrível em duas rodas, devemos sempre tentar compreender se estamos na presença de um “one trick poney”, ou de alguém que é tecnicamente bom em todos os aspetos, tornando-se assim, merecer de uma analise especial.
Se já definimos que ter um bom kit de unhas não é sinônimo direto de ser um excelente piloto, torna-se debatível se é um titulo a ambicionar ou não.
Eu acredito que devemos sempre apontar a algo mais, e procurar não ser reconhecidos como alguém que sabe uns truques, mas sim como aquela pessoa que é simplesmente boa a andar de mota.
Isto assim o é porque na minha visão de segurança e consistência - principalmente nos meios lúdicos e amadores - bom é regularmente melhor do que espetacular.
Isso levanta então uma pergunta clara, como é que se chega a ser um bom piloto, seja a nível lúdico, amador, ou profissional.
Provavelmente o ponto mais importante, é evitar saltar passos evolutivos.
Formação profissional seja em estrada, por equipas como a da ACM, ou fora de estrada com escolas como a BN EnduroCamp, são uma excelente forma de garantir que não saltas passos e atinges todos os objectivos que queres. Foto BN EnduroCamp
Seja com recurso a formação especializada – o que é sempre o meu conselho – ou sendo autodidatas, devemos estar conscientes de que ninguém escreve um bom romance sem saber os a, e, i, o, u’s gramaticais e linguísticos.
Estes meus artigos são um claro exemplo disso.
Por muito informativos que sejam, dificilmente serão candidatos a qualquer tipo de prémio ou menção literária, porque saltei demasiados passos nas aulas de Português para sequer conseguir identificar o que poderia estar a fazer melhor.
Compreendemos assim que conseguir fazer algo, e conseguir fazer algo bem, são dois pontos extremamente dispares, por isso, para sermos bons, mais do que conseguir fazer tudo de forma eximia ou espetacular, devemos saber o suficiente para identificar onde estão os nossos erros, algo que nos vai permitir corrigi-los.
Por isso, mais importante do que ser o mais rápido a chegar ao topo da escada, preocupa-te em garantir que tens o pé bem assente em cada degrau, pois dessa forma, naturalmente vais dar por ti a dominar as habilidades que outrora te deixaram tão admirado.
É indiscutível que um excelente piloto consegue fazer coisas incríveis com qualquer mota, basta lembrarmo-nos do Arrepiado a terminar a Baja Portalegre com uma GSXR1000, por exemplo.
No entanto, não devemos simplesmente assumir que se assim o é, a escolha de mota se torna meio irrelevante.
Antes pelo contrario, todos nós temos pelo menos uma mota que nos faz sentir “em casa”, e para pilotos a quase todos os níveis, ter a mota certa vai maximizar a facilidade com que conseguimos não só evoluir, mas igualmente executar o que já sabemos.
Há imagens marcantes no mundo do fora de estrada, e as retiradas desta Baja Portalegre são prova disso. Imagem imotorbike.my
Isto significa que muitas vezes o nosso gosto pessoal e visual nos engana, e que ao seguir o seu conselho, podemos estar a escolher o caminho mais difícil.
Assim, devemos focarmo-nos em dois pontos principais quando pensamos em escolher a nossa mota; o seu tamanho em relação ao nosso, e o uso que lhe vamos dar.
Quando falo em tamanho, a maioria das pessoas pensa imediatamente na altura do assento ao solo, mas motas podem ser rebaixadas (ou subidas) em alguns centímetros sem alterar drasticamente as suas características, tanto que muitas marcas oferecem essa opção ou de fabrica, ou com peças OEM.
Da mesma forma, a altura do banco ao solo, por mais relevante que possa ser, só é realmente importante quando estamos parados, uma situação que tende a representar uma pequena percentagem do nosso tempo em cima da mota a fazer fora de estrada.
Com isso em mente, devemos antes pensar no tamanho da mota em andamento, algo que se for coerente, irá rapidamente ajudar-nos a ser melhores, o que como bónus para alguns, irá de certa forma passar a ideia de que estamos na posse de um verdadeiro kit de unhas.
Por isso, quando pensares no tamanho de uma mota, pensa na altura que tens entre o teu rabo e o banco quando estás em pé, pensa no quanto tens ou não de retirar o teu corpo de posição para poder mexer o guiador, e até quando tens de te chegar á frente para chegar ao guiador em primeiro lugar.
O outro ponto crucial é então o uso que lhe vamos dar.
Não nos podemos esquecer que uma dual-sport ou adventure pode fazer os mais diferentes tipos de terrenos e ser utilizada para os mais diferentes fins. Foto motorcyclenews.com
Se uma mota de 100cv pode ser uma delicia na estrada, pode significar uma margem de erro curta fora de estrada, e uma garantia que muito dificilmente iremos conseguir enrolar o acelerador a fundo em qualquer situação.
Apesar de haverem outros exemplos, escolhi este porque existe algo muito especial em conseguir esgotar o acelerador de uma mota mantendo o controlo sobre a mesma, pois nesse ponto descobrimos limites, nossos e da mota, o que nos permitirá continuar a evoluir com uma margem de segurança considerável.
Por isso, é tão importante ter em mente que por vezes menos é mais, como é que ainda que seja possível fazer tudo com qualquer mota, a certa vai-nos ajudar mais do que a mais bonita.
Se tivermos em mente tudo aquilo que aqui falamos, rapidamente somos arrancados da fase da inocência, mas isso não significa que se perca o prazer de olhar para o que os outros estão a fazer.
Manobras incríveis continuam a ser incríveis, motas lindíssimas continuam a ser lindíssimas.
O que muda, é o que podemos fazer com a informação que nos esta a ser apresentada.
Assim, o que podemos e devemos fazer, é após o momento de “uau”, aproveitar para olhar para o que acabamos de ver com uma visão critica e de análise, afinal, analise é uma ferramenta extremamente poderosa para a evolução de qualquer motociclista.
Mas não deturpem o que eu estou a dizer, eu não quero passar a ideia de que devemos passar julgamento sobre o que estamos a ver.
Cada um é como cada qual, e as opções de cada um só a ele lhe dizem respeito, por isso um olhar critico, não significa lançar uma critica.
O que quero dizer é que devemos aproveitar para tentar compreender onde estão as forças e as fragilidades de algumas opções, e aprender com elas.
Por exemplo, é impressionante ver alguém como a Jocelin Snow fazer o que faz com uma 1200GS, e duvido que alguém consiga justificar o contrário.
Tamanho não impede ninguém de fazer nada, mas ser demasiado alto ou demasiado baixo para uma certa mota está longe de facilitar a tarefa de se ser bom e consistente fora de estrada. Imagem via motomag.gr
No entanto, olhando para ela a andar através de uma lente de análise, facilmente entendemos que muitas vezes a disparidade entre o tamanho dela e o da mota lhe dificulta imenso a vida, e a obriga a uma atenção, controle, e entrega que outros podem dispensar ao passar nos mesmos locais.
Isto é visível quando por exemplo num rebound, o banco lhe acerta no rabo e a projeta para a frente, ou como o seu corpo é forçado a sair de posição de forma a ela poder mover o guiador entre batentes como acontece em areia.
Se por um lado, ela conseguir controlar estas limitações torna o que consegue fazer ainda mais impressionante, não consegue por outro negar o facto de que por mais controlo que ela tenha na sua mota, provavelmente existiram outras que lhe permitiriam fazer o mesmo com menos esforço.
O mesmo poderia ser dito sobre outros movimentos técnicos, ou pares piloto/mota.
Ainda assim, essas dificuldades ou facilidades que cada um encontra não invalidam o prazer que é retirado da experiencia, e isso também deve ser tido em conta, pois é um parâmetro extremamente relevante.
Assim, utilizando o exemplo deles como material de analise, podemos facilmente criar paralelismos connosco, e aprender com as escolhas deles de forma a maximizar as nossas.
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Apesar de acreditar que a comunidade das duas rodas fora de estrada é de uma forma geral extremamente unida, é relativamente comum encontrar-se em qualquer post online sobre um qualquer passeio, pelo menos um comentário a apontar que “isso não é fora de estrada”, ou algo semelhante.
Não é o objetivo deste artigo explicar porque é que esse tipo de comentário é socialmente prejudicial, mas é totalmente dentro do âmbito do que quero falar explicar porque é que esses comentários são simplistas, e ainda assim, de certa forma, compreensíveis.
Pode-se definir como estrada qualquer caminho alcatroado ou empedrado que vai de um ponto a outro, onde podem transitar veículos, pessoas, ou animais.
Imagens semelhantes a esta são um exemplo dos ainda muitos utilizadores de trilhos em Portugal. Imagem via vitormadeira.files.wordpress.com
Usando esta definição, fora de estrada é portanto todo e qualquer caminho que fuja a essa regra, ou seja, que não esteja alcatroado, empedrado, ou de uma forma geral, cuidado e mantido.
É então de salientar que a determinação do que é fora de estrada é factual, e não emocional ou pessoal.
Assim, é tão fora de estrada o caminho que o Tio Manel faz a ir para da aldeia para o monte, como é o que qualquer piloto do Dakar faz ao cruzar as maiores dunas do planeta, e isso é importante manter em mente.
É importante porque nem todos os amantes ou utilizadores de fora de estrada querem competir no Dakar, e isso são excelentes noticias que devem ser abraçadas e incentivadas.
Nenhum desporto consegue existir somente no seu expoente máximo, por isso, quando alguém que gosta de hard enduro diz a alguém que está a fazer ADV que o terreno onde eles estão não é fora de estrada, por exemplo, isso não só reflete pouca empatia, como passa a ideia de que o que aquela pessoa está a fazer não é válido.
Igualmente criticável, são comentários a indicar que esta ou aquela mota são um desperdício para o terreno onde estão a ser utilizadas.
Mais uma vez, o nível de empatia e respeito pelo próximo que é demonstrado nesses comentários é preocupante, pouco construtivo, e indicador de uma falta de visão global do nosso desporto.
É irrelevante o tipo de mota ou a velocidade a que se podem fazer estes estradões, tudo o que conta é o prazer que o piloto tirou dessa experiencia. Imagem OneWheelDrive.net
Ninguém faz a sua primeira experiência de todo o terreno no Erzberg, não começamos todos a fazer terra com uma DT aos 14 anos, nem temos todos o mesmo poder de compra.
Na realidade, o único ponto que nos une a todos é o amor por levantar pó.
Por isso, torna-se importante manter em mente que há todo o terreno para todos os gostos, carteiras, e níveis de experiência, tal como que mais depressa vamos incentivar alguém a experimentar terrenos e motas diferentes com ajuda e compaixão, do que a fazer comparações com aquilo que nós gostamos e conseguimos fazer a nível pessoal.
Esse tipo de respeito e incentivo construtivo faz a diferença entre uma comunidade crescente e saudável, e uma dividida e estagnada na sua evolução.
Nunca fui um grande aluno a Português ao longo da vida, e só muitos anos após ter terminado o meu percurso académico é que comecei a dar valor a alguns pontos linguísticos, entre eles, o peso das palavras.
O dicionário não é um livro volumoso por capricho, mas sim porque existem imensas palavras diferentes, e todas elas com significados únicos.
Mesmo sinónimos, que sendo palavras semelhantes e de certa forma intermutáveis entre si, apresentam particularidades que permitem que uma ou outra se adaptem melhor a cada situação.
No entanto, no mundo do fora de estrada, facilmente damos por nós linguisticamente limitados quando tentamos definir terrenos, sendo forçados a regularmente recorrer a chavões como “difícil” ou “fácil”.
Areia, é dos tipos de terreno que para uns é de dificuldade relativa, para outros, é intransponível, mesmo nos trajetos mais curtos. Designar um trajeto com areia como fácil ou difícil é portanto extremamente redutor e enganador. Imagem Adv Pulse
Essas definições são extremamente falíveis, pois não só não descrevem para quem é que um determinado tipo de terreno é difícil ou fácil, como também deixam de lado uma descrição das características do mesmo.
Assim, e de forma a tentar evitar a típica situação de se chegar a um passeio “fácil” e partir qualquer coisa porque “afinal não era assim tão fácil”, vemo-nos obrigados a criar a nossa própria linguagem.
Ainda que não disseminados, existem alguns sistemas de classificações de terrenos, não só de complexidades distintas, mas igualmente aplicáveis aos mais diferentes tipos de disciplinas, desde do ADV ao hard enduro.
Para mim, eu gosto de usar o que desenvolvemos na BN EnduroCamp, que ainda que tenha sido originalmente desenvolvido para motas acima de 650cc em regime de aventura, facilmente pode ser utilizado pela larga maioria de motas em andamentos lúdicos, tornando-se somente mais limitado para enduro ou hard enduro.
Ainda assim, havendo vontade comunitária, facilmente se podem criar classificações adicionais para estas disciplinas que têm características particulares.
O nosso sistema baseia-se então em três pontos principais; considerações gerais onde definimos algumas regras básicas, a classificação do piloto em três estados evolutivos, e a classificação do terreno em si em cinco classes de dificuldade.
Para todas as classes temos um descrição do tipo de dificuldades de cada uma, tal como um video exemplificativo para ajudar a que cada classe seja o tão clara quanto possível.
Por isso, se queres comunicar melhor com os teus amigos, queres recomendar uma linguagem mais precisa aos organizadores dos passeios que fazes, ou até mesmo aplicar este método de classificação de terrenos nos teus próprios passeios, lê com atenção o nosso sistema, e partilha-o tanto quanto possível.
Vamos todos ganhar ao conseguir falar a mesma língua e comunicar exatamente o que queremos dizer quando nos referimos a fora de estrada.
Assumindo que todos os que estão a ler este artigo têm carta de carro, é provável que a maioria de vocês se lembre da primeira coisa que vos foi ensinada na vossa primeira aula de condução, como ajustar o banco e os espelhos antes de arrancar.
O site http://cycle-ergo.com é um excelente recurso para descobrir se é necessário modificações ergonómicos em qualquer mota, ou somente ajustes, seja em motas de enduro, estrada, ou ADV. Imagem cycle-ergo.com e Adv Pulse
Nos dias de hoje, e em carros mais modernos, já é incluído o ajuste do volante e dos pedais, algo que permite ao condutor melhorar ainda mais o seu conforto e capacidade de controlo do veiculo.
Nas motas, por outro lado, é-nos quase impossível esse tipo de afinação sem recorrermos a alterações.
Vamos assumir o mesmo modelo de mota comprada no mesmo dia por uma pessoa com 1.70m, e uma com 2.00m.
Desde a dimensão do guiador que poderá ter de ser ajustado ao tamanho dos braços de cada um, até ao tipo de banco, posição das peseiras, altura do guiador em relação ás mesas, e até mesmo altura da mota ao solo, tudo são pontos que devem de ser tidos em conta para podermos, tal como no carro, obter uma posição confortável e segura de condução.
Assim, e se logo á cabeça a maioria das motas têm de sofrer alterações de forma a poderem ser operadas em segurança, mais alterações podem ainda ter de vir a sofrer para poderem ser seguras e eficazes nos diferentes tipos de terrenos existentes.
Afinal de contas, nenhuma mota foi desenhada para fazer tudo excecionalmente bem, nem para ser diretamente perfeita para todos os tamanhos de condutor.
Com isso em mente, após termos considerado as alterações ergonómicas necessárias, devemos considerar onde e de que forma vamos utilizar a nossa mota.
Se, por exemplo, não quisermos fazer nada mais complexo do que de terrenos de Classe 3 com uma mota de ADV, provável iremos somente necessitar de adequar os nossos pneus.
Por outro lado, se com essa mesma mota estivermos a apontar a terrenos de Classe 5, então além das alterações ergonómicas necessárias, poderemos ter de considerar não só proteções, tal como alterações a nível de suspensões, por exemplo.
Terrenos de Classe 5 podem ser transpostos por motas de maior porte no seu estado original, no entanto, é normal ver-se modificações naquelas que o fazem regularmente. Foto OneWheelDrive.net
Assim, e deixando completamente de lado quer a legalidade destas alterações quer as escolhas estéticas de cada um, em esquema de resumo, é preciso manter em mente que quase todas as motas requerem modificações para ser conduzidas em segurança, e que para fora de estrada, podem ainda ter de ser adaptadas aos tipos de terrenos onde vão andar.
Por tudo isso, conseguirmos definir claramente o tipo de terrenos por onde passamos vai-nos não só ajudar a ter conversas mais coerentes, mas vai também ajudar a adequadamente planear as alterações que a nossa mota poderá necessitar para a função que queremos que ela cumpra.
Essa atitude vai trazer muito mais frutos do que simplesmente copiar a mota do vizinho, que por mais bonita que esteja, pode estar preparada para algo que não serve minimamente o nosso propósito pessoal.
É-me quase impossível como instrutor de fora de estrada escrever este artigo sem falar em formação, e por formação, diga-se, aprendizagem comunitária.
O ser humano, como espécie, apresenta uma evolução cognitiva exponencial porque ao contrario de outras espécies, cada geração começa a desenvolver-se a partir do conhecimento de todas as outras que vieram antes.
Os motores que equipam as nossas motas hoje em dia, por exemplo, são o produto de um desenvolvimento feito ao longo de quase 200 anos, com cada geração de inovadores a basear-se nos conhecimentos teóricos e práticos adquiridos por quem veio antes de si.
Sem criações como o motor Otto e Lenoir pelos anos de 1860, os nossos motores de combustão de hoje em dia não seriam possíveis. Imagem stationroadsteam.com
Infelizmente, no nosso mundo das duas rodas fora de estrada, como pilotos lúdicos ou competitivos, tendemos a tentar aprender sozinhos, ou com recurso a outros que tendo escolhido o mesmo processo, se encontrem mais avançados no mesmo.
Se isso é problemático num desporto em que muitas técnicas são contraintuitivas, é igualmente a razão pela qual se vê pouca diferença e evolução no tipo de erros técnicos cometidos por pilotos de várias gerações diferentes.
Felizmente, e com a quantidade de excelente informação disponível hoje em dia, têm-se assistido a um crescente número de pilotos a quebrar essa tendência do passado, tal como se vê a disseminação de informações para lá das técnicas de condução, tal como as de classificações de terrenos.
Por isso, e de forma a podermos estar cada vez mais seguros, podermos continuar a acompanhar a evolução das nossas motas, e podermos tirar o máximo proveito de qual quer que seja o tipo de terreno onde gostamos de andar, formação e informação continuas tornam-se essenciais.
Essa informação é o que nos vai permitir ir buscar os conhecimentos práticos e teóricos dos que vieram antes de nós, e como comunidade, continuar evolutivamente a dar passos em frente em vez de passos para o lado.
É igualmente o que nos vai permitir individualmente recomendar formação a outros, e é o que nos vai permitir aprender mais sobre estes e outros tópicos que vão muito além de técnicas de condução puras.
Por isso não percas tempo a tentar reinventar a roda sozinho ou com os teus amigos, investe em formação, procura informação com bases práticas e teóricas fundamentadas, e começa mais rapidamente a tirar mais de ti, da tua mota, e do teu desporto.
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Assim que se sai das pistas de competição, rapidamente entendemos que o mundo do fora de estrada têm mais que se lhe diga do que uma pura necessidade de chegar em primeiro lugar.
A nossa segurança e a de todos os demais, tal como as regras de etiqueta e de bom senso que devemos usar como estandarte, formam as fundações que regem esta nossa atividade.
Hoje, vamos falar exatamente dessas fundações, e partilhar não só informação que muitos desconhecem ou nunca pensaram, tal como relembrar conceitos que todos devemos ter sempre presentes.
Não interessa o quão bem conduzimos, dominamos técnica, ou qualquer outro ponto chave de controlo da mota, se não estivermos focados no que existe para lá da nossa bolha “homem/máquina”, não estamos a maximizar a nossa segurança.
Isso quer então dizer que atenção a elementos como condições climatéricas, saúde geral do piloto, ou até mesmo o nosso equipamento de segurança são cruciais para o bom resultado diário de uma aventura motociclística.
Com isso em mente, torna-se redundante perdermos aqui tempo a dizer que devemos andar sempre de capacete, e adaptar o restante dos nossos equipamentos de segurança ao tipo de terreno que estamos a atacar.
Quantas coisas erradas consegues apontar nesta imagem? Foto via Goon Riding
Por exemplo, não utilizar botas de estrada para fazer enduro ou motocross, algo que na sua essência é relativamente intuitivo e fácil de empregar.
Assim, torna-se importante aproveitarmos este nosso tempo para falar em tópicos pouco discutidos, e entre eles, quero começar por dois que penso que tendem a não ter o tempo de antena merecido.
Estando nós num pais de temperaturas elevadas e da cultura “da mini”, sinto-me obrigado a falar de hidratação.
No entanto, por hidratação ser um artigo por si só, vai ser impossível cobri-lo aqui na sua totalidade, ainda assim, facilmente se consegue partilhar alguns pontos importantes de reter.
Pontos tal como o conhecimento de que bebidas com açúcar, álcool, ou cafeina são de evitar quando as temperaturas apertam e começamos a derreter em cima da mota.
Isto assim o é porque estas bebidas, entre outros efeitos, são diuréticas, o que em vez de nos ajudar a reter eletrólitos como sódio e potássio, vai-nos fazer perde-los ainda mais depressa.
Existem poucos prazeres como uma cerveja gelada num dia quente, mas é importante lembrar que além de muitas serem ilegais se ainda formos conduzir, também vão ajudar a nossa desidratação. Foto de autor desconhecido
Ainda assim, isso não significa que beber cinco litros de água em vez de um ou dois por dia nos vá ajudar a manter uma boa hidratação, já que aqui, quantidade não significa diretamente qualidade.
Isto assim o é porque a água em si não é propriamente rica nos minerais que necessitamos para estarmos bem hidratados.
Assim, a ingestão em excesso de água não só não vai ajudar, como a certo ponto vai prejudicar, com o corpo a chegar a um estado de hiper-hidratação, uma situação que no limite é fatal, e que por não ter os sintomas da desidratação, pode ser mais difícil de identificar e gerir.
Com isto em mente, manter uma boa alimentação com recurso a vegetais e frutas - esses sim naturalmente ricos nos minerais que necessitamos - tal como saber ajustar as nossas bebidas eletrolíticas ás diferentes necessidades, vai-nos manter longe de problemas.
Problemas esses que podem ir desde uma simples boca seca ou dores de cabeça, até cansaço, sonolência e tonturas - reações extremamente perigosas quando se conduz - ou no limite, a morte.
E não se desenganem, desidratação e hiper-hidratação não são somente problemas limitados a atletas a competir, são abrangentes a qualquer ser humano, dentro, ou fora da mota, tornando-se assim uma temática que todos devemos manter presente.
Cair faz tão parte de fazer fora de estrada como ter de meter gasolina ou trocar de pneus, e confrontados com essa realidade, tendemos a adotar uma de duas atitudes quando a nossa mota deixa de estar vertical.
Por um lado, temos aqueles que aproveitam a situação para tirar o máximo de fotos possível do acontecimento, por outro, temos aqueles que tão rapidamente quanto conseguem fazem o que for preciso para levantar a mota do chão antes que alguém repare.
Clássicos dificilmente deixaram de ser clássicos. Foto via ADV Pulse
Se em ambiente competitivo a velocidade com que podemos voltar á corrida é crucial, em ambiente lúdico, o ponto primordial é sempre a nossa segurança, e de forma a maximizar isso, devemos usar o nosso tempo como ferramenta.
Temos então de começar por entender que uma queda gera automaticamente uma forte reação hormonal no nosso corpo.
Assim, a usar adrenalina como combustível, facilmente conseguimos levantar uma mota de 200kg sem utilizar boas técnicas, com lesões graves em músculos e tendões, e até mesmo com ossos partidos.
Dessa forma, a opção de parar para tirar umas fotos parece ter vantagens, pois oferece o tempo necessário para o corpo relaxar e se estabilizar, algo que nos vai permitir conscientemente entender se temos alguma lesão mascarada pelo pico de adrenalina, ou não.
Ainda assim, isso não significa que aproveitar para atualizar o Facebook ou o Instagram seja a melhor escolha.
Quedas acontecem em qualquer parte do track, e isso quer dizer que podem - e muitas vezes acontecem - em curvas cegas, subidas sem visibilidade, ou qualquer outro local onde trafego numa ou noutra direção não nos consegue ver.
Com isso em mente, torna-se importante seguir uma pequena checklist para garantir a nossa segurança durante o processo de levantar a mota.
Primeiro, devemos desligar o veiculo e garantir que estamos inteiros, algo fácil de fazer passando as mãos pelo corpo, fazendo umas respirações fundas para baixar o ritmo cardíaco, e em quedas mais agressivas mas não incapacitantes, tirando o capacete, luvas e casaco.
O tempo despendido nesse processo vai ajudar a reequilibrar níveis hormonais, e desmascarar qualquer possível lesão que poderá potencialmente piorar com uma tentativa de levantar a mota.
Desequipar e pedir ajudar são ótimos recursos de auto-preservação e de aproveitar para abrir o caminho a historias para contar. Foto boringadv.com
Tendo garantido que estamos inteiros, preferencialmente na berma do track, é então altura de garantir a segurança do local, principalmente se estivermos numa zona sem visibilidade.
Como as motas não têm triângulos de sinalização como os carros, sozinhos, podemos deixar o capacete e o casaco em cada ponta da estrada para alertar possível trafego, ou se estivermos com companhia, uma mota atravessada com os piscas ligados é um claro aviso para qualquer um de que algo se passa e que devemos abrandar.
Agora que sabemos que estamos intactos e que fizemos o nossos melhor para não levar com ninguém em cima, resta-nos levantar a mota, algo que se estivermos com amigos, deve ser feito com o seu auxilio.
Motociclismo é um desporto individual feito em grupo, tal como é um desporto em esquema de maratona e não de sprint, por isso, pedir ajuda vai permitir substituir o alto desgaste individual da manobra por um desgaste mais reduzido a nível coletivo.
É inegável a possibilidade de nos aleijarmos quando andamos de mota, por isso, temos de tomar uma decisão; esperar que alguém nos ajude se isso acontecer, ou estarmos preparados para tomar uma atitude, seja para connosco, ou para com qualquer outra pessoa, dentro ou fora da mota.
Tendo essa ideia presente, aconselho sempre que todos nós como motociclistas façamos um curso de primeiros socorros, e se possível, especifico para motociclistas.
Essa formação deve-nos dar as ferramentas necessárias para não só reanimar alguém, como tratar de simples cortes, por exemplo.
Devemos estar sempre preparados para o pior para poder aproveitar o dia a dia em segurança e conforto em cima de uma mota. Foto de um treino de primeiros socorros para motociclista no dia de treino de campo. Foto via Strefa Enduro
Cursos mais completos englobam temas como detetar hemorragias internas, estabilizar ossos partidos, ou até mesmo tratar de amputações em campo.
Com isso em mente, independentemente do curso, o que é importante é não só ganhar os conhecimentos mínimos, mas igualmente aprender a construir e cuidar do nosso kit médico, um equipamento vital para qualquer aventureiro.
Digo construir o nosso próprio kit médico porque infelizmente encontra-se muita gente com kits pré comprados em que não só não sabem o que está lá dentro, como não o sabem utilizar, tornando a sua existência meio irrelevante.
Por sinal, uma situação muito similar ao que acontece relativamente a kits de mecânica de campo, por exemplo.
Saber usar o kit médico tal como o kit de mecânica são trunfos fantásticos na mão de qualquer aventureiro, seja para proveito próprio, ou para ajudar alguém. Foto ridermagazine.com
No entanto, kits médicos ou de primeiros socorros, têm um passo extra que os de mecânica não têm, que são datas de validade em muitos dos seus constituintes.
Desta forma, para poderes não só maximizar a tua segurança, como a de outros que possas encontrar nos tracks, garante que não só tens um kit de primeiros socorros contigo, como que o sabes utilizar, e manter, a vida de alguém pode depender disso.
Agora que sabemos como tentar ao máximo preservar a nossa integridade física, torna-se primordial garantir que não nos esquecemos que um trilho aberto ao público não é uma pista.
Isso significa que além de poder, e muitas vezes ser utilizado por outras pessoas, a pé ou em veículos de lazer ou profissionais, como tratores, também é casa de vida selvagem dos mais variados tamanhos e feitios.
Essa é a razão pela qual apesar da maioria dos trilhos não ter sinalizações, continua não só a ter regras de transito, como de bom senso.
Assim, gestos simples como abrandar o tanto quanto possível quando passamos por pessoas ou casas, respeitar os sinais de não passagem ou de “por favor feche o portão”, não passar por cima de plantações, tal como dirigir uma ou duas palavras ás pessoas que encontramos nos trilhos, fazem toda a diferença no tribunal da opinião pública, tal como no prazer da nossa atividade.
Cabe a cada um de nós garantir que sinais destes não se vão espalhar e massificar pelos trilhos deste nosso Portugal. Foto Hugo Pinto
De uma forma geral, para podermos continuar a garantir a continuidade do nosso desporto, basta-nos mostrar o respeito pelos outros que gostamos que nos mostrem a nós, por mais que isso, no limite, possa quebrar o nosso ritmo de andamento.
Estando garantida a nossa segurança e o respeito pelos trilhos e populações que ai vivem, falta somente garantir que respeitamos a natureza onde eles estão inseridos.
Existem poucas experiências tão gratificantes para amantes do fora de estrada de aventura como o sair com a mota e tenda ás costas para voltar somente um ou dois dias depois.
Ainda que não exista nada de errado com esse conceito, antes pelo contrário, existem alguns pontos a manter em mente.
Se em muitas partes do mundo esta liberdade é altamente promovida, em muitas, como Portugal, é altamente regulada, pelo que se torna vital garantir a legalidade da nossa escolha de local de acampamento, ou mesmo de piquenique.
Foguear para uma refeição pode ser ilegal em muitos locais e alturas do ano, e se podemos ser um excelente recurso para as autoridades como primeiro aviso de incêndio, devemos evitar ao máximo começar um por acidente.
Nos trilhos, podemos sempre ajudar, seja alguém, seja com limpezas de caminhos, ou até mesmo um olhar mais atento a sinais de alarme quando estamos a andar em época de incêndios. Foto Edventure 547
Para fechar, e na nota máxima de respeito á natureza onde gostamos de andar, fica a ideia de deixar sempre o local onde estamos melhor do que o encontramos.
Por isso, garante que tens um saco contigo, seja para te certificares que não vais deixar lixo por onde passas, mas também para se vires algum no chão, o apanhas para o depositar no local apropriado mais à frente.
Com respeito por nós próprios, pelo próximo, e seguindo simples gestos de bom senso, conseguimos não só garantir um futuro saudável para a nossa modalidade, mas igualmente que a mesma têm primeiro que tudo, um futuro.
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Já usei no passado a analogia de que o nosso corpo deve ser visto como uma árvore quando falamos sobre o posição dos pés, um artigo crucial de ler, ou re-ler, para todos os quiserem entender mais a fundo o tema de hoje.
Um comparativo do corpo humano com uma árvore. Imagem da BN Endurocamp
Ainda assim, e em esquema de resumo, é crucial relembrar a necessidade de um bom posicionamento da nossa raiz, ou por outras palavras, dos nossos pés.
Isto assim o é porque pelas leis da biomecânica se torna impossível manter todo o corpo perfeitamente funcional se uma das partes falhar.
Por exemplo, torna-se impossível rodar a cabeça para trás sem a certo ponto modificar a posição dos ombros, que vão rodar a anca, que por sua vez irá rodar os pés de forma a podermos manter a rotação da cabeça, que foi a parte do corpo que iniciou o movimento em primeiro lugar.
Assim, e mantendo em mente que apesar de poder haver movimento individual de certas partes do corpo, de uma forma geral, nós funcionamos sempre como um todo.
Por isso, se queremos tirar o máximo da nossa posição de ataque, temos primeiro de alinhar os nossos pés.
Desta forma, e seguindo a analogia da rotação da cabeça, se alinharmos os pés, o resto do corpo irá tendencialmente seguir o movimento iniciado pela nossa “raiz”.
Aprender técnicas de condução off-road é importante, entre outros factos, porque em muitos pontos elas são contraintuitivas.
Um exemplo claro desta afirmação é a posição de ataque em pé, onde é fácil de identificar quais os pilotos que conduzem de uma maneira mais intuitiva, independentemente de serem profissionais ou lúdicos.
Esses pilotos tendem então a assentar as botas nas peseiras pela área entre o calcanhar e o inicio dos dedos, e a não apontar tendencialmente á zona do antepé.
Uma clara diferença de desgaste nas botas pelas diferentes técnicas base utilizadas por dois pilotos diferentes. Imagem BN EnduroCamp
A posição mais avançada do pé na peseira é por definição a mais natural com as botas a apresentarem um tacão, oferecendo o local perfeito para nos encaixarmos na peseira de uma forma intuitiva.
No entanto, como já referido, boa técnica é contraintuitiva, tornando assim esta atitude incorreta, porque este posicionamento dos pés cria dois problemas complexos, e importantes de analisar.
Põem-te em pé e tenta saltar.
Isto não é um truque literário, é um pedido real para te ajudar a entender este problema de uma forma que nunca te vais esquecer.
Põem-te em pé, e tenta saltar.
Se o fizeste - ou se tens este movimento bastante claro na tua cabeça - vais ver que naturalmente aterras-te com a ponta dos pés primeiro, utilizando o tornozelo como amortecedor, seguido dos joelhos, principalmente em saltos maiores.
Evita os impactos na coluna, evitando esta posição dos pés nas peseiras. Imagem BN EnduroCamp
Esse instinto existe porque se aterrares com o pé plantado como um todo, não só vais tendencialmente perder o equilíbrio - principalmente em impactos maiores - como também vais sentir muito mais o impacto ao longo de todo o corpo.
Energia não se perde, dissipasse, por isso, ao ser retirada a possibilidade da usar o tornozelo como amortecedor, mais energia vinda de impactos terá obrigatoriamente de chegar á coluna.
Esta é uma das razões pela qual muitos pilotos, de profissionais a lúdicos, se queixam de dores nas costas a fazer fora-de-estrada.
Muitos pilotos, seja por instinto de auto-preservação, ou por terem sido avisados dos perigos para a coluna, tendem então a tentar absorver os impactos com os joelhos.
Infelizmente, essa solução continua a não ser a ideal.
Se por um lado, vamos continuar a transmitir muita energia para a coluna por estarmos a limitar a mola natural do corpo ao ter os pés plantados nas peseiras, por outro, criamos um problema novo.
Ao absorver impactos com os joelhos criamos um vector de força que carrega a suspensão frontal, iniciando um movimento de pêndulo de velocidade crescente. Imagem BN EnduroCamp
Esse problema prende-se com o facto de que ao dobrarmos os joelhos para absorver impactos somos obrigados a deixar o corpo cair para a frente, provocando um acréscimo de carga na suspensão frontal, e subsequente instabilidade na mota.
Se num salto isolado isso pode ser recuperado com um acréscimo de esforço fisico e insegurança, numa situação de ressaltos consecutivos como numa secção de whoops, seja em pista ou trilho, as coisas tendem a mudar de figura.
Ao afundarmos a frente demais por um mau posicionamento corporal, o rebound vai-nos querer mandar o corpo para trás, o que vai fazer com que no impacto seguinte sejamos forçados a afundar ainda mais a frente, e assim consecutivamente num efeito de pêndulo com velocidade crescente.
Para tentar evitar estar a ser atirado como uma boneca de trapos, a maioria dos pilotos tende então a agarrar o guiador pela vida.
Uma clara imagem dos pés demasiado na frente da peseira, com os joelhos a servirem de amortecedor do corpo por default. Imagem via offgridweb.com
Essa atitude, além de não resolver o problema e dificultar o controlo da roda da frente, aumenta também em muito a probabilidade de arm pump e de um whiskey throttle, problemas que devemos ao máximo tentar evitar.
Se já compreendemos que assentar totalmente o pé na peseira têm problemas, e que dobrar os joelhos para os contornar também, torna-se então importante compreender como maximizar o nosso efeito de mola.
Afinal, o que queremos é poder absorver as irregularidades do terreno com o mínimo de impacto no corpo, promovendo longevidade, segurança e conforto, enquanto deixamos a mota trabalhar de uma forma estável.
Assim, a solução que nos resta é puxar o pé para trás na peseira, criando um ponto de rotação e absorção de energia no corpo que resolve os nossos problemas quer de impacto, quer de desequilíbrio.
Ainda assim, a utilização deste recurso que tráz uma grande lista de benefícios, não é totalmente livre de erros por parte do utilizador.
Aguentar o calcanhar alto provoca desgaste fisico elevado e não maximiza a mola natural do corpo. Imagem BN EnduroCamp
Dessa forma, torna-se crucial deixar o calcanhar cair, pois tentar manter o pé paralelo ao chão sustentado somente pela biqueira irá não só resultar num enorme desgaste físico, como não trazer os benefícios procurados.
Por outro lado, é igualmente importante referir que até a boa utilização desta posição com o calcanhar caído em relação á peseira não vêm sem os seus senãos.
Neste caso, o senão é a hiperextensão de alguns ligamentos e músculos, criando em utilizadores menos flexíveis um grande desconforto que com tempo tende a transformar-se em dor, desde o calcanhar, até aos glúteos.
Felizmente, é possível minimizar este problema utilizando as restantes posições de condução possíveis fora de estrada como método de recuperar energias, tal como melhorando a nossa flexibilidade utilizando exercícios como os de Foundation Training.
Ainda assim, pilotos pouco flexíveis e sem tempo para este tipo de compromisso de trabalho físico, vão sem duvida encontrar um período de adaptação mais longo a esta técnica.
Agora que entendemos que o nosso calcanhar ao cair nos vai permitir maximizar a mola natural do nosso corpo, temos de entender os restantes benefícios desta posição.
Em primeiro lugar, pelas regras de biomecânica, ao deixarmos o nosso calcanhar cair, os nosso joelhos vão ser imediatamente puxados para trás da linha perpendicular feita entre a peseira e o chão, ficando direitos.
Este ponto é crucial, pois o posicionamento dos joelhos para a frente desta linha vai aumentar a probabilidade dos mesmos dobrarem, resultando nos problemas de pêndulo atrás descritos.
É nesta fase importante clarificar que joelhos direitos - ou minimamente fletidos - não significa joelhos bloqueados.
Se se levantarem vão reparar que apesar dos vossos joelhos estarem direitos, ainda vos é possível forcarem-nos mais para trás, levando-os até á posição de bloqueio.
Assim, e ainda que que incrivelmente próximas, encontramos duas posições dos joelhos distintas, sendo importante mais uma vez referir que o que procuramos aqui é joelhos relaxadamente direitos, e não bloqueados.
O calcanhar caído em relação á peseira ajuda a alinhar o joelho e a anca. Imagem BN EnduroCamp
Dessa forma, e como bónus de mantermos os nosso joelhos direitos e atrás da linha da peseira, vamos ficar numa posição que mais facilmente nos permite andar com a anca desbloqueada, um beneficio imenso para quem quer a fundo maximizar a sua segurança e controlo.
Para exponenciar ainda mais esta nossa posição base, devemos ter atenção ao posicionamento das nossas mãos e cotovelos, algo que já cobrimos noutro artigo.
Ainda assim, e não entrando no porque da necessidade de conduzir com os cotovelos altos - algo que ficará para um artigo dedicado – deixo-vos com esta dica visual de como o podem fazer da forma mais natural possível.
Fora de estrada não é estático, antes pelo contrário, é uma atividade extremamente dinâmica, razão pela qual é vital compreender de que forma nos podemos mexer agora que temos uma posição base definida.
Primeiro temos de separar os nossos movimentos corporais em dois pontos distintos; movimento ao longo da linha da mota, longitudinal, e movimento lateral em relação à linha da mota, ou lateral.
Todos estes diferentes tipos de movimentos são não só possíveis, como obrigam a variações particulares da nossa posição de ataque, por isso é importante manter em mente que não existe uma posição perfeita para tudo.
Assim, por uma questão de tempo, neste artigo iremos somente discutir movimentos longitudinais, algo que está mais diretamente ligado ao posicionamento dos pés e joelhos aqui a ser explicado.
Chegar o peso para trás e para a frente é o tipo de movimento longitudinal que todos devemos saber dominar. Prestem bem atenção ao posicionamento extremo do pé na peseira, e á posição do joelho em relação ao calcanhar. Imagem via motocrossactionmag.com
Provavelmente já todos ouviram falar da necessidade de puxar o corpo para trás ou para a frente para maximizar tração e distribuir peso.
Agora se isso requer um entendimento mais profundo do que está a acontecer com as nossas rodas para ser potenciado, requer igualmente saber exactamente como distribuir esse peso para não destabilizar a mota.
Dessa forma, e sabendo que o nosso calcanhar é o nosso primeiro ponto de rotação, temos de definir os outros dois.
O ponto seguinte é então o nosso joelho, que não sendo totalmente estático por se poder mover entre a linha da peseira e a do calcanhar, mas devendo manter-se tanto quanto possível a pressionar a mota, vê a sua liberdade limitada.
No entanto, esta atitude do joelho é o que nos permite suportar o peso do corpo em movimento sem a necessidade de nos segurarmos pelo guiador, tal como de permitir ter total liberdade de movimentos com a anca.
Isto leva-nos ao nosso terceiro ponto, a anca em si, que podendo mais livremente mexer-se longitudinalmente em relação à mota, se torna crucial no controlo da mesma, e de onde metemos o nosso peso.
Assim, os joelhos permitem á anca movimentar-se longitudinalmente, e a anca permite ao tronco subir e descer.
Peso para trás, rabo para trás. Peso para a frente, tronco para baixo. Imagem BN EnduroCamp
Isso quer dizer que sem alterar a posição dos joelhos, para por mais peso para trás temos de chegar o nosso rabo para trás, e para por peso para a frente devemos mover o nosso tronco para baixo.
O recurso a este tipo de movimento permite-nos não só mais facilmente trabalhar a iniciação necessária de movimentos técnicos, mas igualmente estabilizar a mota, permitindo-nos tirar o máximo da suspensão e geometria do veiculo.
Dessa forma, estando cientes de como nos mexermos e de como funcionam os círculos de Kamm, conseguimos com máxima segurança, pouco input físico, e máximo impacto técnico, aumentar e reduzir os nossos círculos de tração eficazmente.
O trabalho mais importante de qualquer piloto é manter a mota estável, e dar-lhe o que for necessário em termos de tração por ajustes finos do corpo. Imagem BN EnduroCamp
Existem preconceitos em relação a motas que por definição, todos temos, e que devem ser eliminados.
No que diz respeito a posicionamento corporal, isso têm a ver com a amplitude de movimentos necessária para atingir o objetivo pretendido.
Todos aceitamos que a suspensão tem alterações drásticas com somente uns clics para um lado ou para o outro, o que na prática, significa somente milímetros de ajuste.
Também aceitamos que raisers ou somente uns graus de rotação no guiador alteram por completo a forma como nos encaixamos com a mota, por exemplo.
No entanto, e ainda que aceitemos que pequenas alterações de milímetros têm um enorme impacto na mota, temos tendência a assumir que quando falamos no peso do piloto, esse deve ser movimentado o tanto quanto possível para surtir efeito.
Por definição, ou no mínimo por coerência, se uma mota é sensível a alterações de milímetros para umas coisas, também o é quando falamos na deslocação de posição das dezenas de kg’s do piloto.
A posição semi-fixa dos joelhos serve entre outras coisas, para permitir mais precisão na colocação desse peso.
Mesmo ao mais alto nível, os melhores pilotos do mundo trabalham arduamente para não destabilizar a mota, fazendo movimentos precisos, e não exagerados, mesmo quando têm de sair da posição de ataque base. Imagem via motocrossactionmag.com
Assim, a técnica definida atrás, aliada a uma condução fluida e livre de movimentos exagerados e bruscos, vai funcionar perfeitamente para a larga maioria das aplicações, desde passeios domingueiros, até campeonatos do mundo.
Isso não quer dizer que não existam exceções, é óbvio que existem, ainda que em número reduzido.
Dessa forma, o que quero que mantenham em mente é que se nos forçarmos a trabalhar dentro destes limites, quando precisarmos de os sobrepor, iremos não só conseguir entender exactamente porque é que isso foi necessário, tal como compreender melhor o quanto nos estamos a desviar da zona de conforto da mota.
Esse entendimento vai ser crucial não só como auto-preservação, mas igualmente como método de aprendizagem.
Nesta fase, é perfeitamente justo que se estejam a perguntar onde estão então os limites do movimento longitudinal, uma vez que eu não os defini, referindo apenas que os joelhos não devem mexer muito, mas que existem exceções.
Esses limites ficaram por definir por conceito, uma vez que a sua baliza é imposta por duas características principais altamente mutáveis, o tipo de mota que estamos a usar, e as características físicas do piloto que a está a operar.
Uma mota de aventura, com o seu banco normalmente largo e bipartido, vai tender a não nos deixar chegar tão para trás como uma mota de enduro, por exemplo.
Da mesma forma, e na mesma mota, um piloto mais alto irá poder chegar-se mais para trás do que um piloto mais baixo, e não somente por ter as pernas maiores.
Além das pernas, os nossos braços também ditam o limite do nosso movimento, uma vez que nunca devemos ficar com os cotovelos bloqueados ou direitos, de forma a nunca perdermos o controlo da roda da frente.
O piloto chegado bastante para trás, com os joelhos em linha com a peseira, o pé preso à peseira junto ao inicio dos dedos, e os braços dobrados para reter controlo da frente. Uma excelente execução da técnica por Cooper Webb. Imagem via gatedrop.com
Com tudo isto em mente, facilmente compreendemos que o mesmo tipo de variáveis estão presentes quando movemos o nosso peso para a frente.
Numa mota de adventure, ou mesmo de rally raid, por terem uma torre de instrumentos e um vidro, vamos encontrar o limite do possível mais cedo do que numa mota de enduro ou motocross.
Assim, com estes e outros exemplos possíveis, torna-se então vital compreender os conceitos aqui explicados, devem ser cuidadosamente aplicados há realidade de cada um, sendo que essa realidade é influenciada pelo nosso tamanho, mota, capacidade física, e objetivos de condução.
Tal como referi no inicio do artigo, não me seria possível fazer juz á complexidade deste tema em meia dúzia de palavras.
Mesmo usando links para artigos complementares, e não indo tão fundo quanto gostaria nos temas aqui abordados, ficaram ainda assim muitas variáveis por mencionar.
Posicionamento para troca de caixa ou utilização do travão de trás, ajustes para subidas e descidas, implicações de certos equipamentos de proteção com esta técnica, e a explicação da tão necessária movimentação lateral, para nomear alguns.
Por isso, e com a quantidade de informação ainda por desvendar, investe em ti próprio com recurso a programas de formação estruturados e literatura compreensiva, para teres mais meios para melhorar a tua segurança e investimento feito na mota.
Vais ver que não só vai valer cada cêntimo, como te vai permitir divertires-te muito mais cada vez que saíres para levantar pó.
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Por definição, treinos fora de estrada são aulas, não são dicas - pagas ou não - dadas sobre a bandeira de formação.
No entanto, fora de estrada têm um risco agregado que é impossível de negar, logo, por muito que seja uma aula, em nada se assemelha à nossa experiência escolar, ou mesmo da de quando tirámos a carta.
Equipamento de proteção, ruido de motores, pó, e exercícios fisicamente desafiantes fazem de qualquer treino fora de estrada uma experiência educativa única. Imagem rideapart.com
Sabendo isso de antemão, muitas dúvidas aparecem na mente dos interessados em fazer este tipo de treino, e todas elas extremamente válidas:
“Vou ser posto em situações de risco que tenho obrigatoriamente de executar?”
“Será que me vou aleijar, ou danificar a mota?”
“Devo fazer uma aula individual ou de grupo? É que não quero estar a atrasar ninguém...”
Conforme discutimos quando falamos sobre como escolher uma escola de fora de estrada, estas e outras perguntas devem ser feitas diretamente ao instrutor, afinal, a sua resposta vai ser o primeiro indicador de se estás a falar com a pessoa certa ou não.
Ainda assim, não há nada como ter uma noção do que esperar, e munido dessa informação, mais facilmente encontrares a confiança necessária para marcares o teu primeiro treino.
Todos os treinos de todas as disciplinas de fora de estrada devem ser compostos por duas partes distintas, uma teórica, e uma prática.
A parte teórica torna-se vital pois uma simples explicação de que se deve por o corpo nesta ou naquela posição, não justifica o porque dessa necessidade.
Assim, com recurso a física, biomecânica, e por vezes até matemática básica, é fácil para os instrutores mais versado explicar o porque dos ensinamentos que te estão a passar.
Recurso a salas de aula, quadros, blocos, ou mesmo no chão, qualquer opção é válida para explicar a teoria de técnicas de estrada, ou fora de estrada. Imagem ACM
Entendendo o porque das coisas, vais tendencialmente ter mais facilmente em saber que técnica usar em cada situação, tal como fazer a escolha consciente do que perdes se decidires não a utilizar.
No entanto, antes de puderes saltar para a mota e testar tudo o que aprendeste, é tradicional o instrutor demonstrar não só as linhas do exercício, mas igualmente o método de aplicação.
Nesta fase, é então normal encontrar três tipos de instrutor; o que demonstra tudo de forma eximia, o que é pouco gracioso, e o “exibicionista”.
Se os dois primeiros se encaixam perfeitamente em moldes formativos, o último pode facilmente remeter para uma atividade totalmente diferente.
Digo atividade diferente porque não é incomum encontrar relatos, vídeos, ou mesmo presenciar um treino em que uma considerável parte do tempo foi passada a ver o instrutor a andar.
Seja por necessidade de serem idolatrados, ou por terem um currículo tão invejável que força qualquer aluno a querer ver ao vivo do que o instrutor é capaz, excessos podem então ser cometidos na altura da demonstração.
Em treinos com instrutores e pilotos de topo, por vezes é difícil não nos perdermos simplesmente a ver o que estes génios conseguem fazer. Imagem bikeonline.com.au
Esses excessos, sejam eles por demasiadas repetições do exercício, ou por evolução da manobra a demonstrar para outras manobras diferentes, significam tempo de formação perdido.
Não me entendam mal, existem definitivamente alturas e formações especificas em que esses excessos são um excelente método de camaradagem e de relaxe, afinal um treino deve ser leve e animado.
No entanto, e por formação ser um investimento, tentares compreender de antemão como o teu instrutor organiza as demonstrações, vai-te ajudar em muito a decidires se queres pagar por algo com mais espetáculo, ou com mais tempo de treino.
Informação é poder, e com isso em mente, todo e qualquer dia de treino deve começar com um briefing informativo.
Afinal de contas, o desconhecido é para muitos assustador, e esse não é de todo o sentimento com que se deve abordar formação.
Assim, o dia deve começar não só com a apresentação do instrutor, desde a sua experiência e certificações, até ao seu conhecimento de primeiros socorros.
Formação continua em primeiros socorros em ambiente de formação para os seus formadores é o ponto chave do plano de emergência de qualquer escola. Foto Strefa Enduro
Qualquer informação pessoal adicional é pouco relevante para o treino em si, mas tende a oferecer uma conexão pessoal, e isso nunca deve ser desvalorizado.
Estando apresentada a equipa de formação, torna-se agora importante apresentar o local.
Desde os limites do campo de treinos, até onde podemos ou não passar, tal como a localização de todas as infraestruturas como lavabos ou zonas de descanso, nada deve ser esquecido.
Existem escolas com centenas de hectares, e outras que trabalham em campo aberto, por isso, sabermos exatamente com o que contar e onde nos podemos movimentar, dá uma sensação de familiaridade que é crucial para nos mantermos focados e descontraídos.
Para finalizar, é sempre importante não só delinear como o dia irá decorrer em termos de matéria e organização temporal, mas também claramente informar quais os protocolos de emergência.
Por norma, escolas tendem a ter salas de primeiros socorros dedicadas ou malas de emergência médica nas motas, mas independentemente dessa escolha, raras são que não têm pelo menos um elemento da equipa certificado em primeiros socorros.
Poder testar conhecimentos e técnicas com simulacros em campo, é como os melhores instrutores mantêm a sua capacidade de resposta a emergências. Imagem Strefa Enduro
Isto assim o é porque fora de estrada têm os seus perigos, e isso implica riscos não só para o grupo de formandos como um todo, mas também para o instrutor.
Assim, mesmo como alunos, podemos ter de ser chamados a agir, nem que essa ação seja somente dar a localização exata de onde estás ao 112, tarefa por vezes complicada no mundo do fora de estrada.
Dessa forma, mesmo que tudo o que falamos seja esquecido, garante que no mínimo te é dito como descrever o local do treino, onde tens rede se for caso disso, e onde estão os kits de primeiros socorros da escola, a vida de alguém pode depender disso.
Se numa década nunca tive de tratar de mais do que um arranhão, o mesmo não se pode dizer da quantidade de motas que já tive de levantar do chão.
Cair faz parte do desporto, e quanto mais depressa assumirmos que a nossa mota nada mais é do que a ferramenta que nos permite fazer fora de estrada, mais depressa aprendemos a lidar com o medo de uma queda.
Mas não se enganem, ainda assim, eu conheço e partilho a dor de ver a nossa menina de rodas para o ar, ou com qualquer coisa partida, mesmo que compreenda a sua inevitabilidade.
Quedas fora de estrada são uma parte normal do desporto, e aceita-lo, permite-nos tirar mais da experiência. Imagem crf250l.org
Devido a essa inevitabilidade, quando começamos a ver esses danos como cicatrizes de guerra com historias para contar, rapidamente temos outra perspectiva e começamos a dar mais de nós ao treino que estamos a fazer.
Com isso em mente, quase todos os treinos a quase todos os níveis começam a ensinar, ou relembrar os básicos.
Entrar e sair da mota, movimenta-la à mão, e se for caso disso, ajusta-la á ergonomia de cada aluno é um recurso que ajuda em muito a eliminar a ideia de que a mota não quer fazer outra coisa senão cair.
Afinal de contas, a larga maioria das quedas acontece a baixa velocidade, pelo que exercícios estáticos e dinâmicos sem motor são um excelente aquecimento, e método de encontrar o foco e confiança necessários para o treino.
Ainda assim, e dependendo do tipo de treino, um aquecimento com corrida, alongamentos, ou mesmo ativação da coordenação motora pode ser essencial.
Dai, a maioria dos cursos estruturados tendem a seguir para exercícios dinâmicos a baixa velocidade, sejam eles de curvas, subidas e descidas, ou até mesmo com um simples passeio á volta da escola, se a mesma o permitir.
Baixa velocidade é no entanto a palavra de ordem, já que velocidade não se ensina, ganha-se por repetição lenta de exercícios específicos, mesmo quando se utiliza treinos cronometrados ou outros métodos para puxar limites.
Independentemente do nível ou disciplina do fora de estrada que for, treinos de exercícios repetitivos são sempre uma excelente forma de desenvolver os recursos que vão permitir impor velocidade mais à frente. Imagem MXFactory
Assim, e à exceção de manobras só possíveis com velocidades mais elevadas, a tendência geral vai ser sempre de trabalhar lenta e sistematicamente cada técnica e progressão.
No final do dia, podes igualmente contar com um de-briefing em que te deve ser dado não só um resumo dos teus pontos fortes, mas igualmente dos pontos fracos, tal como técnicas para os tentares atacar por tua conta.
Cada um de nós é único, com medos e receios particulares, e neste desporto individual normalmente feito em grupo, isso têm de ser tido em conta.
É irrelevante se um exercício é simples para mim como instrutor, ou para qualquer outra pessoa no teu grupo de treino, se és tu que tens de enfrentar sozinho a dificuldade que tens pela frente, então tens todo o direito do mundo de ter medo dela.
Assim, o trabalho do instrutor deve ser sempre aceitar esse receio, e tentar ajudar-te a vence-lo, mesmo que isso signifique puxar-te para o lado para te dar uma atenção espacial, permitindo ao resto do grupo prosseguir o treino.
Dessa forma, podes e deves esperar que todo e qualquer exercício que te seja proposto seja exatamente isso, uma proposta, e não uma obrigação.
Um treino fora de estrada não é uma aula normal, os seus objetivos são definidos por ti, estando lá o instrutor somente para te ajudar a atingi-los, e não para te forçar a aprender o que ele quer ensinar.
A atenção, empatia, e dedicação do instrutor é sempre fulcral para ajudar formandos de qualquer idade a atingir os seus objetivos. Imagem learntoridemoto.com
Com isso em mente, cabe-te a ti definir o que queres aprender, e aceitar a responsabilidade das tuas decisões, mantendo em mente que nunca ninguém poderá conduzir por ti.
Essa é a principal razão pela qual todo e qualquer treino deve ser claro, calmo, evolutivo, preparado, e liderado por alguém com uma grande capacidade pedagógica e comunicativa.
Se tu confiares na escola, no teu instrutor, e no que estás ali para aprender, te tiverem sido eliminados os barulhos de fundo que distraem e tendem a resultar em medos por vezes difíceis de gerir, a grande probabilidade é de que irás ter uma excelente experiencia educativa.
No fim do dia, um treino fora de estrada deve ser nada mais do que uma experiencia relaxada, didática, respeitadora, e que te vai oferecer a possibilidade de num ambiente controlado e dedicado, atingires os teus objetivos.
Por isso, agora que sabes o que esperar, só te resta escolheres a tua escola, e dares o passo em frente neste tipo de formação que vai para sempre modificar a tua forma de andar de mota.
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A imagem de pilotos de punho trancado e em posições de ataque agressivas são estandarte de um limite e controlo de condução que muitos almejam.
Por ser uma imagem tão marcante o seu uso é abrangente, passando facilmente a ideia de que se queremos andar fora-de-estrada devemos faze-lo em pé.
Exemplo de uma das muitas imagens publicitárias a mostrar pilotos em pé fora-de-estrada.
Imagem wallpapercave.com
Ao longo dos anos, esta imagem ficou ainda mais vincada com alguns programas de treino, principalmente de adventure, a focarem repetidamente este conceito, ou a não o aprofundam, perpetuando a predisposição desta ideia nos recém chegados ao nosso desporto.
Eu não quero no entanto dizer que não se deve andar em pé, antes pelo contrário, andar em pé é uma das mais importantes ferramentas à nossa disposição no fora de estrada.
No entanto, sou obrigado a referir que isso não faz dela a única posição possível, nem tão pouco obrigatoriamente a melhor para todas as situações.
Prova disso é que em motocross e supercross anda-se sentado numa considerável parte do tempo.
Mesmos nas disciplinas mais exigentes do fora-de-estrada, andar sentado não é sinónimo de ser lento.
Imagem ultimatemotorcycling.com
Essa realidade mantém-se em disciplinas como o enduro e rally raid, provando que andar sentado é um recurso até nos mais altos níveis competitivos.
Assim, se nem os mais rápidos do mundo só fazem fora-de-estrada em pé, porque é que muitos insistem em tirar imediatamente o rabo do banco assim que o alcatrão acaba?
Aceitando que podemos e devemos utilizar várias posições de condução em cima da mota, temos não só de definir quais são, mas também quando usar cada uma.
Infelizmente para aqueles que gostam de dados claros, quando mudar de posição é extremamente difícil de definir.
Andar de mota é um desporto individual feito em grupo, o que significa que independentemente de quantos amigos temos à nossa volta, nós somos os primeiros e últimos responsáveis por tudo o que acontece com a nossa mota.
Isso é a principal razão pela qual boas escolas e bons instrutores de fora de estrada nunca obrigam ninguém a fazer exercício nenhum, e trabalham num limite muito especial entre motivar e forçar alguém.
Assim, e munidos do peso da nossa responsabilidade, torna-se fácil aceitar que entre nós e os nossos amigos existem diferentes níveis de conhecimento técnico, de experiência, de conforto, de segurança, e mesmo de gestão de risco.
Até na mesma mota e no mesmo terreno diferentes pilotos escolhem diferentes posições.
Imagem rideadv.com
Essa singularidade que faz de nós únicos é a razão pela qual se torna quase impossível definir as situações especifica em que devemos mudar de posição.
Com isso em mente, rapidamente se compreende porque somos obrigados a esquecer o que os outros fazem e a olhar para nós próprios, algo que nos vai ajudar a criar um método alternativo de decisão.
O que eu ensino nos treinos da BN EnduroCamp centra-se então num conceito simples: mantém-te sempre na posição de menor desgaste físico, até seres obrigado a aumentar o teu envelope de segurança.
Por outras palavras, se estiveres em pé num terreno em que com extrema facilidade podias ir sentado, estás então a gastar demasiada energia para o envelope de segurança que necessitas.
Apesar de não haver realmente nada de errado em andar sempre com o máximo de segurança possível, isso é altamente desgastante.
Considerando que todos nós temos um limite físico muito claro, se preferirmos andar sempre em segurança máxima, vamos conseguir fazer menos kms ou horas em cima da mota do que conseguiríamos se alternássemos posições.
Eu sei que esta explicação parece trivial, no entanto, a tentativa quase obrigatória de andar sempre em pé fora de estrada, é a razão pela qual muitos pilotos lúdicos ou iniciantes ficam tão cansados, tão depressa.
Além disso significar que para a maioria desses pilotos o dia se torna mais curto, para os que insistem, a certo ponto vão ser obrigados a conduzir acima dos seus limites físicos.
É impossível manter posições de ataque agressivas em pé durante muitas horas, ou múltiplos dias seguidos sem rapidamente atingir limites físicos, até para atletas profissionais em excelente forma física.
Imagem wallpapercave.com
Ironicamente, chegada a essa altura, a má escolha de posição para o tipo de terreno em que estavam, desgastou-os tanto que deste ponto para a frente vão ficar efetivamente inseguros.
Isto assim é porque um corpo e uma mente desgastadas não produzem os mesmos resultados que um corpo e uma mente frescas, por isso, os perigos de conduzir acima dos nossos limites físicos são claros.
Um facto tão real que suportado por anos de dados, é o ponto fulcral de inúmeras campanhas de segurança rodoviária.
Assim sendo, saber então gerir a nossa energia é o que nos vai permitir controlar eficazmente o nosso envelope de segurança pessoal, e decidir qual a melhor posição corporal para o obter.
Agora que compreendemos a necessidade de gerir energia, temos de criar uma definição geral do que cada posição permite versus o seu respetivo gasto energético relativo.
No curriculum que ensino, utilizo então 4 posições, divididas da menos defensiva para a mais defensiva, entre; sentado, sentado em posição de ataque, em pé, e em pé em posição de ataque.
Em termos relativos, podemos comparar o que cada posição oferece em termos de segurança relativamente ao gasto energético a que obriga.
Imagem BN EnduroCamp
A posição sentada é simples, é a que todos entendemos de uma forma muito intuitiva, e a que nos permite relaxar mais.
Relaxar no entanto não significa esquecer a posição base dos pés, significa apenas permitirmo-nos andar com a anca bloqueada, e se for caso disso, até com cotovelos e ombros caídos.
Esta posição é perfeitamente aceitável em longas tiradas de terra em que o terreno é regular, previsível, e em que temos visibilidade suficiente para manter velocidades mais elevadas sem grandes surpresas.
Se quiserem uma ajuda visual, eu definiria o tipo de terreno onde esta posição é perfeitamente aceitável como Classe 1 e Classe 2, com alguns pilotos e motas a conseguirem faze-lo em Classe 3.
Dito isto, por estarmos relaxados mas a usar uma boa posição dos pés, se o terreno mudar, ou se a nossa confiança ficar abalada por alguma razão, é fácil rapidamente conseguirmos desbloquear a anca e posicionar o tronco, ficando agora numa posição de ataque sentada.
Um bom posicionamento de pés torna a transição entre posições sentadas extremamente rápida, enquanto mantém um ótimo controlo básico em ambos os casos.
Imagem BN EnduroCamp
Esta posição, por criar separação, aumenta em muito a nossa capacidade de controlo da mota, o que aumenta em muito a nossa segurança.
Esse aumento de segurança é no entanto obtido com um aumento de gasto energético, pelo que terminando a zona complicada ou reganhando a confiança perdida, é sempre aconselhável voltar à posição inicial, se isso for possível.
Para compreendermos a posição corporal seguinte temos de manter em mente que o nosso objetivo aqui é segurança, e não velocidade.
Dito isto, não devem sobrar duvidas que sentado em posição de ataque, o controlo e agressividade é superior a quando estamos simplesmente em pé, pelo que neste caso, seremos mais rápidos sentados.
Ainda assim, em pé e relaxado, o nosso campo de visão melhora, tal como a capacidade de deixar a mota trabalhar debaixo de nós, e a velocidade de transição para uma posição de ataque em pé.
Todos estes benefícios de segurança são assim atingidos enquanto mantemos um gasto energético menor do que o utilizado numa posição de ataque sentado.
Dessa forma, perdemos efetivamente velocidade, mas ganhamos segurança, o que me leva a recomendar que a nível competitivo onde velocidade é crucial, se alterne somente entre as duas posições de ataque.
No entanto, a nível lúdico ou até mesmo em rally raids, onde a capacidade de resistência é chave, utilizar todas as posições possíveis é imprescindível, principalmente quando a nossa forma física não for a ideal.
Apesar de ser mais desgastante estar em pé do que sentado e relaxado, é possível fazer muitos kms nesta posição, ou utiliza-la como ferramenta para melhorar o campo de visão ou simplesmente relaxar as pernas.
Imagem wallpapercave.com
Com isto em mente, ainda que sejamos mais lentos por nos termos posto em pé, encontramo-nos agora numa posição onde temos um envelope de segurança semelhante ao anterior, mas com menos desgaste físico.
Assim, seja somente para descansar as pernas, ou para comer km’s com um campo de visão mais abrangente, conseguimos aplicar esta posição nos mais variados tipos de terreno.
No expoente máximo do nosso arsenal de posições corporais encontra-se por fim a tão almejável posição de ataque em pé.
Pés perfeitamente posicionados, joelhos a fechar, anca desbloqueada, cotovelos altos, e de olhos no horizonte estamos agora no limite do que a nossa técnica de condução nos vai permitir.
Aqui é onde podemos ser o mais rápidos com a maior segurança relativa possível.
Um excelente exemplo entre uma posição pé mais relaxada e uma mais em posição de ataque quando a utilizar a mesma mota no mesmo tipo de terreno.
Imagem newmotor.com.cn
Esta posição é no entanto altamente desgastante, pelo que será basicamente impossível de manter durante todo um dia de treino, passeio, ou prova.
Assim, é importante decidir quando a utilizar, e por norma, ficar bem nas fotos e vídeos não é primordial para a nossa segurança e resistência.
Ainda que eu tenha dito que em formação falo somente de quatro posições, isso não é totalmente verdade, porque em formações mais avançadas falo da existência da elusiva quinta posição de condução.
Digo elusiva porque para muitos ela não é clara, e como tal, não é treinada ou conscientemente utilizada.
Essa posição é portanto o falso sentado, uma posição que tende a ser momentânea, e que nada mais é do que na posição sentada, levantarmos o rabo do banco sem nos pormos em pé, aguentando o corpo nessa posição.
Pela força e estabilidade necessária nas pernas e tronco, esta posição resulta melhor quando estamos sentados numa posição de ataque.
Ao utiliza-la quando estamos simplesmente sentados, tendemos a exercer demasiada força no guiador para suportar o peso do corpo, o que tende a resultar em instabilidade da mota.
Ainda assim, é um recurso que pode perfeitamente ser utilizado em qualquer uma das duas posições sentadas, porque nos permite impedir que a mota nos projete o corpo em pequenos saltos ou buracos, pela criação de uma almofada de ar entre o nosso rabo e o banco.
A 5ª posição é momentânea, e extremamente desgastante, mas ainda assim, incrivelmente eficaz.
Imagem BN EnduroCamp
Pilotos mais experientes podem também utilizar uma ligeira variação desta técnica para fazer pre-loads na suspensão, seja isso para iniciar um cavalinho, preparar um salto, ou simplesmente utilizar o rebound da mota para passar uma dificuldade.
Ainda que seja uma posição de alto desgaste físico, por ser utilizada momentaneamente e trazer tantos benefícios, esta posição é uma excelente escolha para se conseguir manter um ritmo elevado sem o desgaste de se ir numa posição de ataque em pé.
Com tudo isto em mente é então importante manter a noção de que fora de estrada não é unidimensional, treinar até se ser proficiente em todas as posições de condução, e obviamente, ajudar o próximo ao partilhar esta informação com aquele amigo que religiosamente se levanta assim que toca na terra.
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Se para uns, o puro conceito é ridículo, para outros, a decisão de como, quando, e onde o fazer é uma incógnita, e isso levanta vários problemas.
Neste artigo vou tentar responder a todas essas perguntas, e trazer alguma claridade a este tópico que não deve deixar duvidas a ninguém, desde os mais interessados, até aos mais céticos.
Leis que não acompanham os tempos, “sabedoria” popular, e ano após ano de marketing danoso criaram um grande estigma no que diz respeito a formação.
Essa receita que leva muitos a acreditar que saber andar de mota, conseguir sobreviver a uma, ou saber domina-la são uma e a mesma coisa, faz com que o conceito de formação seja socialmente complexo, e de uma forma geral, pouco positivo.
Se uns, por dificuldade em distinguir experiência e conhecimento acreditam que a “melhor escola” é gastar gasolina e pneu, outros, ainda que compreendam os benéficos de uma aprendizagem estruturada, têm dificuldade em dedicar-lhe o tempo e dinheiro necessário.
Assim, primeiro que tudo, torna-se importante desmistificar estes conceitos.
Quero muito dedicar todo um artigo à diferença entre experiência e conhecimento base, porque apesar de serem ambos extremamente importantes, são no entanto, extremamente diferentes.
Areia é um ótimo exemplo onde muitos pilotos confundem experiência com conhecimento técnico base. Imagem via outdoorx4.com
Ainda assim, e em esquema de resumo, podemos utilizar simples facas de cozinha como uma ótima analogia.
A larga maioria de nós, com anos de experiência a cozinhar, baseados nos ensinamentos dos nossos pais, avós, e truques desenvolvidos por nós próprios, faz tudo o que precisa - e em muitos casos com excelente qualidade - com recurso a apenas duas ou três facas.
Por outro lado, um jovem chefe de cozinha a iniciar a sua carreira, tendo aprendido a sua arte pela mão de quem sabe ensinar, utiliza uma enorme panóplia de facas diferentes.
Esse alargado conjunto de facas aliadas a um profundo conhecimento técnico de como as utilizar permite-lhe não só ser mais seguro e consistente, mas também, e desde o inicio, atingir níveis de precisão impossíveis para a maioria de nós.
Com isso em mente, experiência desenvolvida sobre uma base de conhecimento consistente torna-se então a arma de eleição dos mais bem sucedidos, seja na vida, como nas motas.
Dedicar tempo a desenvolver experiência de condução sem ter aprendido os fundamentos base do que isso significa, resulta, mas não é de todo o método ideal.
Resulta, porque não haja dúvidas que é possível ser-se incrivelmente rápido sem se ser tecnicamente correto, pois através de dedicação e experiência de anos de condução, conseguem-se criar atalhos para o resultado pretendido.
Mesmo quando estamos a ver os melhores do mundo é possível encontrar vários erros técnicos. É possível ser muito rápido sem se ser tecnicamente perfeito. Imagem via dirtrider.com
Não é o método ideal, porque ao terem sido utilizados atalhos, e á semelhança dos resultados da nossa experiência culinária, esse sucesso não vêm sem os seus senãos.
Esses tendem a assumir a forma de falta de consistência, falta de compreensão do porque de certas falhas repetitivas, e de uma forma geral, falta de segurança, por não se compreender a fundo onde estão certos limites físicos, e técnicos.
Essa falta de compreensão de limites técnicos torna-se ainda mais evidente nos dias de hoje, em que as motas vêm sistematicamente mais equipadas com uma panóplia de ajudas eletrónicas que por vezes confundem até os mais entendidos e experientes.
Dessa forma, como pilotos lúdicos, amadores, ou profissionais, temos de tomar uma decisão importante; devemos pagar o que quer que seja que o mercado pede por uma mota que não sabemos dominar, e tecnicamente não entendemos, ou não.
Para os que querem estar em controlo da sua segurança e consistência, torna-se então simples e direto aceitar que um investimento de uns dias e umas centenas de euros em formação é um baixo custo a pagar para não só compreender, mas também tirar o máximo de partido dos milhares de euros já investidos na mota e equipamento pessoal.
Para nós, amantes de motas, é difícil não ficarmos vidrados quando vemos alguém a fazer algo que nos parece impossível, seja em termos de velocidade, facilidade em atravessar certas dificuldades, ou um misto dos dois.
Pol Tarrés a mostrar o que um piloto profissional pode fazer com uma mota adv. Imagem enduro21.com
Isto é tão real que têm sido a estratégia de marketing de quase todas as marcas ao utilizarem pilotos profissionais fora de série, como o Pol Tarrés ou o Toni Bou para publicitar as suas motas de aventura, por exemplo.
Com isso em mente, quando decidimos que queremos formação, a escolha de o fazer com a ajuda de pilotos profissionais, ou até mesmo daquele amigo que é “rápido nas horas”, torna-se relativamente direta.
Infelizmente, essa leitura direta é, ou no mínimo pode ser, enganadora.
Como já falamos, ser rápido, o que facilmente se traduz em vitorias, títulos, e imagens que marcam a memória, não significa que esses pilotos entre outras coisas dominem ou tenham inclinação para pedagogia e formação.
Assim sendo, um excelente piloto, tecnicamente correto ou não, não têm obrigatoriamente de ser um excelente instrutor, já que saber fazer e saber ensinar são duas competências completamente diferentes.
Apesar da sabedoria popular dizer que quem não sabe fazer ensina, isso não podia estar mais longe da verdade, pelo menos no que diz respeito a ensino.
Um piloto profissional têm de ter capacidade de superar dificuldades físicas e mentais, lidar com limites, e ser o mais rápido em pista.
Um instrutor profissional tem de saber gerir pessoas, ser um mestre em pedagogia, e ser extremamente adaptativo para com cada aluno e matéria.
Todos os alunos merecem atenção especial e dedicação individual ás suas dificuldades e objetivos, mesmo em aulas de grupo. Imagem pinebarrensadventures.com
Nenhuma dessas competências é sinónimo entre si, razão pela qual é impossível garantir se alguém como o Cristiano Ronaldo, indiscutivelmente o melhor executador do mundo no que faz, será ser um bom treinador.
De igual maneira, é impossível garantir que alguém que nunca praticou um desporto a nível profissional não será bom a ensina-lo só por isso.
Bill Belichick, conta com 6 vitorias e 4 segundos lugares no Super Bowl como treinador principal, 2 vitorias como treinador assistente, e foi 3 vezes treinador do ano da NFL sem nunca ter jogado um minuto de futebol americano profissional, por exemplo.
Torna-se então crucial evitar confundir quem sabe fazer, com que sabe ensinar, ainda que alguns sejam exímios em ambos.
Agora que sabemos que não devemos confundir pilotos e instrutores profissionais, temos então de compreender como escolher o melhor instrutor para nós, algo que sem algumas noções se pode tornar complicado.
Afinal de contas, a dificuldade de como o fazer é o que leva muitos a escolher pilotos de renome como formadores.
No entanto, e como descrito, um instrutor têm características próprias, o que nos dá as pistas que devemos procurar quando estamos a escolher quem nos vai dar as bases necessárias para uma vida mais segura, e potencialmente mais rápida em cima de uma mota.
Se uma simples pesquisa pelo historial e reviews do potencial instrutor pode ajudar em muito a entender o tipo de trabalho que ele faz, entrar em contacto com ele é provavelmente a forma mais fácil para avaliar se ele é uma boa escolha para ti.
É extremamente importante estar confortável com o formador que se escolhe, e uma pequena conversa seja por telefone ou email pode ajudar muito a entender se essa ligação existe. Foto de treino BN EnduroCamp
Um bom instrutor é alguém que por ter um extenso conhecimento técnico e pedagógico, é capaz de levar qualquer piloto lúdico, amador ou profissional a superar dificuldades e a aprender novas técnicas.
Mas não se enganem, extenso conhecimento técnico não significa saber tudo, pelo que um instrutor que no imediato afirma não saber dar uma determinada resposta pode ser uma enorme mais valia.
Isto porque quem têm esse tipo de atitude, tende a querer garantir que está em controlo da informação que partilha, e quer a todo o custo evitar perpetuar mitos ou passar falsas noções.
Assim sendo, a sua capacidade adaptativa, evolutiva, de comunicação, e de ver cada pessoa como um individuo particular com necessidades de comunicação e objetivos únicos têm de ser impar.
Essa é a principal razão pela qual uma rápida conversa facilmente demonstra, entre outros factores, se o possível instrutor nos está a ver como um negócio, ou como um ser humano com dificuldades particulares com as quais ele nos quer ajudar.
Uma simples e óptima forma de fazer essa avaliação é então analisar as respostas do instrutor ás perguntas que lhe fizermos.
Se todas as respostas foram vagas, tiverem um claro “isso é básico”, e não estiverem forradas a opções para as tuas dificuldades e objetivos particulares, então provavelmente ficarás melhor a evitar esse “instrutor”.
Ainda assim, existe informação crucial que somente pilotos profissionais, viajantes, e demais pessoas com experiências únicas têm para partilhar.
Por isso, se o que procuras são conselhos específicos sobre situações particulares, mantém em mente que por vezes quem detêm essa informação pode não ser um excelente instrutor, mas que pelo que têm para partilhar, não necessita de o ser.
Como instrutor já tive o prazer de trabalhar numa escola com mais de uma centena de hectares de terreno privado, trabalhar em campo aberto, trabalhando hoje numa escola com somente dois hectares de terreno fechado.
Todas essas e outras possibilidades são válidas e têm os seus próprios prós e contras, razão pela qual escolher uma escola baseado somente no seu tamanho ou infraestruturas pode-se tornar enganador.
Assim, o que devemos avaliar são não só os instrutores que lá trabalham, mas igualmente o currículo que cada escola oferece.
Em termos técnicos puros, a BN EnduroCamp utiliza um sistema evolutivo que aplica em todos os treinos do seu currículo, e sobre o qual o seu campo de treinos foi desenhado. Imagem do plano curricular base da BN EnduroCamp.
Fora de estrada, principalmente no que diz respeito ás suas bases, não é algo que se aprenda em duas ou três horas, razão pela qual a maioria das escolas de alto nível oferecem no seu currículo módulos de 6, 8, 16 e por vezes até mais horas, tal como um sistema de ensino progressivo.
Esses módulos devem igualmente ser divididos numa parte teórica, em que deve ser explicado a fundo o porque e porque não das coisas, e uma prática, em que essa teoria será aplicada.
Isso não quer no entanto dizer que não se possa tirar muito partido de uma rápida aula de uma ou duas horas, mas pelas restrições temporais, essas tendem a ser mais eficazes para clarificações de dúvidas ou correções técnicas, não sendo a opção ideal para criar as importantes fundações de aprendizagem.
Dessa maneira, são os currículos que ditam as horas de formação necessárias para cada módulo oferecido, tal como as infraestruturas de cada escola.
Essa é a razão pela qual escolas de grandes ou pequenas dimensões, em campo aberto ou em terrenos fechados, com exercícios visualmente incríveis ou dissimulados podem ser igualmente eficazes, uma vez que essas escolhas foram maioritariamente feitas com a aprendizagem do seu currículo em mente.
Eu não sou adepto de acreditar que as coisas mais caras são obrigatoriamente melhores, sou mais adepto do conceito de que aceitamos o custo das coisas a que damos valor.
Assim sendo, e no que diz respeito a formação, existem algumas perguntas que te deves fazer quando estás a decidir se um treino que te chamou a atenção é caro, barato, ou vale exactamente o que te estão a pedir por ele.
Esse treino, é importante para ti?
Que problemas é que essa aprendizagem vai resolver na tua vida?
Estás a pensar aplicar o que aprendeste para o resto da tua vida e em qualquer mota, ou estás interessado numa formação por brincadeira e só para ter um experiência diferente?
Custos de material danificado, risco de lesão e outros fatores devem ser tidos em conta quando queremos fazer fora de estrada, seja com que mota for. Imagem expeditionportal.com
Um custo de 200, 300, ou mesmo 1.000 euros em formação parece-te elevado quando vês que uma mota de enduro nova custa cerca de 10.000 euros, uma adventure pode chegar aos 25.000, ou que uma linha de escape facilmente ultrapassa os quatro dígitos?
Um bom instrutor e uma boa escola não te querem roubar dinheiro, querem-te antes oferecer valor, muito valor.
Essa é a razão pela qual muito tempo e dinheiro são investidos na formação continua de instrutores, a manter os campos de treino funcionais para os seus sempre evolutivos currículos, tal como a desenvolver os melhores métodos de ensino possíveis.
É também essa a razão pela qual bons instrutores fazem questão de dedicar tempo a saber quais os objetivos e experiência de cada aluno antes de cada formação.
Essa informação é o que permite ao instrutor preparar cada treino, e mesmo em grupo, garantir que cada aluno é tratado como o ser individual que é, com os seus objetivos e receios a serem tidos em conta de antemão.
Isso significa que o valor que te está a ser pedido por um treino de alta qualidade engloba, entre outros fatores, muito mais horas de trabalho por parte do formador do que as que vais ver em ação durante a formação.
Formação de alta qualidade não são dicas pagas, é uma experiência evolutiva que consome muitas horas, recursos, e dedicação do formador, e isso, como tudo na vida, têm um valor.
Por isso, e num meio onde facilmente dizemos que devemos investir num capacete o que a nossa cabeça vale, devemos perguntarmo-nos o quanto vale a nossa segurança física e a proteção do investimento já feito na mota e material.
Assim, nunca escolhas um curso pelo seu valor nominal, mas sim, tendo em conta tudo o que aqui foi explicado, escolhe antes a tua formação por tudo o que essa experiência te vai oferecer no curto, médio e longo prazo.
Já o disse no passado e continuarei a dizer, pontos de vista discordantes são vitais para o desenvolvimento, e mais ainda quando são fundamentados com argumentos válidos.
Isso quer dizer que quando se argumenta que motas mais pequenas são mais leves, por exemplo, isso é um argumento irrefutável.
Assim sendo, é impossível não concordar que desenvolver aptidões técnicas numa mota mais leve, é por definição, mais fácil.
A diferença de peso e tamanho entre motas adventure de grande porte e dual-sports é inegável.
Imagem via advpulse.com
Outro argumento de peso é a diferença de tamanho entre motas.
Mais uma vez, a irrefutabilidade deste argumento torna totalmente impossível negar que o tamanho influencia facilidade de manobrabilidade, e com isso, dificuldade de utilização e aprendizagem.
Ainda assim, e concordando a 100% com ambos argumentos, sou obrigado a considerar que estes e outros suspeitos do costume têm uma falha comum.
Essa falha é a falta de uma clara base de comparação.
Para algo ser mais ou menos pesado, têm de haver uma concordância no que é um “bom peso”, ou por outras palavras, um peso de referência.
De igual maneira, o mesmo pode ser dito sobre tamanho, potência, ou demais métricas.
Assim, e ao ver-me obrigado a encontrar uma base para poder fundamentar a minha opinião, apesar de concordar com os argumentos apresentados, tenho de os considerar na sua generalidade, incompletos.
Apesar de sermos todos diferentes, seja em termos físicos, emocionais, ou mentais, existe um ponto de convergência entre todos os pilotos que querem dominar bem uma mota, e isso é uma boa aplicação de técnica.
É obvio que é possível aplicar técnicas diferentes, e que as próprias técnicas ao evoluir, mudam.
Da mesma maneira, é irrefutável que certos tipos de mota têm certas técnicas que lhes são únicas, ainda assim, os fundamentais do que é “a” técnica de condução fora-de-estrada são coerentes entre si.
Uma excelente posição corporal que pode e deve ser utilizada nas mais variadas modalidades de duas rodas fora-de-estrada.
Imagem via racerxonline.com
Assim, e utilizando técnica como base comparativa, acredito que com as devidas explicações de contraste, pode-se facilmente aprender e evoluir com qualquer mota.
Quando digo explicação de contraste, estou-me a referir ás limitações da técnica impostas por cada tipo de mota, a cada piloto especifico.
Esta ideia pode parecer confusa, por isso é importante desenvolver mais detalhadamente este conceito.
Não excluindo multidisciplinaridade, se aceitarmos que em termos técnicos o pico máximo do fora-de-estrada em duas rodas é o supercross e motocross, temos então aqui a fonte de onde todas as nossas técnicas base vão nascer.
Por serem modalidades desenvolvidas em "cabras do mato", tiram partido da imensa liberdade de movimentos corporais que estas motas oferecem.
Assim, é-nos facilmente permitido mexer o corpo desde o guarda lamas traseiro, até ao guiador, por exemplo.
Em contraste, o desenho de uma mota de adventure obriga-nos a ficarmos mais encaixados no cockpit, algo que largamente dificulta chegar o nosso peso muito para trás, ou para a frente.
Com esta comparação, facilmente se diria que a mais pequena endurista é mais fácil de manobrar do que a maior adv, no entanto isso seria uma visão limitada.
Isto assim o é porque alterações em motas, podem produzir resultados semelhantes ao encontrado nesta comparação direta entre motas de cross e adv.
Por exemplo, pequenas motas de enduro equipadas com tanques de combustível auxiliares ou de maiores dimensões, podem de igual maneira limitar a liberdade de movimentos de um piloto.
No entanto, estas limitações dizem somente respeito a motas como hardware, e não levam em conta que um piloto de 1.90m ou um de 1.70m a conduzir a mesma mota vão ter dificuldades particulares.
Assim sendo, a facilidade ou não com que se consegue aprender técnica não se prende pelo tipo de mota em si, mas sim pelas limitações da aplicação de técnicas a que cada piloto se vê obrigado na sua própria mota.
Vendo as coisas desta forma, encontramos agora um padrão de limitações que é facilmente replicável para qualquer tipo de movimento técnico que se queira aprender.
Apesar de ambos os pilotos estarem a utilizar a mesma técnica, vê-se perfeitamente as diferentes limitações entre motas. Por exemplo, o espaço disponível entre a cabeça e a frente da mota, o que dita que na endurista o tronco pode descer muito mais do que na adventure. Diferenças de alturas entre pilotos produzem limitações semelhantes até na mesma mota.
Imagem via The Mx Factory, newmotor.com.cn e BN EnduroCamp
Ver o problema desta perspectiva é importante porque com uma base de comparação padronizada, como instrutor, torna-se bastante fácil adaptar ensinamentos e técnicas a cada piloto como um indivíduo único.
Isso quer dizer que se se ensinar a técnica correta, explicar a possível limitação da mesma para a nossa mota e para o nosso físico, e de que maneira é que isso nos pode ou não dificultar a vida no terreno, pode-se aprender técnica em qualquer mota.
Esta opinião torna-se ainda mais vincada com um fenómeno que sempre me fascinou, o da diferença evolutiva entre os alunos que fazem treinos com motas próprias, e os que os fazem com as motas da escola.
Se por um lado é clara a velocidade de evolução dum aluno a utilizar motas alugadas, para a maioria das pessoas esse efeito é quase que maquilhagem técnica.
Isto porque assim que passam para a sua mota, parece que agora de cara lavada se esqueceram de tudo o que acabaram de aprender na mota da escola.
E sim, ainda que alguns tenham alguma recuperação evolutiva no medio prazo, esse não é o padrão encontrado na maioria.
O treino que cada um faz a nível pessoal é essencial para se continuar a evoluir. Seja qual for o curso que se fez, sem treino pessoal continuo, tudo se esquece.
Imagem BN EnduroCamp
Por outro lado, alunos a aprender com mota própria, tendem a demonstrar uma evolução mais contida, mas ainda assim, continua.
Ainda que parte dessa diferença evolutiva venha do medo de deixar a mota pessoal cair, mais uma vez, aqui a base e o padrão atrás referido voltam a ser aplicáveis.
Isto porque ao não estarmos a falar pilotos com uma maturidade técnica elevada, ao saltarem de uma mota para a outra no fim do treino, os recém formados alunos sentem-se como um peixe fora de água.
A falta de coesão entre os limites das diferentes motas, aliada há ainda fraca capacidade de aplicação técnica, causam uma reação defensiva.
Essa reação natural, é exponenciada pela contra-naturalidade de muitos movimentos técnicos, que pelo seu desconforto no inicio, levam estes pilotos a evitar ou modificar movimentos, por insegurança para com a sua própria mota.
Assim, aprender com recurso à mota com que se vai andar regularmente permite uma base de desenvolvimento mais lenta, mas ainda assim mais segura, confortável, e consistente para se desenvolver as aptidões técnicas necessárias.
Não existem regras sem exceções, e isso significa que existem sem duvida momentos na vida para se treinar ou simplesmente andar com motas diferentes da nossa.
Ainda assim, estas situações assentam numa premissa muito clara, a de tenderem a ser sempre mais produtivas quando efetuadas por pilotos com um consistente conhecimento técnico.
A necessidade desta premissa torna-se clara até em exemplos tão simples como o de um test drive.
Se eu tiver dificuldades técnicas na minha mota, a probabilidade é de que continuarei a ter as mesmas dificuldades técnicas com qualquer outra mota que esteja a experimentar.
Dificuldades técnicas com uma mota mantém-se noutras motas, ainda que diferentes motas permitam alguns erros com mais facilidades que outras.
Imagem via riumphrat.net
Assim, a única medição possível de ser feita num test drive é a de que mota melhor se adapta ás minhas limitações.
Por outro lado, pilotos com um bom conhecimento técnico conseguem testar qualquer mota com uma visão muito diferente, pois é-lhes permitido testar os limites da aplicação de diferentes técnicas nessa mota especifica.
Este é um imenso beneficio para quem está á procura de uma mota que para além de lhe encher o olho, lhe sirva um propósito claro.
Ou seja, a definição de uma ou outra mota ser “mais capaz para fora-de-estrada” deixa de se tornar subjetiva, e passa a assentar na clara compreensão pessoal do que a mota a teste permite ao piloto fazer, e de onde isso se encaixa nos nossos objetivos pessoais.
Se acredito que podes e deves aprender as bases técnicas com a mota que tens, essa afirmação tem a palavra base no meio por uma razão.
Essa razão prende-se pelo facto de que quando começamos a falar em técnicas mais avançadas, as coisas podem mudar de figura.
Ainda assim, acredito que não há problema em continuar a utilizar a nossa mota, nem que seja porque qualquer aluno nesta fase já está incrivelmente ciente das limitações que vai encontrar com a mota que têm.
No entanto, aprender inversões de sentido em pivot com uma mota de mais de 100cv e 200kg, mesmo nas mãos de um piloto de maior porte, por exemplo, pode ser muito intimidante.
Pivots podem ser feitos utilizando várias técnicas, no entanto, em motas grandes, todas elas requerem uma boa dose de coragem para as primeiras tentativas.
Imagem via youtube de Shaun Terblanche
Assim, o acesso a motas mais pequenas, como 110cc, pode ser muito benéfico.
No exemplo deste tipo de pivot, por exemplo, a dificuldade prende-se na coragem para largar a embraiagem e entender onde o corpo tem de estar para manobrar o peso da mota em movimento.
Essa mecânica corporal e timing de controlos podem rapidamente ser dominados numa 110cc, o que pela já existente experiência piloto, torna a técnica facilmente replicável na sua própria mota.
Com esta explicação em mente, é fácil perguntarmo-nos porque é que perdemos este tempo todo e não se aceita logo que se deve começar com uma mota mais pequena.
Afinal, chegamos a conclusão que é mais fácil desenvolver técnica com motas pequenas, e uma vez dominada, é relativamente simples a sua aplicação em motas de maior porte.
Se bem se lembram, este foi um dos argumentos com que concordei logo no inicio deste artigo.
Ainda assim, e por mais válido que esse argumento seja, o mesmo perde legitimidade quando posto em contexto.
Esse contexto obriga-nos a não só considerar o relatado sobre a evolução de alunos com motas alugadas vs motas próprias, mas também a considerar um ponto fulcral do motociclismo, a paixão que move cada motociclista.
Desenvolver técnica requer trabalho e compromisso, e isso significa que é um processo moroso, e isso só por si tende a afastar muitos da procura por formação.
É um enorme prazer ver alunos de todas as idades a continuarem procurar desenvolver a sua técnica fora de estrada, seja com que mota for.
Imagem de treino BN EnduroCamp
Assim, se já é complicado para muitos aceitar a necessidade de aprender técnica, mais complicado será se lhes for dito que não devem treinar com a mota que os faz sonhar á noite e que tanto trabalharam para comprar.
Essa é a razão pela qual prefiro ver cada piloto como o ser individual que é, com os seus sonhos e objetivos próprios.
Esta visão, aliada ás explicações dadas, permitem que o nosso fora-de-estrada se torne mais abrangente, acolhedor, e acessível a todos, sem que isso limite a qualidade e quantidade de informação que está a ser lecionada.
Queres aprender com uma mota pequena?
Perfeito.
Queres aprender com uma grande?
Perfeito na mesma.
O que é importante é que queiras aprender.
Assim, o ponto fulcral desta discussão não deve ser qual a melhor mota para aprender, evoluir, ou até mesmo para andar no dia a dia, pois como ficou provado existem formas de ensinar exatamente a mesma matéria aos utilizadores de todas elas.
Dessa forma, o que devemos fazer como comunidade é virar o bico ao prego.
Devemos então investir na nossa formação, e fazer com que a discussão geral passe a ser sobre a necessidade de se aprender com quem sabe ensinar, em vez do tamanho da máquina em que essa aprendizagem deve ser feita.
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Em todos os treinos que dou existe pelo menos um momento em que digo ou explico qualquer coisa que até para os pilotos mais experientes é surpreendente.
Entre elas está normalmente o facto de que qualquer mota pode e deve ser vista como duas.
Esta forma de abordar uma mota prende-se pelo facto de ser totalmente impossível mover a roda de trás, o ponto mais recuado e mais baixo da mota, com o guiador, o ponto mais avançado e elevado do motociclo.
Se a mota têm uma clara separação feita pela coluna de direção, temos também de criar uma com o nosso corpo.
Imagem via mxbars.net e trabalhada por BN EnduroCamp
Isto assim o é porque independentemente de quanto o guiador mexer, nunca vamos conseguir manobrar mais do que a roda da frente, com tudo o que está para trás da coluna de direção a manter-se basicamente inalterado.
Esta visão simplista de um movimento fácil de replicar por todos vocês, têm implicações drásticas na forma como conduzimos, pois obriga a toda uma diferente abordagem por parte do piloto.
Assim, o que queremos evitar, é manobrar a mota pelo guiador, escolhendo perder o controlo da traseira, deixando-a em esquema de comboio, em que a frente vai, e a traseira segue.
Esta, ou qualquer uma das suas variantes, é no entanto a abordagem escolhida por muitos pilotos recém chegados ao mundo das duas rodas.
Felizmente, essa tendência tende a desaparecer rapidamente, sendo substituída pela ideia de guiar com as peseiras, uma técnica largamente mais correta, mas ainda assim incompleta.
A utilização das peseiras como método de condução torna-se incompleto pois a larga maioria das explicações desta técnica tende a não introduzir o conceito de separação corporal, um conceito importante de explicar e compreender.
Se aceitamos que é impossível manobrar a roda de trás com o guiador, temos igualmente de aceitar que é impossível controlar a da frente somente com as peseiras.
Ao pressionar a peseira do lado direito, por exemplo, a mota irá cair para a direita, e até certo ponto, a frente irá automaticamente alinhar-se, tornando relativamente fácil a execução de curvas sem inputs do guiador.
Este é um fenómeno real, mas no entanto enganador, e prova de que possível não é sinónimo de bem executado ou completo.
Uma mota curva, entre outras razões, pela existência do cone de curva, um conceito importante de compreender.
Imagem BN EnduroCamp no artigo sobre pneus e tração
Vamos assumir um slalom bastante largo.
Como já foi explicado, é sem duvida possível curvar sem recurso ao guiador utilizando somente o balanço da mota dado pelas peseiras.
Para todos os efeitos, estamos aqui a utilizar um “comboio invertido”, em que estamos a dar um input á traseira da mota, e a deixar a frente seguir.
Ainda assim, se encurtarmos a distância entre os cones do nosso slalom imaginário, rapidamente se torna impossível utilizar a mesma técnica.
Isto porque de forma a encadear curvas apertadas, iremos necessitar de introduzir inputs de guiador para aumentar e controlar a velocidade de transição entre curvas.
Assim sendo, chegamos agora ao principio básico de separação corporal, em que estamos a utilizar as nossas mãos para manobrar a roda da frente, e os nossos pés para controlar a roda de trás.
Tendo agora compreendido de forma geral o porque da necessidade da utilização dos pés e das mãos para controlar a mota, é importante expandir o conceito, pois infelizmente é neste ponto que muitos pilotos se encontram.
Digo infelizmente pois apesar da utilização mista do guiador e peseiras para conduzir ser uma técnica correta, e de alguma forma natural, está normalmente a ser aplicada na sua forma mais básica, e portanto, incompleta.
Incompleta porque não está a levar em consideração a biomecânica natural do corpo humano, resultando em erros comuns e relativamente fáceis de identificar.
Se já alguma vez viram alguém a levar um safanão na roda da frente que resultou na traseira saltar da sua trajetória, então já viram um destes erros a acontecer.
O mau posicionamento do pé direito fê-lo perder estabilidade do tronco, forçando o cotovelo e a cabeça a cair para dentro da mota, criando um elevado risco de queda. Um erro possível de ser controlado utilizando separação corporal.
Imagem motosport.com
Da mesma maneira, se já viram alguém a dar uma “cangocha” com a roda de trás e a perder a frente como consequência, então também já viram outro destes erros a acontecer.
Estes problemas acontecem pois apesar do método de controlo da mota estar a existir em separado, a separação do corpo não está a ser tida em conta.
Dessa forma, qualquer input feito nas mãos está a ser transmitido para os pés, da mesma maneira que qualquer input dos pés está a ser transmitido para as mãos.
Esse é o resultado do nosso corpo estar a funcionar como um fio condutor, exatamente o que queremos evitar.
Se para a nossa segurança não podemos deixar o nosso corpo conduzir inputs de parte a parte, temos então de criar algum tipo de separação entre o nosso tronco e as nossas pernas.
Essa separação é facilmente atingida pelo correto posicionamento da anca, uma posição que funciona a conduzir em pé, ou sentado.
Ao empinar o rabo, ou ao rodar a anca para fora, para ser mais preciso, vamos conseguir atenuar muitos inputs que antes viajavam livremente pelo corpo, o que até certo ponto, permite ao corpo trabalhar como dois.
Essa rotação da anca que produz separação corporal oferece benefícios imediatos.
É possível ser estável somente por pôr as costas direitas, mas essa posição só é maximizada pela posição da anca.
Imagem BN EnduroCamp
Primeiro, vamos automaticamente ativar os nossos abdominais e dorsais, deixando as nossas costas direitas e numa posição ativa, e não arqueadas e numa posição enrolada e defensiva.
Esta nova posição permite atingir estabilidade no nosso tronco sem grande esforço mental.
Isso não significa que não se deve forçar ainda mais essa estabilidade em certos momentos, como em curva, significa somente que temos agora uma excelente base.
Esta utilização da biomecânica natural segue a mesma teoria da posição das mãos e dos pés, já discutida em artigos passados.
Dito isto, é importante ressalvar que é sem duvida possível manter as costas direitas sem a rotação da anca, mas sendo um movimento mentalmente mais desgastante, a tendência para perder essa posição é maior, mesmo em atletas de alto nível.
Da mesma forma, manter simplesmente as costas direitas, apesar de promover estabilidade, não promove separação, logo, não atenuando da mesma forma a comunicação entre a parte superior e inferior do corpo.
Outro beneficio, é que ao termos agora um tronco mais estável de uma forma mais intuitiva, torna-se mais simples a aplicação das mais variadas técnicas, seja de curvas, saltos, ou até mesmo partidas.
Um péssimo exemplo de falta de separação e iniciação por parte do #52 demonstrando que ser rápido e ser tecnicamente perfeito são conceitos diferentes.
Imagem mcnews.com.au
Ser profissional não significa ser tecnicamente perfeito, significa ter uma base técnica que permite atenuar os erros que acontecem.
Separação corporal é portanto uma das técnicas que permite a pilotos de topo cometer erros com os pés, sem que isso automaticamente destabilize o seu tronco, e vice versa.
Por outras palavras, um erro na roda da frente ou de trás não influencia tão diretamente a outra roda.
Ao assimilarmos esse claro beneficio de segurança e controlo, torna-se fácil compreender o principal problema de conduzir sem separação corporal.
Ao termos o tronco a comunicar com as pernas, ligamos a roda da frente á roda de trás.
Vamos imaginar uma curva em que por um mau posicionamento do pé fora da peseira, existiu uma falha técnica e o pé foi arrastado para trás.
Pilotos com uma boa posição e separação corporal conseguem mais facilmente progredir no terreno sem sentir grandes impactos dessa falha.
O pé puxa a perna, que por sua vez roda a anca, que faz cair o ombro e cotovelo, e essa nova atitude corporal faz a roda da frente virar para dentro da curva, o que tende a causar uma queda.
Em baixo temos o exemplo do Jett Lawrence, um dos pilotos com melhor estabilidade do tronco e um dos que tende sempre a manter um excelente nível de separação corporal.
Neste exemplo, em que o seu pé direito foi cuspido para trás, a sua posição corporal permitiu-lhe salvar o erro técnico, por não permitir o input do pé passar para o tronco, que se manteve inalterado.
Ou seja, a sua estabilidade e separação corporal permitiram-lhe que o pé não afetasse a roda da frente, que se manteve inalterada na sua trajetória.
Um erro técnico com o pé a ser minimizado por uma excelente estabilidade e separação do tronco e pernas. Um contraste da imagem mostrada acima neste mesmo artigo.
Imagem via dirtbikemagazine.com
Ainda que separação corporal seja um recurso incrível, pode e dever ser potenciado com um conceito mais simples de compreender, mas não menos importante, a iniciação.
Uma excelente forma de compreender iniciação e separação corporal é com um simples exercício prático.
Vamos para este exercício trabalhar com acelerações e travagens em reta, algo extremamente familiar para qualquer piloto.
Experimenta então sentares-te na mota, arrancares, e assim que te sentires preparado, acelerares consistentemente durante uns metros, manteres a velocidade durante uns segundos, e de seguida travares de volta à velocidade inicial.
O objetivo deste exercício não é ser super rápido a acelerar até velocidades elevadas, ou fazer a mais curta travagem.
A ideia é prestar atenção ao que a mota faz, à resposta do nosso corpo, e à nossa posição corporal.
Para este exercício uma aceleração dos 10 aos 30 ou 40 km/h, e uma travagem equivalente é suficiente. O interesse é sentir a diferença na anca, e não otimizar acelerações ou travagens.
Imagem BN EnduroCamp
Dito isto, rapidamente sentimos que ao acelerar o nosso corpo tende a ser projetado para trás, e no inverso, ao travar, projetado para a frente.
O próximo passo é então rodar a anca para fora, e repetir o exercício mais umas vezes.
Ao aplicar separação corporal, é imediata a diferença, seja em pé, ou sentado.
É chegada agora a altura de introduzir iniciação, um conceito que pode ser definido como a atitude de preparar o corpo para o que vai acontecer.
Por outras palavras, se vais acelerar, inclina ligeiramente o corpo para a frente antes de rodar o punho, contrariando o movimento que o corpo naturalmente vai querer ter de ser puxado para trás.
No inverso, antes de aplicares os travões, começa a inclinar o corpo para trás antes dele ser projetado para a frente.
Não só vais novamente sentir diferença na tua estabilidade, mas assim que tiveres estes dois conceitos como segunda natureza, vais entender que provavelmente andaste a conduzir de forma errada toda a tua vida.
Se a nível competitivo este tipo de técnicas deve ser utilizado o máximo de tempo possível, para dual-sport, adv, passeios enduristas com os amigos, e até em alguns ambientes competitivos como rally raids, podemos tomar outra atitude.
Pela diferença de ritmos e tipos de terreno em que normalmente se anda por lazer, ou pelas longas tiradas de algumas competições, é fácil encontrarmo-nos em terrenos onde estamos em total controlo da mota.
Assim, separação pode ser utilizada como um trunfo extra somente para os terrenos mais exigentes.
Por ser uma técnica rápida de aplicar quer sentado quer em pé, utiliza-la só quando necessário permite poupar muita energia, algo que é crucial quando se vai estar muitas horas em cima da mota.
Um claro exemplo de como pequenas alterações de atitude e técnica têm grandes impactos na condução.
Compreendendo isso, torna-se então simples não só aceitar a necessidade de aprender mais, mas também de que uma condução segura, consistente, e controlada está ao alcance de qualquer um.
Por isso marca um treino com um treinador profissional, garante que fazes exercícios por ti próprio de vez em quando, e faz questão de que separação corporal e iniciação passem a ser uma realidade na tua condução.
Rapidamente vais adquirir uma confiança e controle que nunca pensaste conseguir ter.
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Apesar de ser muito difícil encontrar verdades absolutas na vida, existem algumas.
A morte, a inevitável evolução do mundo como o conhecemos, e a igualmente inevitável dificuldade do ser humano em aceitar mudanças.
Quando me refiro a mudanças não quero dizer que as mesmas sejam sempre positivas, e essa é a razão pela qual independentemente da minha opinião sobre motas elétricas, este artigo não aponta a tentar evangelizar ninguém.
Isto porque o processo evolutivo sem qualquer tipo de opinião contrária à teoria apresentada tende a ser deficiente, e assim sendo, vozes contrárias são nesta fase tão importantes como as a favor.
Dessa forma, o que se torna importante não é a posição de uma ou outra opinião, mas sim o fundamento dos argumentos apresentados.
Quando falamos em motas elétricas, um dos grandes argumentos contra prende-se com a sua autonomia, algo que a meu ver, tem de ser marcado como um argumento fraco, por exemplo.
Autonomia e tempos de carga são algo que irá estar em constante evolução. Há 20 anos tínhamos carros a consumir 15 litros aos 100, hoje temos carros a fazer médias de 5.
Imagem motorcycle.com
Apesar de estar mais entusiasmado com o mercado das elétricas do que tenho estado com o mercado de combustão nos últimos anos, não sou obrigatoriamente fundamentalista da ideia de andar em cima de uma pilha gigante.
Isto porque o que realmente me entusiasma é a clara janela de oportunidades que se está a abrir para o mundo do motociclismo.
Motas elétricas abrem a porta a pistas de fora-de-estrada indoor e outdoor em qualquer cidade ou centro urbano.
Imagem via Youtube de RB412 a exemplificar uma pista de motocross indoor
Se quem vai conseguir a adoção das massa são motas elétricas, a hidrogénio, bio combustíveis, ou qualquer outra opção que não tenho capacidade de sequer imaginar, isso é-me irrelevante, pois cada uma terá os seus prós e contras.
O que me interessa é que quem está a abrir essa janela hoje em dia são as elétricas, e como tal, é sobre elas que me prenuncio.
Assim sendo, o primeiro ponto do qual não consigo fugir é a inovação geral apresentada, não só em termos estéticos, mas também de conceito.
Há exceção de uma ou duas menções honrosas, pouca disrupção tem acontecido no mercado da combustão, e isso confirma-se com muitas marcas a tentarem simplesmente ter mais potência e gadgets do que a concorrência, ou do que a sua própria oferta no ano anterior.
Quando a potência não é objetivo, o que acabamos por ver são motas antigas com um look moderno, motas nascidas da mistura de várias peças diferentes da mesma marca, e até mesmo a mesma mota sobre o nome de diferentes marcas, com somente meia dúzia de alterações de importância debatível entre elas.
Este modelo evolutivo acaba por se tornar um constante “mais do mesmo” replicável ano após ano, algo contraproducente para um saudável crescimento do mercado a longo prazo.
Não me levem a mal, qualquer uma dessas abordagens é mais do que válida do ponto de vista comercial.
Afinal de contas, os números de vendas não mentem, pelo que a estratégia é claramente ganhadora, mas para nós, o publico, tende a ser limitadora.
Ter uma só mota na garagem que me permita ter 80cvs para a autoestrada, ou 10cv para os meus filhos poderem fazer os primeiros km’s de fora-de-estrada, entusiasma-me.
Saber que a quase inexistência de manutenção dos modelos elétricos vai trazer muitos utilizadores novos, entusiasma-me.
Mas aceito que esse entusiasmo pode vir a não ser correspondido, ou partilhado por todos.
E se aceito isso, é porque não é obrigatoriamente a tecnologia em si que me move, mas o saber que o nosso mundo das duas rodas está a começar um novo capitulo, algo que lhe permitirá sobreviver, crescer, e estar presente na vida de futuras gerações.
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A diferença de energia perdia durante o processo de compressão e recuperação é conhecida como histerese.
Um pneu com mais histerese vai-se deformar de uma forma mais exata com a estrada, agarrando melhor as “facas” do solo, promovendo tração, mas aumentando o desgaste.
Depois de toda esta explicação, muitos de vocês devem-se estar a perguntar o que fazer agora com esta informação, e essa é uma pergunta válida, e de resposta simples.
Ao compreendermos os conceitos básicos explicados, compreendemos mais facilmente o que frases como “põem o peso para a frente” querem dizer, tornado a sua execução mais intuitiva e controlada.
Outra benesse, é a compreensão de que um pouco de derrapagem pode significar estar a maximizar velocidade, e que isso não deve ser confundido com uma derrapagem total, que pode parecer espetacular em fotos, mas reduz drasticamente performance.
A estes benefícios, adicionaria ainda um extremamente importante, a compreensão de que não existe “o melhor pneu” que tantos procuram nas redes sociais e grupos de amigos.
O melhor pneu depende de imensos fatores, sendo que o maior diferenciador és mesmo tu.
O tipo de uso que vais dar ao pneu, em que condições, quais são as tuas expectativas, e até mesmo o teu tipo de condução vão drasticamente afetar a performance de qualquer pneu que te chegue ás mãos.
Essa é a razão pela qual um pneu que para uns é brilhante, é apelidado como criminoso por outros.
Por isso, agora que tens alguns conhecimentos base, é hora de tirares mais partido da informação que já tens e tornares-te um piloto mais seguro, rápido e consistente por isso, seja a treinar sozinho, ou com a ajuda de um treinador profissional.
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É fácil assumir que para se ter uma excelente partida temos de ter reflexos felinos, e um bom mecanismo de holeshot, e sem dúvida que ambos ajudam, mas há muito mais que se lhe diga para se conseguir consistentemente arrancar com sucesso.
Na base desse sucesso está um trabalho feito muito antes da mota sequer sair da carrinha, com o desenho de um bom plano de corrida.
Eu sei que pode parecer irrelevante para um arranque falar-se em planos de corrida, mas ter a tática delineada para o que vai acontecer depois da primeira curva vai-te dar a liberdade mental necessária para estares mais focado passo a passo.
Assim sendo, depois de teres esse trabalho de casa feito, é altura de preparar a tua zona de saída.
Apesar de a nível profissional, e mesmo amador, muitos gates já estarem equipados com bases de metal, é ainda bastante comum encontrar zonas de largada em terra, e essas requerem que saibamos o que fazer para maximizar a nossa probabilidade de um holeshot.
Se muitos, seja manualmente ou com recurso ao pneu traseiro, preferem limpar e usar o rego existente para meter a mota, eu desaconselho essa prática.
Um cavalinho ao arrancar por má posição corporal e má preparação do gate de saída.
Imagem via Pinterest.
Ao termos a mota metida num rego, a primeira coisa que vamos fazer assim que o gate cair vai ser forçar a roda da frente a saltar pela diferença de altura entre o rego e a barra do gate, algo que devemos evitar.
Assim sendo, trazer a terra que se encontra á volta do rego para dentro do mesmo, e compactar tanto quanto possível essa terra vai-nos dar uma base de lançamento nivelada e promover a estabilidade da mota.
É sem dúvida discutível que uma base feita de terra compactada antes do inicio de uma corrida não irá promover tanta tração como um rego calcado, mesmo depois de termos dedicado tempo e paciência a esse trabalho, ainda assim, eu prefiro analisar o problema de outra perspetiva.
A distancia entre o ponto de partida do pneu de traseiro e o primeiro ponto de alta tração é inferior há distancia necessária para reequilibrar a mota após o cavalinho inicial pelo salto entre o rego e a barra do gate.
Dito isto, um bom truque a usar é levantar o gate, e tanto quanto possível limpar e cavar o local onde ele vai cair.
Uma clara diferença entre uma linha de partida preparada em rego, e uma calcada.
Imagem preparada pela BN EnduroCamp
Ainda que seja importante manter em mente que em algumas competições não é permitido passar para a parte da frente do gate, mexer-lhe é permitido, e quanto mais rente ao chão o conseguirmos deixar, menor será a probabilidade da nossa frente querer saltar quando a roda da frente lhe bater.
Dependendo do tipo de terreno e do gate, esta preparação pode chegar a baixar a barra alguns centímetros, o que para um embate sem momento da roda da frente faz toda a diferença no equilíbrio da mota.
Agora que tens o teu gate preparado, é altura de te prepares a ti, e isso significa primeiro que nada, e antes de te sentares na mota, teres o teu aquecimento bem feito.
Não interessa o quão bem preparaste o teu gate ou a tua mota, se não tiveres fisicamente a 100% quando for altura de arrancar podes demorar várias voltas até encontrares o teu ritmo, e isso é algo a evitar se estás a tentar ganhar.
Um aquecimento bem feito faz a diferença principalmente nas primeiras voltas.
Imagem via Google
Chegada finalmente à altura de te sentares na mota, estás agora pronto para começar a tua rotina, algo que deves consistentemente repetir antes de cada corrida.
Muitos pilotos, senão mesmo a maioria são supersticiosos de uma forma ou de outra, e essas superstições vem da necessidade humana de encontrar pontos de conforto e segurança mental para dar resposta a certos estímulos.
Nada de errado quanto a isso, no entanto, e em competição, consistência é chave, razão pela qual rotinas se tornam importantes.
Para nós, e quando nos referimos a arranques, essa consistência significa garantir o melhor lugar possível na primeira curva, largada após largada.
Dessa forma, a utilização de uma rotina vai-te permitir não só garantir que nada ficou esquecido, tal como oferecer um ritual que a nível cerebral te vai trazer uma serenidade semelhante á de qualquer superstição.
As rotinas são pessoais e podem ser desenvolvidas e alteradas ao longo do tempo, ainda assim, e como base, eu aconselho que as mesmas se foquem em três pontos, um mecânico, um mental, e um corporal.
Na parte mecânica, uma verificação rápida dos comandos da mota ao aplicar e aliviar o travão da frente e de trás, a embraiagem, e o acelerador, vão deixar de lado medos de falhas mecânicas básicas.
Todas as corridas começam muito antes da largada, e aproveitar esse tempo para fazer rotinas e acalmar a mente, algo que faz a diferença entre ganhar ou não.
Imagem via riderswestmag.com
De forma a aumentar ainda mais o conforto mecânico com a mota, não te esqueças também de garantir que estás na mudança correta, e fazer uma última verificação ao aliviar a embraiagem só para garantir que não cometeste um erro e te encontras em neutro.
No que diz respeito ao corpo, começar por baixo a alinhar a posição dos pés, dos joelhos, anca, tronco, braços e cabeça, vai garantir que nada ficou esquecido ou por preparar.
Chegam agora os minutos finais antes de arrancar, e estes devem ser dedicados a garantir que estás com a atitude mental correta.
Faz uma pequena volta mental pela pista revendo o teu plano de corrida, ou pelo menos o das primeiras curvas, e vai respirando fundo inspirando pelo nariz e expirando pela boca de uma forma cadenciada.
Podes escolher simular uma volta mental, ou várias, sendo que o mais importante após a primeira é manteres o ritmo de respiração de forma a controlar os teus batimentos cardíacos.
Já falamos de preparação de gates e de rotinas, e isso significa que temos agora de dedicar todo um capitulo a um ponto especifico do teu ritual, a verificação da tua posição corporal.
Começando pelos pés, podes escolher manter ambos os pés no chão, ou somente um, no entanto, com ambos consegues manter mais facilmente o equilíbrio do corpo, pelo que o uso de blocos pode ser recomendado.
Pilotos mais altos têm mais facilidade em arrancar só com um pé no chão, ainda assim, é mais fácil manter o equilíbrio com dois. Esta imagem demonstra somente a utilização de blocos, e não uma boa posição inicial de arranque.
Imagem via Youtube de bcavy2 e mxladen.com e preparada pela BN EnduroCamp
Os pés devem estar em frente das peseiras, com a parte de trás da bota encostada à peseira, a lateral interior da bota encostada ao quadro, e tal como numa boa posição de pés, estes estarem ligeiramente virados para dentro da mota.
Esta posição vai-te permitir pressionar a mota mais facilmente com os joelhos, tal como garantir que ao arrancar os teus pés não vão ser disparados para trás uma vez que a peseira irá funcionar como batente.
Usar a peseira como batente impede o pé de ser projetado, e manter a bota contra a mota ajuda a garantir estabilidade do corpo e da mota.
Imagem mxvice.com e racerxonline.com e trabalhada por BN EnduroCamp
No banco, devemos apontar a uma posição ligeiramente á frente da linha perpendicular feita pela peseira, sendo que a posição das calças é fundamental.
Digo a posição das calcas pois é relativamente comum ver pilotos simplesmente a sentarem-se e arrancar, sendo que rapidamente acabam a escorregar pelo tecido das calças até uma posição mais atrasada no banco, promovendo um cavalinho.
Dito isto, provavelmente a forma mais simples de fazer este ajuste é sentares-te mais na frente do banco, junto á tampa do depósito, e deixares-te escorregar para a posição correta, o que vai puxar todo o tecido extra das calças para a tua frente.
Outra forma é simplesmente levantares-te e puxares as calças com a mão, sendo que o que é importante é garantir que não há material extra debaixo do banco ou junto ao teu rabo.
Daqui seguimos para a anca que deverá estar bloqueada promovendo separação, tal como segurança e estabilidade.
Se tiveres as costas relaxadas ou arqueadas, assim que acelerares o teu tronco vai ser projetado para trás promovendo um péssima posição corporal que irá destabilizar a mota.
Por outro lado, se mantiveres a anca bloqueada, ou o rabo empinado se preferires esse termo, a tendência do tronco vai ser puxar o rabo contra o banco promovendo tração e uma posição consistente e segura.
A anca bloqueada ajuda a garantir a roda da frente baixa e o corpo numa posição segura. A anca relaxada puxa o corpo para trás e levanta a roda da frente.
Imagem BN EnduroCamp
Os braços querem-se dobrados, com os cotovelos altos, e com uma boa posição das mãos no guiador que promovam o controlo fino quer do acelerador quer da embraiagem, enquanto garantem que o corpo não será totalmente arrancado da posição no arranque.
Quanto melhor for o posicionamento do resto do corpo, principalmente das pernas e tronco, menos força teremos de fazer no guiador com os braços, o que irá permitir um melhor controlo geral da mota.
Por fim chegamos á cabeça e ao posicionamento final quer da mesma quer do tronco como um todo.
Aqui não existe obrigatoriamente uma posição exata, ficando a mesma dependente não só da tração da pista, que pode obrigar a por mais ou menos peso na frente, mas também da altura do piloto.
Ainda assim, podemos dizer que numa posição muito frontal podemos ter a cabeça à frente das barras quase no inicio do guarda lamas, com o esterno por cima do guiador, e numa posição mais recuada a cabeça por cima do guiador com o esterno sobre a tampa do depósito.
Uma boa posição corporal de arranque com a cabeça numa das posições mais frontais possíveis.
Imagem via motocrossactionmag.com
Pela variedade de posições possíveis para a cabeça, torna-se importante referir que treinar partidas em diferentes tipos de terreno vai-te dar a experiência necessária, por tentativa e erro, para compreenderes qual a melhor posição a adotar em cada pista.
Diz a gíria popular que “o Diabo está nos detalhes”, e a escolha de mudança é um deles, razão pela qual a sua escolha é uma das perguntas mais regulares por parte de pilotos a querer melhorar as suas partidas.
Ainda que exista quem prefira arrancar em 3ª ou 4ª, e ainda que existam acessórios como embraiagens da Rekluse, eu sou mais apologista de um forte trabalho de controlo de acelerador e embraiagem, algo que tende a manter a técnica do piloto ao melhor nível e em qualquer mota.
Não quero com isto dizer que mecanismos como a Rekluse não podem ser utilizados, chamo somente a atenção que o seu uso sem treino constante em motas “normais” vai provocar um retrocesso nas capacidades manuais de qualquer piloto.
Assim sendo, se se for gradual na embraiagem e consistente no acelerador, a 2ª torna-se uma escolha de mudança que se aplica desde as mais pequenas 65cc até ás 450cc.
Apesar de haverem outras opções, a 2ª mudança com bom controlo permite-te arrancar bem em qualquer cilindrada de mota.
Imagem via rideapart.com
Para maximizar tração, é aconselhável manter a mota entre os 50 e 75% de rpm máximos até á altura de trocar de caixa, em que podemos ser mais agressivos com o acelerador.
Isto porque demasiado acelerador e pouco controlo de embraiagem nos metros iniciais vai promover perdas de tração, tal como levantar demasiado a roda da frente, ou até mesmo deixar a mota ir abaixo ao arrancar.
No que diz respeito à troca de caixa, essa pode ser feita ou no movimento de levantar os pés para a peseira, algo que é mais rápido mas requer mais precisão, ou por levar o pé primeiro até à peseira para depois trocar de caixa normalmente, um movimento mais lento mas menos passível de erros.
Se fizeres testes consistentes utilizando diferentes tipos de percentagem de acelerador vais acabar por entender que garantir tração continua e controlada é mais importante do que ser o mais rápido a reagir à queda da gate.
Isto porque ser rápido é sem duvida importante, mas se não conseguires a tração necessária para progredir na pista, rapidamente vais ser ultrapassado por um piloto com mais sensibilidade e entendimento de tração.
Dito isto, assim que vês o gate a cair não te esqueças de imediatamente ajustar a tua visão para a frente da pista e para o ponto onde queres entrar na primeira curva, principalmente se tiveres muitos regos na largada.
Ao veres o rego e reajustares a visão o teu cérebro vai assimilar a informação e ajustar a tua condução, permitindo-te deixar a mota trabalhar debaixo de ti sem estares a lutar com ela enquanto apontas para onde queres ir.
Se te mantiveres focado no rego e não na entrada da curva vais acabar a fazer micro ajustes para equilibrar a mota que te vão tirar equilíbrio, concentração, e eventualmente capacidade de aumentar velocidade.
Por isso agora que sabes como te preparar desde o primeiro momento até ao primeiro salto, não te sobra nada a não ser ires para o campo e treinar, seja sozinho ou com ajuda profissional.
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Em pistas amadoras e competições de classes mais baixas é possível encontrar braking bumps até ao apex, e muitas vezes até após, tal como linhas de curva com ângulos muitos apertados.
Imagem básica demonstrativa de trail braking (B) versus travagem prévia (A). Importante dizer que acelerador neutro não significa não aplicar acelerador.
Imagem via shifting-gears.com
É extremamente importante nesta fase chamar a atenção de que fazer a curva a acelerar não significa ir de punho trancado, mas sim não estar a deixar a mota simplesmente rolar solta.
1% de acelerador, é efetivamente estar a acelerar, atingindo assim um dos grandes objetivos em competição, neutralizar os pontos neutros, ou seja, as alturas em que a mota não está a travar ou acelerar.
Com esta nota e a explicação de que em MX e SX não se trava em curva, outra técnica tem de ser aplicada para garantir a velocidade correta de entrada na curva sem alongar em demasia a zona de travagem.
A técnica a aplicar neste caso é então a de reduzir mudanças sem o uso da embraiagem antes de acionar os travões, maximizando a travagem do motor.
Ao puxarmos a embraiagem, seja por quanto tempo for, estamos a por a mota em neutro, o que em regimes extremos, como é o caso, promove a probabilidade de perda de tração do pneu quando este volta a estar em carga, seja por uma travagem ou aceleração.
Essa perda de tração pode resultar numa derrapagem o que iria aumentar o espaço de travagem por diminuir o poder da mesma.
Da igual forma, uma redução linear de velocidade por deslizar a embraiagem para se ser suave, irá também aumentar o espaço de travagem necessário.
Por ter várias nuances, esta técnica de travagem deve ser sempre praticada somente em reta até de se ter a mesma interiorizada, altura em podemos finalmente encadear a mesma com as curvas.
Imagem via dirtbiketest.com
Com isso em mente, a redução de mudanças sem embraiagem - algo que bem feito não têm qualquer problema para o motor - nunca põem a mota solta, e neste caso resulta num barulho muito semelhante ao da corrente a bater, tal como numa travagem extremamente eficaz e controlada.
A utilização destas técnicas deve não só ser treinada, mas igualmente, e á semelhança do que acontece em trail braking, ser utilizada com conhecimento não só dos pontos de entrada e saída da curva, mas igualmente do estado da pista durante toda a corrida.
O objetivo é sempre o mesmo, reduzir a nossa velocidade de forma a podermos fazer curvas da forma mais segura possível, e isso significa podermos ter de utilizar varias técnicas diferentes, adaptando-nos ao que a situação obriga, independentemente de possíveis ajudas eletrónicas das nossas motas.
Prova disso é que mesmo que em MX e SX exista a tendência de se fazer o total da travagem antes da curva, esses mesmos pilotos tem a adaptabilidade necessária para saber fazer trail brake com o travão da frente quando estamos a falar de curvas com regos, por exemplo.
Atletas de alto nível conseguem utilizar o travão da frente para controlar o angulo da mota para mante-la no rego.
Imagem via racerxonline.com
Da mesma forma, e como referido, travagens podem ser efetuadas utilizando uma imensa variedade de combinações entre os três travões, e todas elas com diferentes percentagens de aplicação divididas entre cada travão.
Essa divisão de poder de travagem dita o ajuste necessário a fazer á posição corporal base que devemos sempre adotar por defeito.
Assim, a nível lúdico ou amador torna-se importante aprender, compreender, e treinar as varias técnicas possíveis, tal como as suas variantes, para saber quando e como maximizar primeiro que tudo a nossa segurança.
A nível competitivo, temos de ao conhecimento adquirido pelo treino destas técnicas e variantes, conhecer bem as pistas onde estamos a correr, e ter um plano claro dos pontos de travagens para cada curva ou obstáculo, maximizando o nosso momento e consistência.
Por isso, se queres ser mais adaptável, tirar mais partido da tua mota, e ser mais rápido e seguro, investe em ti próprio e aprende a travar melhor.
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Já referi no passado que a nível pessoal e profissional invisto muito na minha formação continua.
Isso significa que estou constantemente a fazer cursos, a assistir a apresentações, conversas, entrevistas, a ler, a falar com outros instrutores, e a tentar manter-me a par das mais recentes e variadas técnicas.
No entanto, quando falo de técnicas não me refiro somente às de enduro, adv ou motocross.
Enduro, motocross, supercross, flat track, adventure, até estrada e pista fazem parte das minhas pesquisas e investimentos, pois acredito que ter conhecimentos de todas elas faz de mim não só um melhor instrutor, mas também um melhor condutor.
Se pensarmos em termos de MMA por exemplo, a razão para este investimento torna-se simples e fácil de compreender.
Vamos assumir uma curva.
Aprender técnicas diferentes permite uma melhor compreensão da nossa disciplina.
Imagem via adbmag.com
Todas as disciplinas que falei acima aplicam técnicas de curva baseadas no mesmo princípio, mas em moldes distintos e únicos entre si.
Se em motocross e supercross de um modo geral se tenta evitar a utilização de travões dentro de curvas, em estrada, pista e adv a utilização de trail braking e de levar a travagem pela curva dentro é um recurso mais consensual, por exemplo.
Da nossa parte, como utilizadores, compreendermos o porque e o porque não destas diferenças permite-nos alargar o nosso conhecimento, e com isso ter não só mais recursos à nossas disposição mas também sermos mais adaptáveis.
Adaptáveis ás alterações que o nosso desporto irá sofrer ao longo dos anos, tal como ás dificuldades do dia a dia da qualquer modalidade que tenhamos como preferencial.
Da mesma forma, aprender e misturar técnicas com o input pessoal de cada um é como novas técnicas aparecem, como o desporto evolui, e como limites que se pensavam inalcançáveis se tornam corriqueiros.
Valentino Rossi no seu Rancho a treinar limites de tração.
Imagem via todaysport.it
Prova disso são por exemplo pilotos como Márquez, Rossi, Dovizioso, Stoner, Miller e até o nosso Miguel Oliveira a serem multidisciplinares nos seus treinos com motocross, flat track, ou enduro.
É uma realidade que ao mais alto nível a possibilidade de se ser multidisciplinar pode ser complicada, seja por limitações contratuais impostas para tentar minimizar lesões desnecessárias, ou por calendários de treinos e corridas apertados.
Mas dito isso, é importante manter em mente que esta realidade se tende a cingir somente a alguns atletas de topo.
A larga maioria de nós, mesmo a nível profissional, não tem um contrato a dizer-nos o que podemos ou não fazer, por isso devemos utilizar este recurso na sua totalidade.
Da mesma maneira que multidisciplinaridade nos oferece diferentes lições técnicas sobre tração, equilíbrio, tática, posicionamento corporal e muito mais, também a encontramos presente como método de auto descoberta desportiva, e escape.
Falo em auto descoberta porque apesar de não ser comum, não é incomum um jovem atleta ou amante das duas rodas dar por si mais confortável numa disciplina que não é obrigatoriamente aquela com o trouxe para as motas.
E atenção que falo em conforto não só em termos técnicos, mas igualmente no que diz respeito a possíveis divergências entre o que se imaginou uma modalidade ser em conceito, e a realidade da mesma.
Existe uma grande diferença entre a vida dos pilotos de topo e dos demais profissionais e amadores nas mais diversas modalidades. Da mesma maneira, o ambiente, os fans, e até mesmos outros competidores mudam drasticamente entre modalidades.
Foto via motocross.it
Eu, por exemplo, apesar de nunca ter tido interesses competitivos babava-me a ver as R’s passar, e foi exatamente uma me permitiu fazer os meus primeiros milhares de km’s como recém encartado.
Mais tarde iniciei-me no mundo do ADV, rapidamente seguido pelo do dual-sport e demais disciplinas que tive e vou tendo o prazer de experimentar.
Sem esse percurso e experiencias nunca teria descoberto o tipo de terrenos que mais gosto e onde consigo mais naturalmente dar o meu melhor.
Se a nível lúdico essa descoberta pode muito bem ser feita ao longo de anos sem um impacto demasiado danoso, tal como aconteceu comigo, como atleta não é bem assim.
Usar anos a competir em enduro quando se poderia ser um talento natural em MX ou SX pode ser um problema, principalmente quando considerando o tempo de vida útil competitivo de um atleta profissional ao mais alto nível.
Com isso em mente, tirar partido cedo da multidisciplinaridade como forma de descobrir qual, ou quais as disciplinas em que poderemos ser naturalmente mais talentosos, e até mesmo aquelas que nos dão mais prazer, é algo que deve ser considerado.
Essa descoberta pode não só trazer claridade sobre qual a disciplina a seguir como pode abrir portas para te tornares um atleta profissionalmente multidisciplinar.
Casey Stoner, 2 vezes campeão do mundo de MotoGP começou na terra, tendo aos 14 anos ganho basicamente tudo o que podia ganhar em várias disciplinas diferentes de fora de estrada na Australia. Foto de Stoner com 18 anos a fazer a sua primeira vitoria pela KTM após assinar pelos Austríacos no final de 2003.
Foto via motograndprix.com e motogp.com
Os irmão Diogo e Rita Vieira, por exemplo, podem não só ser encontrados na linha de partida de Bajas, como também de campeonatos de Trial, Enduro e Super Enduro, e a retirar sólidos resultados em todos eles.
Outro exemplo, e talvez mais extremo, é Danilo Petrucci, que com duas vitorias a seu nome em MotoGP, e uma sólida carreira de pista, mostrou a sua clara multidisciplinaridade a não só completar o seu primeiro Dakar, mas igualmente a vencer uma etapa no seu ano de estreia.
Poderíamos igualmente falar de Billy Bolt, que após ter começado em motocross, e com anos de competição em Trial com uma carreira sólida, após a decisão de mudar de disciplina deu por si a subir aos mais altos patamares do Hard Enduro em menos de um ano.
Seja como amadores a prepararmo-nos para competição, ou profissionais a tentar atingir o topo, regimes de treinos e competições elevados rapidamente se tornam desgastantes.
Não interessa se fisica ou mentalmente, o desgaste do processo é claro, e encontrar escapes é essencial.
Passar tempo em família, jogar golfe, ou simplesmente ficar de papo para o ar são algumas das técnicas de descompressão utilizadas pelos melhores do mundo.
Ainda assim, não é incomum alguns deles afirmarem no final das suas carreiras que não querem mais nada a ver com motas, nem que seja por uns anos.
O desgaste competitivo, ainda que com escapes, fê-los perder o amor pelas duas rodas, ou pelo menos, pela rotina que acabou por se tornar o seu trabalho.
James Stewart, provavelmente um dos homens mais rápidos a alguma vez se sentar numa mota de motocross terminou a carreira a dizer que estava cansado dos treinos e da pressão de ter de ganhar, tendo perdido o amor por certas partes da sua carreira competitiva.
Foto via fr.motocrossmag.be
A utilização da multidisciplinaridade como escape, por outro lado, têm sido referenciada como uma excelente forma de manter em perspetiva a sua paixão por motas.
Um passeio com os amigos, ou uma simples volta sozinhos pode fazer a diferença, sendo uma excelente forma de manter presente a diferenciação entre motas como trabalho, e motas como prazer.
Manter presente esse prazer ajuda a prolongar carreiras, a por uma entrega diferente em treinos e competições, e a garantir que depois de termos trabalhado para tornar a nossa paixão o nosso ganha pão, não perdemos a paixão pelo caminho.
Por isso seja como escape, forma de aprenderes mais ou de encontrares o teu lugar no mundo das duas rodas, adiciona a palavra multidisciplinaridade ao teu léxico, e torna-te um melhor piloto por isso.
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A sobre utilização e pouca definição na utilização da palavra pode gerar problemas complicados de controlar, pelo que se torna importante saber como e quando o fazer.
Hoje vamos definir claramente o que é talento, como o identificar, e como o maximizar.
É normal e natural ouvir que este ou aquele piloto são talentosos, mas o que é que isso quer exatamente dizer?
Se formos ver, diz o dicionário que talento é uma aptidão natural, ou adquirida.
Tendo isso em conta, estamos a assumir que o piloto em questão é naturalmente bom, ou trabalhou para adquirir esse talento?
Essa distinção torna-se à cabeça importante de definir pois as implicações de uma e da outra são completamente distintas.
Se uma denota uma capacidade natural para algo, outra denota um talento especial na ética de trabalho.
E sim, digo talento na ética de trabalho porque de facto existem diferentes tipos de talento e compreender as suas diferenças é chave para os maximizar.
Existe talento em ser dedicado no treino físico.
Existe talento em ler linhas.
Existe talento em saber lidar com a pressão competitiva e mediática.
Existe talento no saber quando é altura de dar aquele bocadinho mais, ou tirar a mão do acelerador para se poder voltar à luta no dia seguinte.
Existe talento em saber quais são as nossas limitações e forças.
Por isso, antes de tudo, temos de nos tornar mais claros na nossa definição de talento para não criar confusões e saber ao que nos estamos a referir.
Se há situação recorrente no mundo do desporto são atletas tecnicamente talentosos que deram por si a conseguir somente alguns anos como profissionais de alto nível.
Há sempre quem fique surpreendido quando isso acontece, no entanto, se aplicarmos o conceito de que existem vários tipos de talento, rapidamente temos uma melhor compreensão do que pode ter acontecido.
Um campeão, ou qualquer outro profissional a competir ao mais alto nível é definido por vários pontos distintos que vão muito além da sua capacidade técnica natural.
Capacidade de trabalho, dedicação, preparação física, foco, genética, e tantas mais fatias completam o bolo necessário para se vingar como desportista.
Isto diz-nos claramente que talento técnico é somente um dos pontos a ter em conta, mas um que cria ilusões de grandeza.
À exceção da componente genética, nenhum ponto é impossível de trabalhar, no entanto, técnica é um dos que mais trabalho dá a levar até um nível elevado.
Com isso em mente, alguém que é tecnicamente dotado desde o inicio tende naturalmente a sobressair-se face aos demais atletas, mas se isso não for trabalhado de raiz, tende a levar o jovem atleta ao engano.
Engano de que esse talento natural vai ser o suficiente para se tornar o próximo campeão do mundo.
Essa ilusão é uma das principais razões pelas quais muitos atletas desaparecem e outros, claramente menos dotados tecnicamente, fazem excelentes carreiras profissionais.
Vamos assumir por exemplo um piloto que faz muitos pódios, é tecnicamente dotado, mas por o ser tende a não ser tão dedicado ao trabalho, cede facilmente à pressão competitiva quando não está a ganhar, e que tem dificuldade em seguir as regras da equipa e jogar limpo.
Do outro lado temos um piloto que faz menos pódios, é tecnicamente menos capaz, mas compensa essa falha com uma excelente ética de trabalho, é exímio a lidar com a pressão competitiva, e aceita que não é uma vedeta mas uma parte da equipa com quem trabalha.
Qual é que vocês acham que terá o futuro mais promissor, ou simplesmente, qual terá mais probabilidade de ter um sólido futuro profissional?
Consistência é primordial para se conseguir patrocínios, apoios, e mesmo a nível pessoal manter a confiança para continuar, e isso não passa obrigatoriamente por vencer todas as corridas.
Se se perguntar a um amante de MotoGP o nome de todos os pilotos que estiveram na linha de partida no ano passado, muitos irão começar a ter dificuldades assim que os nomes de topo forem enunciados, e pessoalmente não culpo ninguém por isso.
Afinal de contas, grandes nomes têm mais tempo de antena por isso é normal esquecer alguns menos citados.
No entanto, essa realidade torna-se enganadora quanto à qualidade de todo o pelotão.
Nunca nos podemos esquecer que mesmo os pilotos que sistematicamente terminam nos últimos lugares de cada GP, e não nos marcam a memória por serem menos falados continuam a ser dos 22 melhores do mundo.
Perspetiva é chave, e compreender que existem varias camadas na constituição de um campeão e de um excelente profissional é importante quando falamos em talento.
Entre outras, apresentar somente uma ou duas qualidades é uma das razões pelas quais muitas equipas e patrocinadores rapidamente fogem de talentos técnicos naturais ao verem as falhas que apresentam no resto.
Um dos grandes problemas de trabalhar e evoluir sem acesso a ajuda profissional quando se quer vingar em competição é exatamente a perda de perspetiva geral do que faz um bom piloto.
Aceitando que talento natural não chega, temos então de compreender o que é necessário.
Se um claro amor pelo que se faz, a ética de trabalho, e outros tantos pontos são essenciais para dedicar anos de compromisso ao desporto, eu diria que é igualmente primordial fomentar uma componente que ainda poucos trabalham.
Essa componente é a estabilidade emocional, que para mim deve estar na frente de qualquer treino, nem que seja pelo impacto que tem nas demais áreas.
Um atleta capaz de lidar tão bem com derrotas como com vitorias é um atleta que tende a ser seguro das suas capacidades.
Isso significa não culpar o tempo, a mota ou o vento que soprava de leste após perder uma corrida.
Lidar bem com derrotas permite aceitar o erro pessoal, e rapidamente poder analisar o que aconteceu para se conseguir aprender e fazer melhor da próxima vez.
Como bónus, acaba por se ter uma atitude mais positiva que faz do atleta menos um alvo a abater por parte do resto do pelotão durante qualquer corrida.
O nosso saudoso Paulo Gonçalves é um excelente exemplo de quem pela atitude humana com que via a competição fez dele um dos pilotos mais amados e aclamados da sua geração, dentro e fora da pista.
Não conseguir lidar com emoções e não respeitar os outros em pista leva a situações complicadas.
Imagem vim racerxonline.com
Um atleta emocionalmente forte têm mais capacidade de lidar com ansiedade e pressão, e isso permite um foco totalmente diferente quer em treinos quer em corridas.
Entre estes e outros benefícios que poderiam ser enunciados torna-se evidente porque devemos promover treino emocional, e como este ingrediente da receita que faz campões deve estar no plano de qualquer atleta.
Talento natural ajuda muito, capacidade de trabalho é crucial, e saber escolher as melhores linhas é quase como fazer batota, mas ter o talento emocional para lidar com o desporto como um todo faz a diferença entre conseguir evoluir até aos mais altos níveis, ou ficar pelo caminho.
Por isso garante que treinas mais do que técnica, que vez o teu lugar competitivo com perspetiva, e que garantes que a tua luta é primeiro contigo, e só depois com todos os outros que estão ao teu lado na grelha de partida.
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Faz um exercício, pergunta a qualquer amante de duas rodas porque é que anda de mota.
Provavelmente já o fizeste, ou até já to perguntaram a ti, e se esse é o caso, sabes que “pelo conforto incrível que é” está longe de ser a resposta mais dada.
Aliás, grande parte das modificações que fazemos ás nossas motas vêm de uma busca por conforto, e sim, em alguns casos modificações de performance podem ser consideradas conforto.
Eu pelo menos sinto-me muito mais confortável a saber que a minha suspensão não vai esgotar neste ou naquele buraco, que o meu motor vai puxar sem qualquer problema quando eu lhe pedir, ou que aqueles quilos que tirei à mota não me vão pesar o dia todo.
Esta procura incessante por conforto é importante, porque é na sua busca que muitas vezes acabamos numa má posição corporal, e isso implica para começar, uma má posição dos pés.
Eu gosto da analogia entre o corpo humano e uma árvore quando estou a explicar posição corporal.
Imagem da BN Endurocamp
Gosto de me referir à nossa cabeça e braços como os ramos da árvore, no sentido em que podem abanar e isso não desestabiliza a árvore.
Entre a nossa cintura e o nosso peito fica a parte superior do tronco de onde os ramos saem.
É forte, segura, mas capaz de ter alguma mobilidade.
As nossas pernas são a parte de baixo do tronco.
Muito forte, muito segura, e só têm a mobilidade mínima suficiente para que a parte superior do tronco possa ser móvel sem partir.
E por fim os pés, o ponto fulcral deste artigo e que na minha analogia de sala de aula fica com a tão importante tarefa de ser a raiz da nossa árvore.
A posição do pé esquerdo a sair para fora da mota é um erro técnico perigoso mas comum. Imagem via racerxonline.com
Imagem de BN EnduroCamp
Ao puxar o pé para trás na peseira e ao mante-lo encostado á mota estamos igualmente a alterar a forma como controlamos o veiculo, por nos permitirmos posicionar melhor o nosso corpo.
Uma excelente posição corporal com o pé mais puxado atrás na peseira, junto ao inicio dos dedos, a biqueira encostada ao quadro, e o joelho encostado a mota. Foto via racerxonline.com
Já falamos no passado sobre como pequenos ajustes fazem grandes alterações em termos de posição corporal, e sobre como saber como o nosso corpo se mexe é um recurso imenso.
Aqui, e em relação à posição dos pés, acontece exatamente o mesmo.
A rotação do pé aliada a um agachamento, força ou não os joelhos automaticamente para dentro, ou para fora.
Experimenta fazer o seguinte exercício; põem-te de pé, com os pés sensivelmente á distancia dos ombros, roda os pés para fora, e faz um ligeiro agachamento.
Agora, tenta fechar os joelhos enquanto estás em posição agachada.
Tenta agora repetir o mesmo exercício com os pés paralelos, seguido do mesmo exercício com os pés virados ligeiramente para dentro.
Não quero que alteres nada mais a não ser a posição dos pés entre cada tentativa.
Imagem de BN EnduroCamp
Como deves ter reparado, ao rodar ligeiramente os pés para dentro, assim que inicias o agachamento os teus joelhos fecham automaticamente.
Este automatismo garante um contacto constante e quase sem esforço entre os joelhos e a mota, posição que promove o controlo da mesma.
Tal como falamos no passado em rodar a mão de forma a garantir uma posição automática do cotovelo, ao rodar o pé temos uma posição automática do joelho, algo que promove largamente segurança e controlo da mota.
No entanto, esse controlo ganho em reta perde-se se aplicamos uma máxima popular que diz que para curvar devemos tirar o pé de fora, uma manobra que se pode tornar rapidamente perigosa.
O pé de dentro a ficar preso leva o corpo para uma péssima e perigosa posição corporal. Grande risco de queda e de lesão no joelho. Autor da foto desconhecido
Como deves ter reparado na primeira tentativa de agachamento com os pés virados para fora, foi basicamente impossível encostar os joelhos, e para quem o conseguio fazer, o esforço físico necessário será impossível de manter de uma forma constante.
Com isso em mente, se tivermos ambos os pés virados para fora, e um deles fora da peseira, torna-se virtualmente impossível manter algum tipo de contacto dos joelhos com a mota sem um imenso e impossível de manter esforço físico.
Com ambos os pés a apontar para fora e o de dentro fora da mota, o esforço físico para manter pressão dos joelhos na mota é incomportável a longo prazo. Imagem via dirtbikeplanet.com
Pé de dentro alto, à altura do guarda lamas, e ligeiramente virado para dentro para promover contacto do joelho com a mota. Pé de fora encostado e rodado para a mota para promover contacto do joelho com a mota. Marvin Muskin via Redbull.com
Curva feita em pé de forma a aumentar o controlo no rego sem necessidade de tirar os pés da peseira. Ken Roczen via swapmotolive.com
Ninguém questiona que suspensões com 310mm de curso são qualquer coisa do outro mundo, no entanto, quando estamos a falar de competição, um milímetro faz a diferença.
Ao utilizamos a frente do nosso pé na peseira para controlar melhor a mota e aumentar a nossa segurança, estamos igualmente a ganhar tempo, e suspensão extra.
Quanto ao tempo, esse refere-se aos milésimos de segundo necessários para passar da posição de sentado para a posição de pé.
Experimenta pôr-te em pé e tentar saltar ou correr utilizando os teus calcanhares.
O corpo vai cair para trás ou perder o balanço, e o resultado final vai ser pouco eficaz.
Agora tenta saltar ou correr utilizando a zona mais frontal do pé.
Não só o resultado vai ser perfeito, mas todo o teu corpo vai ficar alinhado numa posição de ataque correta para o exercício que estás a executar.
Isto acontece porque utilizando a frente do pé estamos a tirar o máximo partido da nossa biomecânica e a utilizar o corpo como uma mola.
Isso significa que ao utilizar o mesmo principio na peseira vamos conseguir ser mais fluidos, mais controlados, e mais rápidos a mudar de posição, tal como a meter peso em cada peseira individualmente sempre que quisermos.
Estamos a ganhar milésimos de segundo neste movimento?
Sim, mas um milésimo por cada vez que transitamos de sentado para em pé e vice versa ao longo de uma prova, são muitos segundos acumulados à altura de passar a bandeira de xadrez.
Um ponto a ter em mente quando o objetivo é ganhar.
Jett Lawrence com uma excelente posição corporal e o pé claramente chegado para trás na peseira de forma a promover a mola natural do corpo. Imagem via mxvice.com
Esta utilização correta da biomecânica aliada ao efeito de mola que ganhamos torna o conceito de suspensão extra relativamente simples de compreender.
Se no nosso calcanhar não conseguimos saltar por não ser possível fazer mola, isso significa que qualquer impacto da mota transferido pela peseira vai passar diretamente para o nosso corpo.
Isso vai criar um desgaste prematuro e constante do esqueleto e musculatura, tal como forçar o corpo a querer saltar da peseira em impactos maiores.
Ao apoiarmo-nos na biqueira, qualquer impacto transferido pela peseira vai primeiro ter de passar pela mola criada pela posição do pé, permitindo ao calcanhar subir e descer criando efetivamente um ponto de suspensão no corpo.
Se o teu pé apoiado pela biqueira na peseira te permitir 50mm de amplitude de movimento para cima e para baixo, por exemplo, então agora estás a trabalhar com 50mm extra de curso totalmente gratuitos.
Proponho que vejas o vídeo seguinte duas vezes.
Na primeira, quero que olhes para os pés do piloto e que te foques no quanto o calcanhar dele sobe e desce em relação à linha da peseira.
Vê também a posição da ponta dos pés ligeiramente virada para dentro da mota promovendo pressão automática dos joelhos, e como apesar dessa pressão, a mota mantém liberdade suficiente para trabalhar debaixo dele.
Na segunda visualização olha para a cabeça do piloto, e como ela não mexe mantendo-se nivelada durante todo o set de whoops.
Isto só é possível por todos os impactos estarem a ser absorvidos primeiro que tudo pela mola criada pela posição dos pés.
Tempo extra, suspensão extra, mais segurança e mais controlo são benefícios que qualquer utilizador deseja, mas não são os únicos benefícios de uma boa posição de pés.
Como falamos no inicio deste artigo, o corpo em cima da mota pode ser comparado a uma árvore, por isso, a utilização correta dos pés vai além de tudo o que foi discutido ser também o primeiro passo para uma boa posição corporal completa.
É totalmente impossível um piloto conseguir fazer bem um set de whoops como o do vídeo somente por ter uma boa posição de pés, da mesma maneira que é igualmente impossível faze-lo tão bem com eles mal posicionados.
O corpo funciona como um todo, por isso mesmo que estejamos aqui somente a falar de uma parte especifica, é importante manter em mente que tudo no corpo funciona como um e não como partes independentes.
Isso obriga-nos igualmente a estar cientes que aprender, e ainda pior, reaprender técnica é difícil, é moroso, e é extremamente trabalhoso não só a nível corporal mas igualmente a nível cerebral.
Isso é a razão pela qual ao aprender técnicas como as que estamos aqui a discutir não ser incomum a primeira sensação ser de total desconforto e de que estamos mal posicionados, e isso é um trabalho mental.
Um trabalho mental que vai do querer aprender, ao processo de transição, até atingirmos a cimentação do conhecimento adquirido.
Essa sensação tende a tornar-se ainda mais evidente ao adaptar este tipo de técnicas a motas maiores como ADV's, que pela forma como são construídas impõem limitações na aplicação técnica ainda que mantendo os mesmos princípios.
Isso significa que vai demorar umas horas, um dia, uma semana, um mês, ou um ano para garantir uma aplicação confortável da técnica?
Não sei, e estaria a mentir ao tentar dar uma resposta.
Varia de pessoa para pessoa, se estás a treinar sozinho ou com um instrutor profissional, o tempo e dedicação que dás aos teus treinos, e mais mil variaveis que é impossível quantificar.
O que posso afirmar é que aprender técnicas como estas vale o esforço físico, mental e financeiro, seja a nível lúdico, amador ou profissional.
É igualmente importante manter em mente que aprender estas técnicas não significa que as tenhas de aplicar sempre que te sentas na mota.
Dias são dias, e cada um têm a sua realidade, mas saber como tirar o máximo partido da mota, e o porque de cada técnica dá-te a possibilidade de fazeres as tuas próprias escolhas.
Se já investiste na mota porque queres andar, investe agora em ti de forma a tirares mais partido do teu investimento inicial e escolheres o que melhor se adapta a ti e ás tuas necessidades.
Pequenas mudanças têm grandes impactos, e podemos dizer que tudo começa na raiz.
Há certos marcos na vida de qualquer motociclista que são rapidamente atingidos.
A primeira vez que se deixa a mota ir abaixo, a primeira vez que se anda sem equipamento porque “é já ali”, a primeira queda fora-de-estrada, e a primeira vez que alguém nos diz que o que precisamos é de mais velocidade para superar esta ou aquela dificuldade.
Passo a passo, o bingo do iniciante rapidamente se preenche, e com ele, começam a ficar marcados na memória alguns erros de linguagem e perceção.
Não há dúvida que alguma velocidade resolve muitos problemas fora-de-estrada, tantos que arriscaria a dizer que quase que é maquilhagem para erros técnicos.
Isto porque num mundo em que a larga maioria das marcas, quer o diga ou não, aposta forte em motas de venda ao público derivadas diretamente de versões de competição, não é complicado compreender que a passo de corrida a mota tende a parecer mais fácil.
Imagem via adbmag.com.au
Buracos parecem desaparecer, areia torna-se pouco mais do que pó debaixo das rodas, saltos têm aterragens suaves, e curvas parecem ter tração mesmo nos pisos mais soltos.
Esse resultado empírico associado á ideia de que o que é preciso é velocidade parecem ter correlação, e ai começam os problemas, pois a velocidade não é o ponto fulcral.
Com isso em mente, temos de compreender qual é, pois só entendendo o que é que a velocidade está a fazer a podemos utilizar a nosso favor e não como ilusão de controlo.
A falha desta compreensão é a razão pela qual regularmente se vê nas mais variadas pistas e trilhos, pilotos a tentarem ser rápidos mas na realidade a conduzir no que se pode somente definir como o ”limiar continuo de um acidente”.
Imagem via themotocrosslife.com
Na realidade, quando o relógio começa a contar, essa abordagem não é de forma alguma a melhor quando comparada com os tempos de um piloto regularmente consistente e em controlo.
Então porque é que a sensação de velocidade e o som dos motores a gritar não significa ser efetivamente mais rápido e seguro?
Existem duas “posições de potência” em cima de uma mota; a acelerar, e a travar.
Poder-se-ia dizer que desembraiado e a “deixar ir” também é possível, porque fisicamente, é, no entanto, é um erro em muitas situações e dificilmente poderá ser considerada uma posição de potência, pelo menos em moldes competitivos.
De uma forma muito simplificada, ao travar, estamos efetivamente a deslocar peso para a frente, o que se traduz em carga no pneu da frente.
Ao acelerar, estamos a deslocar peso para o pneu de trás, o que se tudo correr bem se traduz em tração, o que nos propulsiona para a frente.
Sendo que o nosso trabalho em cima da mota como pilotos é equilibrar essas duas situações de forma a mantermos a mota o mais estável possível durante o processo, assumir que acelerar é sempre a melhor solução é à partida um erro, pois aposta numa clara destabilização do veiculo.
Afinal de contas, andar em cavalo não é de forma alguma a maneira mais rápida de conduzir uma mota.
Pode ser a mais exuberante, mas garantidamente não é a mais rápida.
Dito isto, temos ainda o que eu chamaria de cálculos de corrida.
Vamos assumir como exemplo um salto em pista de mx ou sx.
Saber a velocidade a que precisamos de atacar o salto para que não seja curto nem demasiado longo, é calculável.
Imagem BN Endurocamp
Isto exemplifica bem como utilizar a máxima de “em caso de dúvida acelera” pode borrar a maquilhagem.
Neste caso, pode não só garantir que aterremos fora da zona desejada, como forçar a aplicação de técnicas demasiado avançadas para muitos para salvar a situação.
Utilizámos o exemplo de um salto em pista, mas uma aceleradela brusca sem posição técnica para tentar passar um buraco ou tronco num trilho pode de igual forma significar perder tração ou bater de frente contra o obstáculo em vez de o transpor.
Isto significa que em vez de nos focarmos na velocidade nos devemos focar antes num conceito físico mais complexo, o momento.
Momento esse que na prática é gerido por nós através de uma boa aplicação técnica conjunta e sequencial das nossas duas posições de potência.
Falámos no passado de como preparar o nosso corpo para facilitar a entrada no estado de flow, aquele estado em que tudo corre bem e em que a mota flui de um lado para o outro.
É importante agora entender como preparar a mota para esse estado, já que a condução deve ser vista como uma dança entre o piloto e a mota.
Ainda que ambos necessitem de ter o seu grau de liberdade, se não houver sintonia, alguém vai acabar com os pés pisados ou com o rabo no chão.
Imagem via MX Factory
Com essa analogia em mente, devemos, tal como a dançar, dar algum pré-aviso á nossa parceira do que irá acontecer, sendo pró-ativos nos movimentos técnicos, e não reativos.
Sendo consistentes e lineares nas nossas travagens e acelerações, conseguimos fazer com que as reações da nossa mota sejam mais previsíveis e os seus movimentos encadeados, atitude que aumenta a nossa consistência e segurança.
É importante nesta fase relembrar que o acelerador não é um botão de on e off, pelo que um por cento de acelerador é por definição estar a acelerar, um conceito importante de ter em mente pelos fans de andar desembraiado.
Desta forma, e sabendo já à cabeça que acelerar em caso de dúvida não é o recurso a usar, utilizar momento é a palavra e técnica correta.
No entanto, momento e velocidade ficam muitas vezes confundidas no léxico comum, e isso é algo que devemos corrigir.
Podemos de uma forma geral e simplificada definir velocidade como uma distância percorrida num determinado espaço de tempo.
Definimos então momento como uma massa - o que significa o peso da mota e do piloto - multiplicada por uma determinada velocidade.
De uma forma extremamente simplificada, podemos considerar o momento como a quantidade de movimento numa determinada direção, ou inércia em movimento, se preferirem.
Dito isto, até com o motor desligado continuamos a ter momento, o que não temos é um momento constante, uma vez que provavelmente nos encontraremos a perder velocidade.
Compreendendo o peso da nossa mota e como ele se mexe, começamos a compreender como o poder mexer num determinado espaço, começando a compreender o conceito de massa em movimento em termos práticos.
O objetivo quando estamos na mota e queremos ser consistentemente rápidos?
Tentar manter o nosso momento o mais constante possível.
Faz um exercício e tenta ouvir uma corrida de SX de 450cc.
E sim, ouvir, não ver.
De uma forma geral aquelas motas quase não aceleram a fundo, ficando-se por pouco mais do que acelerar o suficiente para obter o momento necessário para passar esta ou aquela dificuldade.
Ir a 100km/h numa reta, travar a fundo fazer uma curva a 5km/h, e voltar a acelerar o máximo possível até á próxima travagem a fundo torna-se mais lento do que fazer tudo a 60km/h, por exemplo.
No mesmo conceito, é fisicamente incrivelmente mais desgastante tentar manter a primeira opção durante vinte ou trinta minutos seguidos do que a segunda.
Isto diz-nos que motores a gritar e tentar ser super agressivo sem um plano de jogo coerente vai ser mais lento e mais cansativo do que ser consistente e controlado.
Assim sendo, quanto melhor fores tecnicamente, mais velocidade vais conseguir imprimir durante todo o percurso, ou melhor, mais momento irás conseguir manter.
Imagem via blog.wiseco.com
A física por detrás de todos estes conceitos é mais complexa do que o explicado aqui, e muito mais conceitos como tração, suspensões e até mesmo geometria das motas poderiam ser discutidos para fazer jus a um tópico tão complexo.
No que toca á física em si, quem tiver interesse em compreender melhor momento, inércia, velocidade, aceleração e outros tantos conceitos vai-se deparar com o mundo que dita as leis de como as nossas motas se movem.
Uma leitura interessante, mas não obrigatória para quem quer tirar mais da sua mota.
Dito isto, e uma vez que a ideia deste artigo não é ser uma aula de física, mantenham simplesmente em mente que a utilização de mais velocidade para ultrapassar dificuldades ou ganhar tempo em nada substitui técnica pura.
Tudo o que estás a fazer ao “dar gás” para conseguir passar algo, é tratares-te como uma bola de demolição na esperança de que o que quer que seja que queres passar não te vai abrandar o suficiente para te fazer parar.
Isso é extremamente perigoso e demonstra total desconhecimento do que estás a fazer em cima da mota.
Assim sendo, não utilizes velocidade como uma forma de melhorar técnica.
Melhora a tua técnica por reduzires a tua velocidade e compreenderes bem o peso da tua mota e como ele se movimenta.
Melhorares a tua capacidade de seres mais consistente com os teus movimentos vai melhorar o teu controlo de momento, e isso vai significar mais segurança e uma capacidade maior de imprimires mais velocidade geral e conseguires superar mais dificuldades na pista ou nos trilhos.
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Isso significa que as técnicas de há 20 anos não são iguais às de hoje, e estarmos conhecedores dessas diferenças vai-nos ajudar a maximizar a nossa performance.
Neste artigo, vamos falar de como devemos adaptarmo-nos aos tempos, tal como a nossa forma de pensar se queremos tirar o máximo partido das nossas motas e aumentar a nossa segurança.
Eu sei que esta visão pode parecer meio romântica, mas eu sou um apaixonado por motas, e isso traduz-se no que faço como instrutor, e no que escrevo.
Ainda assim, e romantismos à parte, a analogia funciona, porque a evolução da técnica é uma clara adaptação da mesma ao seu meio ambiente e aos tempos, à semelhança do que acontece na natureza.
Isto diz-nos que apesar de as motas serem uma evolução das bicicletas, paralelismos entre andar mota e andar a cavalo existem, assumindo, claro está, os cavalos como o antecessor da bicicleta.
Ainda que o cavalo tenha força motriz “ás duas rodas”, algo que à parte de algumas motas não é a norma, no restante as similaridades em traços gerais estão lá.
Comparativo de imagens via blog.54ka.org & gatedrop.com
Para todos os efeitos, em ambos os casos estamos sentados no centro do “veiculo”, com necessidade de nos prendermos pelas pernas para não cair, relaxar os braços para ter mobilidade, e manter as costas direitas com a anca numa posição de separação para ter controlo.
Esta similaridade entre o conceito básico de equitação e de condução fora-de-estrada é claro.
Onde começa a divergir é na óbvia diferença dos veículos, e no nosso caso, das motas, na imensa evolução que as mesmas sofreram desde a sua conceção.
Um claro exemplo de adaptação a essa evolução é Valentino Rossi, que desde o início da sua carreira até ao seu fim alterou a sua técnica de forma a poder acompanhar a evolução das suas motas.
Valentino Rossi via redbull.com
Essa alteração foi de tal modo que chegou mesmo a implementar uma nova técnica, que ficou conhecida como o Doctor Dangle, aplicada hoje em dia por todos os pilotos de MotoGP.
Para nós, no fora-de-estrada, podemos comparar, por exemplo, as técnicas do passado, como as aplicadas por Roger de Coster, cinco vezes campeão do mundo de motocross durante os anos 70, e hoje diretor Desportivo da KTM e Husqvarna USA, com o Chase Sexton, para mim o piloto com a melhor técnica da atualidade.
Roger de Coster e Chase Sexton via motocrossactionmag.com
Ao fazê-lo, vamos encontrar maioritariamente diferenças de pormenor e abordagem, porque de modo geral mantém-se baseadas nos mesmos princípios, pois nem o corpo humano, nem as motas mudaram a sua essência.
No entanto, são as similaridades que levam muitos ao engano de que poderão estar a aplicar as melhores técnicas, ao facilmente desvalorizarem os pequenos contrastes entre o passado e o presente.
Ainda assim, essas diferenças têm um grande impacto, o que significa que para nós como pilotos profissionais ou de fim de semana, aplicarmos as técnicas mais recentes vai drasticamente alterar a nossa performance e segurança.
Como instrutor sou um geek de técnica e posição corporal, como já devem ter entendido.
Conheço muitos que não são, e isso não é obrigatoriamente errado, são simplesmente abordagens diferentes.
Ainda assim, eu sou, e como tal, regularmente ouço a crítica de que a minha forma de ver e falar de técnica é muito bonita, mas na têm pouca aplicação prática.
Argumentam que assim que o terreno se dificulta, ou que o pelotão lhes começa a morder os calcanhares, ninguém consegue aplicar o que estamos a treinar.
Essa visão remete para uma ideia de técnica teórica e técnica prática, no entanto, isso não existe.
Técnica é técnica, e a sua aplicação é factual.
Ou a estamos a aplicar, ou não estamos, não existindo uma diferenciação entre teoria e prática.
Via promotocross.com
O que se altera então, é a capacidade de aceitação do erro, um conceito muito diferente.
É normal pilotos profissionais ao mais alto nível fazerem dezenas de pequenos erros por prova.
Onde eles se destacam de nós comuns mortais, é na capacidade de aceitar que cometeram um erro, e o mais rapidamente possível voltarem a aplicar a sua melhor técnica.
Quantas vezes já cometeste um erro e ficastes horas a pensar nele?
Todos o fazemos.
Quem nunca chegou à típica paragem para visitar as traseiras do pinheiro mais próximo e imediatamente começou a relatar todas as vezes em que “quase me matei” no percurso até ali?
Essa memória presente significa que parte do nosso foco ficou nesses erros, e não em estar a tentar aplicar aquilo a que muitos erradamente chamam de técnica teórica.
Da mesma maneira que a mota vai para onde estamos a olhar, de certa forma o nosso foco segue o que estamos a pensar.
Ao ficarmos focados num incidente ou susto, vamos automaticamente fazer o replay do mesmo na nossa cabeça, focando a nossa atenção na solução de um evento passado sobre o qual não temos mais controlo.
Não quero que me interpretem mal, é importantíssimo rever o que fizemos de forma a encontrar soluções para não repetirmos o mesmo erro, mas não na altura.
James Stewart com erros técnicos de curva via livemotocross.com
Eu pelo menos garantidamente não quero que um cirurgião fique a pensar que devia ter feito uma incisão de 4cms e não de 5 enquanto têm um bisturi dentro de mim, quero-o focado no que está a fazer.
Na mota, de igual forma, vivemos no momento e tentamos de alguma forma preparar o futuro, mas nunca devemos viver no passado.
Essa preparação futura vem de uma correta posição técnica para o movimento, algo que falaremos noutro artigo, e de uma correta forma de pensar quando estamos sentados na mota.
Isso significa que devemos sempre treinar para ser o mais tecnicamente perfeitos possível, mas aceitar o facto de que iremos cometer erros na aplicação dessa técnica.
Via off.whip.live
Permite-te errar, e isso vai-te permitir mais rapidamente voltares a aplicar a tua melhor técnica para estares sempre em controlo, e não a correr atrás do prejuízo do erro progressivo que a falta de foco irá desencadear.
Errar é humano, e ao aceitares isso, vais-te tornar cada vez mais rápido, consistente e seguro.
Parte da aceitação do erro é aceitar que a nossa técnica precisa de trabalho constante.
Não existe ninguém neste planeta que seja sempre tecnicamente perfeito, com uma considerável percentagem dos utilizadores de duas-rodas fora-de-estrada a ficarem muito aquém dos mínimos olímpicos.
Não digo isto por ser instrutor e querer vender aulas a toda a gente, por mim, podem escolher aprender comigo, com qualquer outra escola, ou com acesso aos inúmeros recursos disponíveis online.
Digo-o por ser verdade, e querer que estejam mais seguros e sejam mais capazes de tirar partido do investimento que já fizeram na mota.
Eu próprio como instrutor invisto muito tempo e dinheiro na minha formação continua para me manter a par dos tempos.
Se isso não chega, basta-nos ver pilotos profissionais, que ao mais alto nível trabalham incessantemente técnica para conseguirem aplica-la do modo mais automático possível.
Se eles, que já a dominam melhor do que ninguém procuram ajuda de treinadores e instrutores de técnica como eu para os acompanhar, será narcisista achar que sabemos melhor.
Via motoxschmiede.de
Isto porque eles sabem que uma ligeira alteração na posição da anca, dita a diferença entre ter controlo ou não sobre a roda de trás.
Ou porque sabem que a alteração da posição do pé, muda o tempo que vão demorar a alternar entre estar sentados e em pé, tal como a energia que vão despender para prender os joelhos á mota.
Agora se muitos acham que esse nível de pormenor poderá ser excessivo para um piloto amador ou guerreiro de fim de semana, é importante vermos que motas estamos a usar.
Quando marcas são claras no seu marketing ao dizer que os seus veículos são ready to race, então nós, como compradores, também o devemos ser, até certo ponto.
Estou longe de acreditar que temos todos de ser atletas profissionais para nos divertirmos em segurança numa mota, mas devemos todos pelo menos ter as bases teóricas e práticas das técnicas que os melhores usam.
Afinal, as motas que hoje usamos são mais capazes do que muitas que venceram campeonatos no passado, e já nessa altura os melhores do mundo treinavam para tirar o máximo partido delas.
Além disso, e como discutido, a técnica está viva, porque evolui, pelo que o que é certo hoje, poderá não ser o mais correto amanha.
Via electricwhip.com
Essa realidade fica ainda mais espelhada com as claras diferenças de técnica entre motas a combustão e elétricas, motas essas que cada vez mais fazem parte da nossa realidade.
Por isso permite-te errar, permite-te a humildade de aceitar que aprender não ocupa lugar e nunca deverá parar, e depois, dotado da melhor e mais atual informação, aplica-a à tua realidade.
Vais ser mais rápido, mais consistente, mais seguro, e vais-te divertir muito mais cada vez que te sentares na mota.
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Normalmente os meus artigos são baseados em factos, ciência, estudos, e todo e qualquer dado que eu possa utilizar de forma a suportar uma explicação.
Hoje não será assim, pois o problema com este tópico é exactamente uma grande falta de dados.
Mas antes de me adiantar, o que quero chamar a atenção é que este artigo não deverá ser visto como tal, mas sim como uma peça de opinião, a minha modesta opinião sobre neck braces.
Como instrutor e como pessoa não sou fã de falar do que não sei.
É relativamente fácil numa conversa comigo, seja a nível pessoal ou profissional ouvir-me dizer que “não tenho dados suficientes para falar sobre isso”, algo que me parece mais justo do que tentar fazer uma teoria na altura para parecer culto sobre este ou aquele tópico.
Ainda assim, teorias são uma parte fundamental de qualquer processo científico.
É com base em teorias que se procuram respostas e que se chegam a conclusões.
Conclusões essas que para serem validadas têm, ou no mínimo devem ser revistas e aprovadas pela comunidade científica.
Imagem de scienceimproved.com
Por isso, apesar de não ter dados suficientes para ser factual sobre o tópico de hoje, tenho os suficientes para criar uma teoria, e é isso que quero partilhar com vocês.
Uma teoria que espero que vos motive a procurar mais respostas por vocês próprios, de forma a poderem ter também vocês uma opinião mais formada neste ponto de discórdia entre muitos amantes das duas rodas, usar ou não neck brace.
E digo terem uma opinião formada, pois como instrutor, e principalmente sem todos os factos, nunca direi seja a quem for para não usar isto ou aquilo em relação a qualquer coisa que tenha a ver com segurança, e mesmo que o dissesse, valeria de pouco.
Em cima da mota quem está és tu, não é mais ninguém, pelo que toda e qualquer decisão tomada é tua e só tua.
Imagem BN EnduroCamp
Isso significa que o resto é barulho ou neste caso teorias, e que tu és o primeiro e o último responsável pelo que fazes, e obviamente, pela tua segurança sempre que passas a perna por cima de uma mota.
Por mais que procure e peça a quem discorda de mim para me mostrar, não tive até hoje acesso a estudos sólidos sobre neck braces.
Digo estudos sólidos não por não existirem estudos, que os há, mas por trazerem pouca claridade de respostas para a mesa.
Se alguns deles vêm directamente de fabricantes de neck braces, o que no mínimo remete para algum tipo de conflito de interesses, outros são meramente laboratoriais, ou não exaustivamente focados em correlações de hipóteses práticas.
Imagem de pictures.topspeed.com
Ficam em falta estudos com números elevados de participantes, utilizando vários tipos diferentes de neck braces, e com a correlação entre os danos corporais sofridos e o nível de protecção dos diferentes braces.
Dados que para mim seriam cruciais para entender se usar braces protege mais ou menos, e entre eles, que tipo de brace escolher.
Ainda assim, aconselho uma leitura pelos seguintes estudos:
• https://ibrc.osu.edu/wp-content/uploads/2015/05/Abstract_2016_Sathyanarayan.pdf
• https://www.researchgate.net/publication/304101101_Finite_Element_Simulation_of_Neck_Brace_Protective_Equipment_for_Motorcycle_Riders
• https://leatt-cms-image.s3.amazonaws.com/2.3.4+White+Paper.pdf
• https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4617221/
Quando comparados com outros estudos científicos, estes pecam pela simplicidade de análise de dados, faltar de revisão por parte da comunidade científica, e para mim, dados importantes, mas são os que encontro, e portanto, os que partilho.
Sempre gostei muito desta expressão; tapar a cabeça para destapar os pés.
Não implica que a opção de tapar uma parte do corpo ou outra é inerentemente errada, mas aponta claramente para uma escolha, e que essa escolha têm consequências.
O meu grande problema com neck braces é o serem vendidos como um equipamento de segurança quase livre de consequências, o que arriscaria dizer, claramente não é, nem em termos de protecção, nem de condução.
Temos portanto de começar por entender o que estamos a tentar proteger.
Neck braces não são como as protecções dos nossos casacos, calças, armaduras ou capacetes, que têm por base directivas europeias ou internacionais que definem claramente os níveis de energia que têm de ser absorvidos ao impacto.
Essas definições, reconhecidas como nível 1 e nível 2, ditam valores entre os 9kN e os 24kN, algo que tanto quanto eu tenho conhecimento, não têm aplicação em neck braces.
Isto é porque neck-braces não são desenhados para absorver energia, mas sim para impedir certas posições da cabeça.
Isto significa que qualquer energia de um impacto vai ser transmitida para onde o brace assenta no corpo, o que dependendo do modelo pode ser as clavículas, esterno, omoplatas, e até mesmo a própria coluna.
Imagem de top10focus.com que demonstra um brace a assentar na coluna atrás, e no esterno e costelas na frente.
Isso significa que existe aqui uma escolha, proteger um lado, ou proteger o outro, porque como a energia tem de ir para algum lado, algo no corpo se vai partir, magoar, ou de alguma forma danificar.
Considerando que nunca ninguém, incluindo fabricantes, diz que neck braces eliminam a 100% lesões, este ponto é relativamente claro, mas ainda assim importante de relembrar.
Agora como não há estudos inequívocos, é difícil saber exactamente qual o risco de partir as “opções” versos partir a zona que está a ser protegida pelo brace, mesmo dentro da própria coluna.
Usando como exemplo a imagem acima, para proteger a cervical, ou seja, entre a C1 e C7, temos uma protuberância do brace que assenta sensivelmente na zona da T6 e T7.
Isto diz-nos que numa queda em que a cabeça seja projectada para trás, a energia do impacto será projectada na zona da coluna onde a parte final do brace assenta, designada como zona torácica da coluna vertebral.
Imagem de massagesupplies.com
Danos na zona torácica da coluna podem limitar a mobilidade do corpo, e são danos que sem estudos claros e focados, é impossível saber qual a probabilidade de existirem ao cair com um brace semelhante ao da imagem mostrada.
Outro teste que gostaria de ver feito e que nenhum estudo parece destacar, é a flexibilidade natural da cabeça.
Algo “braced”, ou “engessado” para todos os efeitos, é algo que não têm mobilidade, ou a têm altamente reduzida.
Isto significa que em caso de queda se torna impossível fechar o corpo e enrolar, uma técnica de queda aplicada em muitos desportos, incluindo nas duas-rodas.
Ao utilizar o neck brace estamos a fazer com que a nossa cabeça esteja permanentemente em posição de aríete, ainda que com uns mais do que com outros, tornando esta manobra impossível de ser efetuada.
Imagem de rideonmagazine.com.au
Isso traz para a mesa outra pergunta; qual a percentagem de danos causados pela utilização do neck brace versos os danos sem o mesmo, mas utilizando técnicas de proteção para o mesmo tipo de impactos.
Bem sei que quedas acontecem a uma velocidade imensa, e que nem sempre será possível aplicar técnicas defensivas, mas, por exemplo em MotoGP, é comum ver pilotos a aplica-las.
Os novos airbags também utilizados em MotoGP, quando insuflados tendem a levar a cabeça e tronco do piloto para uma posição mais fechada, algo fetal, dando credibilidade à teoria de que enrolar o corpo promove proteção em queda.
Sem dúvida que todas estas perguntas e muitas mais não são de resposta fácil, nem de simulação simples em laboratório, ou de aferição direta em acidentes reais, mas para mim, como potencial utilizador, são as que seriam necessárias.
Com ou sem neck-brace, muitos pilotos, de profissionais até guerreiros de fim de semana têm uma posição corporal em cima da mota de uma forma ou de outra incorreta.
Se uns é por desconhecimento, outros é por escolha própria ou falta de preparação física para a manter durante longas tiradas.
Até aqui, apesar de pessoalmente gostar de ver essa realidade alterada, não há nada de surpreendente ou necessariamente de novo.
O que é assustador é que principalmente em posições de ataque agressivas com o neck brace metido, é totalmente impossível levantar a cabeça o suficiente para ver o caminho sem ficar numa péssima posição corporal.
Isto acontece porque o brace pára o movimento da cabeça para trás, limitando a visão a pouco mais do que uns metros acima e em frente do guarda lamas.
Essa situação força o corpo a chegar-se para a frente, deixando-o mais vertical de forma a se recuperar a visão do que está à nossa frente.
Isso leva muitos a erradamente acreditar que essa posição é de facto a correta.
Na realidade a posição com o brace torna-se incorreta por várias razões além da explicada, mas fazendo um lado a lado fica facilmente demonstrada a diferença entre uma má e uma boa posição de ataque.
Imagem BN EnduroCamp com base numa aula do Ryan Hughes
Isso significa que ao usares o neck brace em pé vais obrigatoriamente estar numa má posição, o que aumenta à cabeça o risco de queda.
Havendo uma queda, podes ou não estar efetivamente mais protegido quando isso acontecer.
Por outro lado, podemos diminuir o risco de queda por não usar o brace e efetivamente ver para onde se está a ir, tal como o fazer de uma posição de condução muito mais eficaz.
Isso por outro lado potencialmente aumenta o risco de lesão numa potencial queda.
Outro problema técnico com implicações no risco de queda, é a lateralização do corpo, conforme demonstrado na figura seguinte.
Imagem de webbikeworld.com onde é descrito que a cabeça está a ser movimentada somente dentro de ângulos de conforto.
Ao termos a cabeça “presa”, qualquer movimento da mesma de uma forma lateral, mesmo nos braces mais permissivos, vai forçar o capacete contra o brace, que o força contra o ombro, o que o força para baixo, o que força o cotovelo e o tronco a descaírem para esse lado.
Esta lateralização normal da cabeça que com o brace força a lateralização do corpo como um todo, aumentando o risco de queda em curva.
Aliás, um dos grandes culpados de quedas em curva fora-de-estrada, e principalmente em pistas de MX e SX, é exatamente este fenómeno, com ou sem neck brace.
Imagem BN EnduroCamp
Essa é a razão para qual aos mais altos níveis de MX e SX, principalmente nos EUA e Australia, e até mesmo em enduro e rally raid, eles tão a deixar de usar neck-braces, porque estão a preferir aumentar a sua segurança ativa ao conseguirem ter posições mais agressivas e consistentes, enquanto vêm o caminho, o que lhes dá mais controlo da mota e diminui o risco de queda.
Aceito perfeitamente que nem todos nós precisamos ou queremos andar sempre em posições tão agressivas como as utilizadas ao mais alto nível do fora-de-estrada em duas rodas, pelo que o que disse antes pode ou não ter aplicação direta à tua realidade.
Ainda assim, é algo a ter em mente.
A situação mais paradoxal de trabalhar como instrutor de fora-de-estrada, é que raramente ando de mota.
O tempo para andar e treinar, é utilizado a gerir a empresa, a preparar cursos, criar exercícios, e a estudar para poder fazer cada vez melhor aquilo que é a minha profissão, ensinar.
Dito isto, escusado será dizer que quando finalmente meto a perna por cima de uma mota, as minhas posições não são as mais agressivas por falta de necessidade e preparação física, ainda assim, escolho poder fazê-lo, por isso não utilizo um neck brace.
No meu balanço de risco-recompensa, com base na minha leitura dos dados existentes, ou pelo menos, dos que tenho acesso, o resultado é claro.
Ainda assim, acredito que isso vá mudar brevemente.
Com o crescimento da tecnologia de air-bags para utilização corriqueira, um neck brace de air-bag dá resposta direta a muitas perguntas, tal como elimina os problemas técnicos acima referidos.
Imagem de bikebandit.com
E digo utilização corriqueira porque apesar de já existirem opções de air-bags com neck brace incorporado, não suportam uma utilização de treinos ou passeio domingueiro, em que várias quedas por dia tendem a estar no menu.
Assim sendo, vejo um futuro muito promissor para esta ideia que sem dúvida nasceu da vontade de salvar vidas, e que brevemente será algo consensual para todos nós.
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Alguns levam esta definição ao limite com truques dignos de qualquer circo, no entanto, de uma forma geral, continuam a estar em cima da mota de alguma forma.
Ainda assim, eu acredito que para podermos tirar o máximo partido das nossas aventuras, ou mesmo maximizar a nossa capacidade em pista, saber andar fora da mota é um recurso técnico primordial, e hoje, é sobre ele que vamos falar.
Para muitos ir a um stand ou oficina de motas é uma actividade que se cinge a ver motas e material, ou simplesmente reparar ou instalar peças e componentes.
Para mim, ainda que essa realidade seja semelhante, existe algo mais que me capta sempre a atenção, ver os mecânicos e os comerciais a mexerem motas de um lado para o outro.
A leveza, facilidade, e quase desdém com que motas são precisamente movidas de um lado para o outro, seja ligadas ou desligadas, com eles em cima ou fora dela, é no mínimo hipnotizante.
Por outro lado, olhar para a maioria dos motociclistas a mover as suas motas seja em garagens, a entrar ou sair de carrinhas, ou nos mais variados parques de estacionamento e trilhos é um total contraste da realidade anterior.
Imagem de smh.au.com
O porquê desta dicotomia de realidades é relativamente fácil de compreender; enquanto uns por passam horas do seu dia a treinar como mover motas da forma mais rápida e fácil, outros passam essas horas a fazer kms em cima da mota.
No entanto, e considerando que grande parte de nós não tem qualquer conforto ou à vontade a mexer as nossas motas quando estamos fora delas, deveríamos aprender alguma coisa com aqueles que o fazem de forma totalmente blasé?
Imagem de adventuresnz.com
Sem dúvida!
Afinal, nem todas as situações de condução fora-de-estrada implicam andar de rabo sentado.
É muito comum em treinos com motas de ADV começar-se com uma familiarização da mota, seja por intermédio de exercícios estáticos, com a mota desligada, ou dinâmicos, com a mota em andamento.
No entanto, este tipo de trabalho não é tão comum em motas mais pequenas e enduristas, e isso é uma falha.
Nas ADV’s, esse tipo de exercício têm o intuito claro de não só dar a conhecer as dimensões da mota ao utilizador, mas também o seu ponto de equilíbrio e distribuição de peso.
Imagem de advpulse.com
Ao compreender que uma mota pode ser controlada com uma mão, ou até mesmo um dedo, a percepção de tamanho, peso, distribuição de massa, e noção da influência que fazemos na mota alteram-se por completo.
No entanto, essa aprendizagem é tão válida e crucial para uma mota de 250kg como é para uma de 100kg.
Se numa “gorda” ter este conhecimento bem interiorizado muda drasticamente a forma como encaramos a mota, numa endurista muda o tipo de terrenos em que nos iremos sentir confortáveis.
No entanto, os benefícios não se ficam só pelo conforto em diferentes tipos de terrenos.
Se há uma situação de stress comum a quase todos os praticantes de fora-de-estrada é parar, por escolha ou obrigação, num local onde vamos ser obrigados a ficar em desequilíbrio.
Um sítio onde fomos forçados a desmontar, junto a uma ravina, numa subida íngreme, ou até mesmo depois de uma queda ficarmos sem posição para subir novamente para a mota.
Imagem de Hispania.es
Saber andar de mota fora da mesma, abre um mundo de opções, e isso vai-te permitir manteres-te calmo e com uma respiração e ritmo cardíaco controlados, algo importante de que já falamos no passado.
Ao conseguires manter esse controlo, vais poder fazer melhores escolhas, e sair de qualquer posição com o mesmo à vontade com que sais de qualquer parque de estacionamento depois de meteres a primeira e enrolares o punho.
Ao contrário de curvas, subidas, descidas, e demais técnicas dinâmicas, começar a aprender a andar fora da mota requerer pouco mais do que a mota, com muitos dos exercícios a poderem ser feitos até sem equipamento.
À medida que fores progredindo nos exercícios, irás obviamente necessitar de te equipar e procurar locais mais amplos como parques de estacionamento ou clareiras, mas para começar, permite-te relaxar.
Não esquecer, repetição é chave para memorização, pelo que a introdução de algumas destas técnicas no teu aquecimento antes de passeios ou corridas pode também ser uma opção a considerar.
Com uma lista imensa de exercícios e variantes possíveis, nem em treinos os utilizo todos, por isso, criar aqui uma lista tipo enciclopédia ia ser mais confuso do que qualquer outra coisa.
Ainda assim, não poderia fechar o artigo sem partilhar alguns exercícios, tal como o seu objectivo, por isso tira notas, e prepara o teu próximo treino.
O primeiro exercício que recomendo sempre é com a mota desligada, engatada, e fora do descanso, aprender a dar uma volta de 360º à mota mantendo somente uma mão na mota de cada vez.
Imagem BN EnduroCamp
Começando pelo lado do descanso, onde a larga maioria de nós se sente mais confortável, a primeira coisa a fazer será com as duas mãos na mota retirar o descanso e encontrar um ponto de equilíbrio.
Dai, é escolher o sentido dos ponteiros do relógio, e começar a dar a volta à mota, indo passando de mão em mão até se chegar ao ponto inicial, sendo perfeitamente irrelevante em que zona da mota se agarra no processo.
Não só aconselho a que este exercício seja feito nos dois sentidos, aconselho também a que entre cada troca de mão para segurar a mota que se espere o tempo necessário para equilibrar a mota antes de se dar o próximo passo.
Imagem de Zulkifli Zainal
A ideia é criar confiança e conforto, não sobreviver ao exercício o mais rapidamente possível.
Desenvolver esta simples técnica permite-nos estar confortável na mota em toda a sua plenitude, podendo numa queda, por exemplo, estar-se em total conforto a segurar a mota de qualquer forma após a levantar do chão.
Um grande problema quando falamos de peso de motas não é obrigatoriamente o seu peso, mas onde o centro de gravidade do conjunto se encontra.
Baixar lentamente até ao chão uma R1250GS com o seu bóxer a servir de lastro numa zona muito baixa da mota, ou uma 450 de Rally com os seus tanques altos e instrumentos, pode ser uma surpresa para muitos sobre qual vai pesar mais ao mesmo ponto de inclinação.
Não quero com isto dizer que uma 1250 é mais leve que uma 450 de Rally, quero dizer que peso não é tudo, principalmente quando saímos de uma posição 100% perpendicular ao chão.
Imagem BN EnduroCamp
Isto significa que com a mota desligada e engatada, baixa-la lentamente como se a quiséssemos encostar ao chão vai-nos dizer claramente qual o máximo que podemos ir com essa mota especifica, antes dela se tornar demasiado pesada para nós.
Ter este conhecimento vai não só desbloquear algumas técnicas dinâmicas, como vai igualmente ajudar-nos a decidir quando é uma boa altura para deixar a mota cair.
Imagem de adbmag.com
Tentar meter o pé no chão para suportar o peso de uma mota para evitar que esta caia é como muitas lesões acontecem, e sabendo de antemão onde está esse limite, podemos ajudarmo-nos a evitar problemas.
Por definição todos aprendemos a entrar e sair da mota pelo seu lado esquerdo, tal como a manobra-la dessa mesma posição.
No entanto, toda e qualquer mota têm outras formas de ser manobrada, e para este efeito, estar confiante quer a subir para a mota, quer a manobra-la do lado direito é um recurso crucial.
Imagem de Hispania.es
Desenvolver esta técnica é tão simples quanto parece, bastando portanto utilizar o conhecimento adquirido no primeiro exercício, rodar o corpo para o lado direito da mota, e aprender a manobra-la dai.
Aconselho no entanto, e de forma a que se faça uma evolução total e gradual, que este exercício seja feito a quatro tempos.
Imagem BN EnduroCamp
1 – Com a mota desligada, e do seu lado esquerdo, andar uns passos para a frente e para trás puxando e empurrando a mota pelo guiador.
Aumentando a dificuldade do exercício, poderemos dar uns passos para a frente ligando a mota e utilizando o motor com um equilíbrio de embraiagem e acelerador, e uns passos para trás forçando a suspensão frontal.
2 – Com uma mão na embraiagem e uma na traseira da mota, seja no banco, ou numa pega, andar uns passos para a frente e para trás puxando e empurrando a mota pelo guiador e por onde quer que tenhamos escolhido por a nossa mão direita.
Aumentando a dificuldade do exercício, poderemos ligar a mota e dar uns passos para a frente utilizando somente embraiagem, e uns passos para trás desembraiando a mota e puxando a mesma pelo guiador, mantendo-a no seu ponto de equilíbrio vertical.
3 – Este exercido torna-se igual ao anterior, com a diferença que agora estamos do lado direito da mota, e que na sua versão mais avançada estaremos a controlar o movimento para a frente com um ajuste entre o travão da frente e o acelerador.
4 – Com a excepção de que agora estamos do lado direito da mota, tudo o resto é semelhante ao efectuado no exercício 1, desenvolvendo assim um conforto muito mais abrangente para com a mota.
Apesar de haver muitos mais exercícios semelhantes a este que podem e devem ser treinados, desenvolver estas técnicas básicas vai drasticamente alterar a forma como vês a mota, parado, e em movimento.
Da mesma forma, estes três exercícios básicos podem e devem ser utilizados sempre que vamos para uma mota nova.
Tive à uns tempos uma conversa com um aluno que por questões profissionais utiliza diversas motas diferentes todos os anos. Nessa conversa, foi-me dito que ainda hoje, quase uma década depois do nosso primeiro treino, este ainda utiliza estes e outros exercícios sempre que vai para uma mota nova.
Estes rápidos e simples exercícios, seja como motor ligado ou desligado, diferença que influência em muito a dinâmica dos mesmos, funcionam, e são um recurso que não deve ser descurado.
Por isso aposta em sair da mota para aprenderes a andar em cima dela, e vais ter uma grande surpresa quando vires a tua confiança e à vontade a aumentarem.
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